Há três semanas, a Stone surpreendeu o mercado ao anunciar que estava interrompendo a oferta de crédito. O motivo? A empresa teve problemas para executar garantias de empréstimos durante a migração para um novo sistema de recebíveis do Banco Central (BC), em um imbróglio que também envolveu alguns concorrentes.
As dificuldades se refletiram no balanço do segundo trimestre e a empresa calculou um impacto negativo de R$ 397 milhões para os resultados, em divulgação feita no dia 25 de agosto. Uma semana depois, quando a companhia anunciou que a oferta de crédito seria interrompida, as ações listadas em Nasdaq fecharam em queda de 3,94%, em meio a dúvidas de investidores sobre a capacidade da empresa para tocar o negócio.
A Stone, porém, tem feito um “mea-culpa”. Em uma reunião com analistas do Goldman Sachs, na segunda-feira, dia 13, o CEO da companhia, Thiago Piau, admitiu três erros na experiência com os recebíveis, segundo relatório divulgado nesta terça-feira, dia 14, pelo banco americano de investimentos.
O primeiro diz respeito à prática de dar adiantamentos em dinheiro de um a dois meses para cliente com garantia fraca. O segundo, escalar a operação de crédito em ritmo muito rápido durante a implementação de um novo sistema de recebíveis. E o terceiro, não renegociar com clientes que solicitaram a migração para outras adquirentes.
Segundo o Goldman Sachs, Piau reiterou que a empresa tem cooperado com o BC para solucionar os problemas e espera ter tudo resolvido até o fim do ano. "Neste cenário, a gestão está confiante que o crédito seguirá como um produto-chave no relacionamento com os lojistas", escreveram os analistas Tito Labarta, Tiago Binsfeld, Beatriz Abreu e Nicholas Walker.
O novo sistema do BC, lançado no dia 7 de junho, foi criado para aumentar a competição no crédito concedido aos lojistas, que usam os recursos que entram por meio das adquirentes (recebíveis) como garantia para ter acesso a empréstimos originados por elas. Pelas novas regras da autoridade monetária, os varejistas podem usar seus recebíveis para negociar com outros financiadores, de modo a conseguir melhores condições.
Quando anunciou que estava suspendendo a oferta de crédito, a Stone alegou que a complexidade do processo de migração para o novo sistema do BC abriu espaço para um “comportamento oportunista” de alguns concorrentes, que “não têm liquidado os pagamentos de acordo com as prioridades do sistema, respeitado a senioridade dos credores e registrado as transações de comerciantes de forma adequada”. A companhia não citou nomes.
Na reunião com os analistas do Goldman Sachs, a Stone ressaltou que há discussões em andamento para reclamar contas a receber, o que pode resultar em uma ação judicial ou em um acordo com os outros players.
A Stone, que registrou no segundo trimestre uma carteira de crédito de R$ 1,998 bilhão, segue com planos para a área e pretende usar seus modelos de financiamento para alguns produtos específicos, como crédito com garantia imobiliária, disseram os analistas do Goldman Saches.
"Além disso, o envolvimento da Stone no setor bancário está aumentando e a empresa espera explorar as folhas de pagamento e, potencialmente, empréstimos consignados no futuro", eles escreveram.
Após a reunião com a Stone, o Goldman Sachs aproveitou para revisar para baixo algumas estimativas para a empresa. A previsão para a carteira de crédito, por exemplo, foi cortada em 48% para 2021, para R$ 1,8 bilhão, e em 32% para 2022, para R$ 4,6 bilhões. "Isso é apenas parcialmente compensado pelas receitas, uma vez que incorporamos a Linx (comprada pela Stone) a partir do terceiro trimestre", disseram os analistas.
Com isso, as estimativas de lucro líquido recorrente foram reduzidas em 49% para 2021, para R$ 886 milhões, em 35% para 2022, a R$ 1,8 bilhão, e em 16% para 2023, para R$ 3,1 bilhões.
O banco de investimento também reduziu o preço-alvo da companhia para 12 meses. Antes, estava em US$ 94. Agora, está em US$ 84. A recomendação, porém, segue de compra. Por volta das 16h40, a ação da Stone na Nasdaq caía 3,74%, para US$ 41,69. A empresa é avaliada em US$ 12,8 bilhões.