O crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país no segundo trimestre, de 0,9% em relação aos três meses anteriores - três vezes acima do esperado pelo mercado, que projetava avanço de 0,3% -, permite estimar que a economia brasileira possa fechar o ano com 3,1% de crescimento.
Essa possibilidade foi confirmada nesta sexta-feira, 1º de setembro, por alguns bancos, como Goldman Sachs, Bank of America, J.P. Morgan e XP, logo após a divulgação dos números do PIB no período entre abril e junho, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Outras instituições, como Itaú, não estabeleceram um índice, mas admitiram que devem revisar para cima suas previsões anteriores de crescimento da economia em 2023 - como fizeram após a divulgação do resultado do PIB no primeiro trimestre, que registrou avanço surpreendente de 1,8%.
Para se ter uma ideia da reviravolta nas previsões da economia, em janeiro, boa parte do mercado estimava um avanço tímido do PIB para 2023, na faixa entre 0,8% e 1%.
O aumento do PIB no período entre abril e junho foi puxado pelos setores de serviços (0,6% de aumento em relação ao trimestre anterior) e da indústria (0,9%). O impacto do setor de serviços é grande pelo fato de responder por 70% da economia brasileira.
A agropecuária também surpreendeu. Embora tenha registrado um recuo de 0,9% em relação ao primeiro trimestre - quando cresceu 21% -, o setor registrou crescimento de 17% em relação ao mesmo trimestre de 2022, puxado pelas boas safras de soja, milho, algodão e café.
Do lado da demanda, o consumo das famílias (0,9%) e do governo (0,7%) também chamou a atenção. O economista Mauro Rochlin, coordenador dos cursos de MBA da Fundação Getúlio Vargas (FGV), do Rio de Janeiro, diz que há justificativas para esse crescimento acima do esperado do PIB no segundo trimestre.
“O mercado de trabalho aquecido, por exemplo, ajuda a entender o consumo elevado das famílias”, diz. “Na mesma linha, o Bolsa Família continua fazendo efeito e destacaria também os incentivos fiscais, como o desconto para venda de automóveis, como efeito nos dados elevados de consumo.”
“Carrego estatístico”
O oitavo resultado positivo consecutivo do PIB em bases trimestrais e os números surpreendentes em comparações mais longas - a economia cresceu 3,4% em relação ao segundo trimestre de 2022 e 3,7% ao longo do primeiro semestre deste ano - contribuem para o otimismo com os trimestres seguintes.
A possibilidade do crescimento da economia em 2023 atingir 3,1% leva em conta o carrego estatístico ou carry over, termo usado pelos economistas quando o resultado de um trimestre causa um impacto positivo nos seguintes, assumindo taxas de variação nulas ao longo do ano.
Em cima dos dados entre abril e junho, mesmo que o PIB dos dois trimestres seguintes tenha crescimento zero, a economia tende a fechar 2023 com crescimento de 3,1%.
Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, também prevê uma revisão para cima do crescimento do PIB em 2023 pelo banco, mas para 2,8%, pois acredita que alguns indicadores negativos devam aparecer no segundo semestre.
No entanto, os dados consistentes de consumo e de demanda forte do PIB no segundo trimestre, segundo ele, reforçam a discussão de outro tema que ganha corpo no Brasil e no exterior: a queda rápida da inflação.
“Todo mundo ficou animado com essa redução brusca, mas a queda, até atingir a meta de inflação, vai ser mais demorada e pode afetar a trajetória de queda da taxa de juros”, adverte Padovani.
O impacto do crescimento da economia acima do esperado na inflação e, por tabela, na redução da taxa Selic sinalizada pelo Banco Central também chama a atenção de Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating.
“Temos um cenário de resiliência da economia muito forte e, alinhado com o programa Desenrola, que recupera o poder de crédito de famílias mais pobres; com a queda de juros, com impacto nas camadas mais altas com a compra de bens duráveis; e até com a melhora do rating do Brasil permitem prever um segundo semestre melhor do que se esperava”, diz Agostini.
Segundo ele, esse crescimento de fato pode impactar na estratégia de redução de juros do Banco Central. “A curva da queda da Selic que nós havíamos estimado, para 9% até setembro de 2024, por exemplo pode ser alterada”, afirma o economista da Austin. “O Banco Central pode desacelerar essa trajetória de queda e chegar a 9% ou 9,5% apenas em dezembro.”
A questão dos juros, no entanto, causa estranheza a Mauro Rochlin, da FGV-RJ, por outro motivo. “A queda da Selic ainda não está causando o efeito esperado em termos de crescimento do PIB, ou seja, as explicações que o mercado dava para um crescimento mais baixo da economia se mostraram furadas.”