A virada do trimestre impõe uma nova agenda. O cenário de possível desaceleração do ritmo de corte da Selic ante inflação cadente, mas resistente; expectativas pressionadas; e disposição do governo de manter a meta fiscal zero em 2024, no jargão do mercado, “está dado”. E a pauta diversificada, que vem por aí, tende a aumentar a exposição do governo e, por tabela, o risco de conflitos.

Na abertura de abril, câmbio, juro e bolsa devem responder, sobretudo, à dinâmica do mercado externo cuja evolução estará subordinada a uma batelada de dados de atividade e emprego, especialmente dos EUA, e à contínua disseminação de discursos de membros do Federal Reserve (Fed) que, afinal, é quem dá as cartas na política monetária global com impactos regionais. Inclusive no Brasil.

Na agenda doméstica um viés institucional deverá se sobrepor à rotineira divulgação de indicadores por acenar com uma mobilização mais intensa do Executivo e do Congresso por semanas – já considerando uma possível trégua ante a possibilidade de a Câmara estender a folga da Semana Santa até 8 de abril.

De todo modo, a agenda que se impõe tem contorno mais político do que econômico-financeiro que está ao alcance de planilhas e modelos econométricos.

Ao menos três eventos poderão exibir “fraturas” nas relações entre os Poderes e maior tensão na administração pública: a batalha do funcionalismo por aumento de salários; o envio ao Congresso do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025; e o encaminhamento, também ao Parlamento, da proposta de regulamentação da Reforma Tributária sobre o consumo.

Está previsto para a quarta-feira, 3 de abril, o “Dia Nacional de Mobilização e Paralisação” convocado pelo Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais (Fonasefe) e centrais sindicais. O ato poderá envolver até 80 mil servidores, calculam as entidades, e mesclar paralisações e operação-padrão para pressionar o governo por reajustes salariais.

Na paralela, atentos à possibilidade de o Senado dar curso à tramitação da PEC que amplia a autonomia financeira e administrativa do BC, servidores poderão reforçar um estado de alerta que se arrasta desde 2022 em meio ao esvaziamento do quadro funcional da instituição.

Há tempos, portanto, a categoria defende reajuste salarial e reestruturação de carreiras, movimento que agrava, de forma crescente, o atraso na divulgação de documentos elaborados pelo BC. Inclusive, o resultado consolidado do setor público – referência local e internacional sobre as contas públicas brasileiras.

A PEC da autonomia administrativa do BC – em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado – pretende retirar o orçamento da instituição do controle do Estado e permitir que sua diretoria tome decisões sobre a aplicação das receitas oriundas do monopólio da emissão de moeda.

Defendida por Roberto Campos Neto, se aprovada, a proposta transformaria o BC – hoje uma autarquia federal – em uma empresa pública com total liberdade financeira e orçamentária sob a supervisão do Congresso.

Metas fiscais na berlinda

Nessa configuração proposta, o comando do BC também teria liberdade para definir planos de carreiras e salários, prerrogativa que eleva a preocupação de servidores com a estabilidade de emprego. Hoje garantida.

O senador Plínio Valério (PSDB-AM), relator dessa PEC, pretende apresentar seu parecer até junho. Há um longo caminho pela frente, mas as discussões podem esquentar, ante o esperado esvaziamento do Congresso no segundo semestre em função das eleições municipais; e a contagem regressiva para a troca da presidência do BC. Campos Neto, que gostaria de adicionar a autonomia administrativa ao seu legado, fica no cargo até 31 de dezembro.

Outro tema com forte potencial de repercussão e que tende a exigir um esforço adicional de comunicação do governo é o projeto da LDO de 2025 a ser enviado pelo Ministério do Planejamento ao Congresso em 15 de abril.

O projeto, que define prioridades e metas e leva à confecção do Orçamento do ano seguinte, contempla variáveis cruciais ao mercado financeiro: valor do salário-mínimo, Selic, inflação e evolução do Produto Interno Bruto.

No pilar fiscal, levando-se em conta a âncora aprovada no ano passado, em 2024 o governo deve entregar déficit primário zero e, em 2025 e 2026, superávits de, respectivamente, 0,5% e 1% do PIB em 2026. Mas as metas estão na berlinda.

O Tesouro já indicou dificuldade para chegar a esses resultados e estimou déficits primários de 0,5% do PIB para 2025 e de 0,4% do PIB para 2026. Em entrevista à CNN Brasil, o ministro Fernando Haddad foi mais longe e lavou as mãos. Disse que o superávit de 0,5% em 2025 depende do Congresso. As discrepâncias, de linguagem ou não, sugerem ajuste de cálculos na LDO.

Quanto à regulamentação da Reforma Tributária surgem entraves e surpresas, dada a complexidade do tema, interesses envolvidos e da iniciativa de 24 frentes parlamentares que formalizaram no Congresso a proposta de isenção da cesta básica nacional ampliada.

Transformada em Projeto de Lei Complementar, espécie de atalho de colaboração para a redução de custo dos alimentos, a proposta autoriza o governo a zerar alíquotas de impostos federais incidentes sobre os itens da cesta, antes da entrada em vigor de novos tributos criados pela Reforma.

Ante a sanha arrecadatória do governo, será que vai dar?