O resultado surpreendente da eleição geral na Índia gerou uma onda de incerteza sobre a economia indiana. O Partido Bharatiya Janata (BJP), do primeiro-ministro Narendra Modi - que buscava assegurar o terceiro mandato - foi o mais votado, mas teve uma votação abaixo do esperado, obrigando-o a buscar alianças para formar maioria de 272 cadeiras no Parlamento.

A dúvida é até que ponto o novo governo a ser formado, mesmo sob a liderança de Modi, terá condições de levar adiante a bem-sucedida política econômica tocada desde 2014 pelo premiê indiano.

O temor é que a formação de um governo de coalizão, em tese, possa dificultar a aprovação de medidas econômicas arrojadas e, no limite, reduzir o ritmo de crescimento médio de 7% do Produto Interno Bruto sob a gestão de Modi.

Vários analistas citados pela imprensa indiana, no entanto, acreditam que a perda de maioria obrigará Modi a suavizar sua ênfase no nacionalismo hindu e trabalhar de forma mais focada na redução de desigualdade econômica e social, em especial de minorias que perderam voz sob seu governo – como os 200 milhões de muçulmanos.

A política nacionalista de Modi explica, em parte, o descompasso entre o avanço econômico do país e a manutenção da pobreza que castiga a maior parte da população - cerca de 60% dos quase 1,3 bilhão de indianos vivem com menos de US$ 3 por dia, no limiar do índice de pobreza médio do Banco Mundial. E 21%, ou mais de 250 milhões de pessoas, sobrevivem com menos de US$ 2.

O avanço social, neste sentido, seria uma alavanca para a manutenção do crescimento econômico. Sob Modi, a Índia trilhou um caminho de sucesso indiscutível. Na última década em que o primeiro-ministro ocupou o poder, a Índia foi o país que mais cresceu no mundo - saiu da nona para a quinta maior economia do planeta.

No primeiro trimestre de 2024, por exemplo, a Índia cresceu 8,2%. O resultado das urnas, porém, indica que boa parte do eleitorado se sente excluído do boom indiano.

Ashoka Mody, economista da Universidade de Princeton, adverte que há preocupações crescentes de que o crescimento médio de 7% da Índia não esteja produzindo tantos novos empregos quanto se esperava.

“Esse crescimento é principalmente apoiado pelo forte investimento público, enquanto o consumo e o investimento privado permanecem moderados”, disse Mody, ao jornal Asian Times.

De fato, no primeiro trimestre de 2024, os gastos do governo em infraestrutura impulsionaram o crescimento da construção civil para 8,7%. O índice de consumo, porém, foi de apenas 4% no período.

Perda de confiança

Sob o novo cenário político após as eleições, dois fatores interligados devem ditar o ritmo de crescimento da política econômica de Modi, que ganhou a expressão “Modinomics” durante seus dois mandatos.

Um deles é a possível perda de confiança dos investidores internacionais após o encolhimento político do primeiro-ministro indiano. Sob seu governo, a despeito dos graves problemas sociais, o país apresentou um crescimento elevado constante, com moeda estável e forte disciplina fiscal.

“Um dos argumentos por trás das valorizações das empresas indianas poderia ter sido a estabilidade política, a certeza política que um governo forte proporcionava”, escreveram os analistas do banco UBS. “Algumas dessas suposições podem ser questionadas dado o resultado das eleições.”

Outro fator a ser levado em conta é a possível recuperação econômica da China, cujos sinais começaram a surgir com medidas para resolver a crise imobiliária. Essa possibilidade pode trazer uma vantagem para o setor industrial indiano, que cresceu em importância sob a gestão de Modi.

Esse crescimento industrial, porém, foi alimentado pela injeção de investimentos estrangeiros que migraram da China após a pandemia e se transformaram num dos impulsionadores do mercado financeiro da Índia. Nada menos que US$ 5 trilhões em ações chinesas foram transferidas para a Bolsa de Mumbai entre 2021 e o início de 2024.

Boa parte desse capital alimentou a expansão industrial indiana nos últimos anos, uma estratégia de Modi batizada de “Make in Índia” (“Fazer na Índia”), que incentiva as empresas a criarem fábricas em várias regiões do país e os investimentos estrangeiros a apostarem nos fabricantes locais - mais de 7% da produção de iPhone da Apple é agora feita na Índia.

Para não depender do cenário econômico chinês, o crescimento indiano daqui para frente tende a depender de nova estratégia, como a sugerida pelo banco Goldman Sachs.

“A Índia precisa permanecer firme nas reformas estruturais, como as reformas fundiárias e do mercado de trabalho, ao mesmo tempo que cria um ambiente propício para que milhões de trabalhadores tenham empregos remunerados, para concretizarem o seu verdadeiro potencial de crescimento”, escreveram os analistas do Goldman Sachs.