O relaxamento das restrições impostas pela política de tolerância zero do governo chinês contra a Covid, oficializada nesta quarta-feira, 7 de dezembro, deverá ter um impacto limitado tanto na recuperação econômica interna quanto da economia global, que flerta com o fantasma da recessão.
Sofrendo desde o início do ano com lockdowns em várias cidades, a economia da China vem registrando um desempenho bem abaixo do esperado em 2022. Há capacidade ociosa na indústria e baixa perspectiva de um boom de consumo, mesmo com a retomada do comércio.
O recuo do governo chinês ocorre após semanas de protestos ruidosos de moradores de várias cidades exigindo o fim das restrições, indicando que a decisão teve motivação mais política e econômica do que de saúde.
A Covid está longe de estar controlada no país. Novembro apresentou número recorde de novos casos. Mais de 2 milhões de pessoas infectadas e seus contatos próximos permanecem sob quarentena. O número de áreas designadas de “alto risco” em todo o país chegou a 42 mil na semana passada.
Entre as medidas anunciadas, a maioria dos requisitos para teste de vírus e verificação de códigos QR de saúde ao entrar em locais foi descartada. Pacientes com Covid que apresentam sintomas leves ou inexistentes podem se recuperar em casa, em vez de num centro de quarentena do governo.
Além disso, os viajantes domésticos não precisarão mais apresentar um teste de vírus negativo ou ter seus códigos de saúde verificados ao chegar em outra província.
O discurso oficial, que antes era de guerra total ao vírus, deu uma guinada nos últimos dois dias, revelando mais preocupação com os danos que esses controles causaram à economia da China do que com o risco de piorar as infecções por Covid.
Na terça-feira, 6 de dezembro, o presidente Xi Jinping disse que as autoridades locais devem “coordenar melhor a prevenção da pandemia e a necessidade de desenvolvimento econômico e social”, citando a “necessidade de aumentar a confiança do mercado e da demanda doméstica”.
Para justificar o relaxamento, as autoridades de saúde e a mídia estatal citaram novas pesquisas mostrando que as cepas mais recentes do vírus são menos mortais, embora se espalhem com mais facilidade.
Otimismo moderado
Mesmo com a liberação do governo, os mercados reagiram com otimismo moderado. O yuan teve seu melhor ganho em cinco semanas em relação ao dólar desde a internacionalização, em 1994, e as ações domésticas tiveram valorização de 10% - mas seguem valendo menos do que na pré-pandemia.
Os indicadores explicam a cautela. As exportações do país recuaram 8,7% em novembro, em relação ao mesmo mês do ano anterior, a maior queda em dois anos.
Destinos importantes dos produtos chineses – EUA (queda de 25% no mesmo período) e União Europeia (decréscimo de 11%) – expõem a crise chinesa, que ainda amarga uma redução da atividade industrial e uma crise no mercado imobiliário.
A perspectiva de uma retomada do comércio tampouco se sustenta. Enquanto os EUA liberaram estímulos para o consumo pós-pandemia de 26% do PIB, o governo chinês se limitou a apenas 5% e nada indica que vai incentivar mais agora.
A previsão é de um incremento de consumo apenas do setor de serviços, como de viagens (hotéis e passagens aéreas) e de restaurantes, mas sempre sujeito a interrupções caso o aumento do número de pessoas na rua eleve os casos de Covid, com novos lockdowns.
Falta aos chineses o otimismo e confiança dos tempos de PIB na casa de 8%, que ficaram para trás. No começo de 2022, a previsão era de crescimento da economia de 5%, mas o país deve fechar o ano com metade disso.
A outra parte da equação que asseguraria a retomada chinesa – aumento da demanda dos países ocidentais – tampouco deve ocorrer.
As remessas de quase todos os tipos de mercadorias, incluindo móveis, brinquedos e eletrônicos, recuaram ao longo do ano, mais uma evidência de que os consumidores ocidentais estão cortando gastos com mercadorias.
A demanda por produtos chineses caiu porque, entre outras razões, os bancos centrais dos EUA e de outros países desenvolvidos têm aumentado as taxas de juros para conter a inflação, causada pelo aumento do preço de energia e de combustíveis com a guerra na Ucrânia.
Aos poucos, surgem evidências de que a economia global deverá mergulhar em recessão nos próximos meses, uma péssima notícia para a China.
Um relatório recente da empresa de pesquisa Oxford Economics prevê que o comércio global de mercadorias deverá encolher 0,2% no ano que vem. Há seis meses, um estudo da mesma Oxford Economics indicava uma previsão de crescimento do comércio global de 3,4% em 2023.