A arte não tem compromisso utilitário e muito menos uma função necessariamente especulativa. Investir em arte precisa ser, antes de qualquer coisa, fruto do desejo de ter arte. Contudo, muitas vezes, é possível conciliar o prazer de adquirir uma obra e de colecionar com a possibilidade econômica de manter um patrimônio. Arte, afinal, também é reserva de valor e é uma maneira de preservar o capital no tempo.
Por esse prisma, aconselho um olhar atento e meticuloso sobre a arte moderna e contemporânea, principalmente quando estamos falando de Brasil. A moderna, em geral, é mais valorizada, sobretudo porque já se tornou parte da história, com nomes consolidados e um sem-número de exemplos inseridos no imaginário coletivo. Seguramente há, hoje, entre 30 e 40 modernistas brasileiros que são investimentos excelentes.
Destes, um primeiro quartil reúne o batalhão de elite, aqueles artistas que têm uma liquidez maior — um panteão que agrupa Tarsila do Amaral (1886-1973), Candido Portinari (1903-1962), Di Cavalcanti (1897-1976), José Pancetti (1902-1958), Antonio Bandeira (1922-1967), Alberto da Veiga Guignar (1896-1962), entre outros desse quilate. Tarsila é exemplo incontestável de artista reconhecida mundialmente. Essa fama consagra a qualidade do trabalho — e constitui, evidentemente, o preço de suas telas.
De forma geral, esses artistas modernos custam caro porque já são valorizados. Podemos encará-los como ativos de valor e de maior liquidez. Quando avançamos no tempo e chegamos aos chamados contemporâneos, esbarramos em nomes que garantiram seu lugar na história da arte e também em jovens apostas — muitas delas, acredito, com muito potencial.
Os mais ilustres representantes do período neoconcreto brasileiro conseguiram se internacionalizar com muito vigor. Ninguém questiona a importância de um Hélio Oiticica (1937-1980), de uma Lygia Clark (1920-1988) e de uma Lygia Pape (1927-2004) — eles romperam o patamar do mercado doméstico e hoje estão presentes no mundo inteiro.
Clark já teve retrospectiva no MoMA, o Museu de Arte Moderna de Nova York. Pape faz parte de coleções de diversas instituições importantes dos Estados Unidos. Oiticica é nome constante nas principais feiras de arte do mundo.
Mais recentes, Adriana Varejão, Beatriz Milhazes e Cildo Meireles estão entre os mais valorizados e celebrados artistas vivos. Eu diria que eles são exceção no mercado, já que a maior parte dos contemporâneos brasileiros não atinge esse nível de valor.
Dentre os mais jovens, vejo nomes que se apresentam como grandes oportunidades de investimento — e de deleite artístico, claro. Uma maneira eficaz e segura de ter contato com a obra desses promissores é conhecer as boas galerias de arte.
Há, no Brasil, de duas a três dezenas de casas sérias e comprometidas com o trabalho de artistas emergentes que exalam qualidade e vêm adquirindo certa maturidade, despontando no mercado internacional. Uma delas é a Kogan Amaro, da qual sou proprietário. Mas também cito a Zipper, a Mendes Wood DM e a Central.
Paulistano nascido em 1983, Lucas Arruda é um excelente pintor que emerge neste cenário. Prova de que seu nível já está alguns degraus acima da média é o fato de hoje ele ser representado pelo renomado marchand alemão David Zwirner — considerado pela revista Forbes como um dos mais poderosos negociantes de arte. Também de São Paulo, aponto como muito promissor o trabalho do artista plástico Rodrigo Sassi, prestes a completar 40 anos.
Pessoalmente, tenho olhado com muita atenção para a obra daqueles cuja própria essência de vida também denota uma expressão que merece e precisa ser ouvida — e isto de forma alguma reduz a qualidade do trabalho. Ao contrário, amplifica e revaloriza seus significados.
É o caso da artista visual, performer e bailarina gaúcha Élle de Bernardini, que se identifica como uma pessoa de gênero indefinido. Gaúcha nascida em 1991, ela é uma singular expoente desse núcleo contemporâneo e pode se tornar uma artista muito valorizada com o tempo, justamente por traduzir a questão da sexualidade, o papel do feminino na arte e a nova definição de gênero — no caso, a identidade não binária e transgênero.
Os artistas que despontam têm, em comum, a mescla de talento com o comprometimento devotado ao trabalho. Nesta esteira, podemos incluir o pernambucano Samuel de Saboia, de apenas 22 anos, um artista negro com uma linguagem universal. Ou o baiano Adriano Machado, nascido em 1986 e dono de um estilo cada vez mais potente: usando a fotografia como suporte, ele aborda e elabora a questão do corpo na perspectiva da negritude no Brasil. Já o santista Fabiano Rodrigues, de 1974, carrega uma trajetória ímpar: antes de se tornar um fotógrafo incrível, ele foi skatista profissional. Não à toa, imprime em seu trabalho o campo semântico da vida nas metrópoles, de forma violenta, bonita e poética.
Em suma, a arte contemporânea apresenta muitas oportunidades. Cabe ao público — dos espectadores aos colecionadores — estar atento. E aqueles que querem investir em arte, que possam reservar um espaço para emergentes, a talante, na expectativa de que sejam bons investimentos ao sobreviverem ao crivo do tempo.
* Marcos Amaro é artista plástico, colecionador, empresário e presidente do FAMA Museu e Campo