O ex-presidente do Banco Central Roberto Campos Neto advertiu na segunda-feira, 25 de agosto, durante evento do Esfera, em São Paulo, que a melhor alternativa para Brasil reduzir os juros é se o governo federal anunciar um choque fiscal positivo. Sem isso, assegurou, o País dificilmente conseguirá baixar os juros abaixo de 11%.
“A saída para reduzir os juros é um choque fiscal positivo para que os agentes, incluindo do exterior, entendam que teremos uma convergência da dívida diferente” afirmou Campos Neto, que após o deixar o BC assumiu a cadeira de vice-chairman e chefe global de políticas públicas do Nubank.
O ex-presidente do BC ressaltou que não dá para dissociar a questão fiscal da trajetória da dívida, e isso é preponderante para a queda de juros. “Com as condições fiscais atuais, o juro pode cair para 12%, 13%. Ir para 11% já seria otimista”, comentou.
Isso porque choque fiscal positivo poderia afetar as curvas de juros de longo prazo, cuja queda abriria espaço para redução dos juros: “Não vejo o Brasil com capacidade de ter juros mais baixos sob as atuais condições, para termos uma Selic estruturalmente mais baixa, precisaríamos ter um fiscal diferente”, advertiu.
Como exemplo, lembrou que já foram registradas várias situações em que houve uma queda de juros com a taxa longa da curva de juros subindo: “Sempre que isso aconteceu, depois se parou em um patamar de juros maior do que no início do ciclo."
No fim, advertiu, o que importa é a elevação da dívida, e a conta a ser feita para ter déficit nominal menor ficou mais simples. “Se a Selic cai para 11%, a dívida bruta deve crescer 3,5%”, afirmou.
Mais “solto” em relação ao período em que presidia o BC, Campos Neto se permitiu a alguns comentários mais críticos da política econômica do governo. Advertiu, por exemplo, que o Executivo precisa repensar o modelo de “governo grande”, que segundo ele não oferecer um serviço de qualidade como outros países que optaram por um Estado mais forte.
"O governo é grande demais, gasta demais e cada vez vai custar mais recursos para rolar a dívida pública”, disse o vice-chairman do Nubank. “Existia a crença de que um Estado maior poderia alimentar um crescimento maior, aplicando uma carga tributária menor, mas um governo maior não é eficiente, e preciso repensar este modelo."
Campos Neto disse que o País precisa se abrir comercialmente para aumentar a produtividade no médio prazo. Ele também opinou sobre o debate da reforma do Imposto de Renda, depois que o secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Marcos Pinto, defendeu o projeto de reforma do IR do governo.
De acordo com Pinto, os 87% da população que não vão pagar imposto já pagam tributos que incidem sobre consumo e folha de pagamento, ressaltando que o grosso da desigualdade está nos 10% mais ricos.
Campos Neto, então, observou – de forma firme, mas elegante – que o debate sobre quem paga mais IR, ricos ou pobres, ignora um aspecto que afeta a economia como um todo.
“O imposto de capital afeta na contratação de mão de obra”, disse o ex-presidente do BC. “O estoque de capital é o que gera projetos, que por sua vez geram empregos”, acrescentou, numa sutil contestação do argumento de Pinto.