Acabaram-se os dias em que para entreter convidados ou para relaxar de um dia puxado no melhor estilo Mad Men era preciso um bar abastecido com destilados, licores e bitters das mais diversas origens. Hoje, uma boa garrafa de drink pronto resolve isso.

O segredo beira o óbvio: as bebidas prontas precisam conter ingredientes premium, oferecer a mesma qualidade que você esperaria do seu bar predileto e não exigir mais do que aquele gelo já disponível no seu freezer.

Sim, a invenção foi uma mão na roda para quem não tem habilidade com as coqueteleiras. Verdade seja dita, virou uma mão na roda até para quem manja do métier. Tanto assim que alguns bares já começaram a deixar suas bases para drinks preparadas, como o Guilhotina. Tanto assim que na última sexta, 1 de abril, foi inaugurado o primeiro bar de engarrafados do país.

O Raiz Club by APTK Spirits, em Pinheiros, é a fusão do antigo bar de jazz do restauranteur Milton Freitas e da grife de alta coquetelaria protagonizada pelo premiado bartender Alê D’Agostino. “É uma maneira de garantir que nossos clientes desfrutem do melhor da coquetelaria, mesmo sem o Alê no balcão todas as noites”, aposta Milton.

O mixologista, por sua vez, vê o bar como uma nova e atraente vitrine. Vidros elegantes, com provocante conteúdo alcoólico, integravam seu plano de negócios bem antes de se ouvir falar em covid-19. Prova dos nove é que, em 2018, garrafinhas de negroni clássico e negroni com jerez já povoavam o Apothek, seu concorrido bar também em Pinheiros.

Pandemia, confinamentos e o encontro com o sócio Luiz Paulo Foggetti aceleraram a empreitada APTK Spirits. Fisicamente em pé desde 1° de janeiro de 2021, após um investimento de R$ 1,2 milhão na construção da engarrafadora, faturou R$ 5,4 milhões no primeiro ano e estima outros R$ 14,4 milhões em 2022.

Luiz Paulo Foggetti, Milton Freitas e Alê D'Agostino: parceria no Raíz, com o primeiro bar que opera só com drinks engarrafados

Hoje, a empresa de alta coquetelaria faz parte da holding Small Batches, em que o CEO Luiz Paulo tem a maioria do negócio. A Ice4Pros, que também faz parte do grupo, recebeu outros R$ 1,8 milhão para a melhoria de seu processo exclusivo de congelamento. Por enquanto é a única fornecedora de gelos para a alta coquetelaria do país e faturou R$ 3,6 milhões no ano passado.

Um terceiro braço tão ou mais promissor da sociedade gestora é o varejo. Iniciado em dezembro último, com a primeira loja física da APTK Spirits, no do CJ Shops, deu um segundo passo em março, com uma unidade no Shopping Cidade Jardim, e agora anuncia um plano de franquias.

A primeira delas está prevista para julho, em Curitiba, no Paraná e integra o objetivo de contar com 12 lojas (incluindo além da capital paranaense e da capital paulista, Rio de Janeiro e Goiânia) até julho 2023.

Ainda que tripartite, “a APTK é o mais escalável dos business da Small Batches, porque são líquidos que nós mesmos destilamos e que podem conquistar hamburguerias, pizzarias, restaurantes bons que não encontram bartenders à altura, o mundo. A gente está notando essa revolução”, acredita Foggetti.

De fato, assegurar coquetéis clássicos e autorais feitos com as proporções exatas, dispensando mão de obra, especialmente a perita no bar, pode ser solução para os mais diversos perfis de estabelecimentos e ainda permite que D’Agostino não pare de desenvolver sua premiada criatividade.

“Quando comecei no Spot, em 1999, 2000, a cada 10 caipirinhas vendia um drink. Fazer um autoral era impensável. Fui sempre estudando e não técnica, que é essencial, mas você aprende na repetição, nem receitas, que hoje estão na internet. Me desenvolvi como um todo e isso ajuda a pensar e engarrafar as versões de coquetéis”, confessa o barman que, com esse olhar, dá-se ao luxo de se preocupar basicamente com qualidade e padrão.

“Claro que penso em custo, mas não é a mesma coisa. Consigo entregar um produto com alto valor agregado porque a gente não tem uma produção de milhões de unidades. Nos milhares, ainda consigo ter padrão artesanal, desenvolver produtos específicos, criar um destilado e fazer um extrato natural”, afirma.

Um cuidado que permite que seu portfólio conte com seis coquetéis clássicos (R$ 100 a R$ 119, com 375 ml ou 4 drinks), três coquetéis autorais (de R$ 100 a R$ 110, com 375 ml ou 4 drinks) e sete bases (gim, três vermutes, um aperitivo e dois bitters), além de parcerias exclusivas com bares como Pirajá e hotéis como o Rosewood, o Emiliano e o Unique.

Dentre os produtos, o campeão de vendas é o negroni, mas, curiosamente, nas flagships paulistanas, a maior procura para degustação in loco é pelo Sur L’Orange, que combina cachaça envelhecida em carvalho, laranja, amêndoas, açúcar e “amor”.

Feliz com o próprio caminho, a APTK se anima com a valorização desse tipo de receita mundo afora. Tem motivos. De acordo com o Conselho de Bebidas Destiladas nos Estados Unidos, em 2021, coquetéis prontos foram a categoria de destilados de maior crescimento (42,3%), movimentando US$ 1,6 bilhão e roubando até mercado da cerveja e do hard seltzer (o refrigerante etílico).

Por aqui não há números precisos e é difícil falar em abocanhar algum nicho de bebedores. Ainda assim, Alê percebe que o tomador de vinho é o mais propício a trocar uma taça por um boulevardier (primo do negroni à base de bourbon, vermute tinto e bitter) como o seu, ao passo que o cervejeiro, quiçá, teste uma latinha de gim tônica que encontrou dividindo a mesma prateleira da sua pilsen no supermercado.

“A última grande inovação na coquetelaria tinha sido entender que o gelo é um ingrediente fundamental. Agora aprendemos que para coquetéis clássicos, que maturam muito bem, como old fashioned, negroni, manhattan e algumas variações, ter a base pronta gera agilidade e padrão. Ou seja, o novo diferencial de um bar vai ser o atendimento, a luz, a música, o acompanhamento... e a demanda pelas bebidas prontas vai aumentar mais”, diz ele.