Política e economia se entrelaçam de janeiro para fevereiro em uma virada de calendário pautada pela posse de deputados e senadores eleitos em outubro, definição do comando da Câmara e do Senado e decisões de política monetária dos três maiores bancos centrais do mundo (Federal Reserve, Banco Central Europeu e Banco da Inglaterra) e do Banco Central do Brasil.
Ainda que em desaceleração nos Estados Unidos, os juros continuarão subindo nas grandes economias em reuniões marcadas para quarta e quinta-feira, 1º e 2 de fevereiro.
No Brasil, é improvável que, ao fim do primeiro encontro do governo Lula, na quarta-feira, 1 de fevereiro, o Copom altere seu plano de voo, que prevê Selic inalterada em 13,75% ao ano por tempo prolongado.
A despeito dessa sinalização, entretanto, a perspectiva para a política de juros estará condicionada ao compromisso do Congresso com a agenda fiscal. O Executivo lançou o Programa de Recuperação Fiscal há duas semanas. Caberá ao Congresso chancelar as decisões.
Com a retomada do trabalho legislativo na quarta-feira, 1º de fevereiro, a pauta econômica que precisa deslanchar ganha viés político no momento em que o governo Lula completa um mês.
Nesse curto período aconteceu de tudo: invasões aos Três Poderes, troca no comando do Exército, anúncio do programa fiscal, críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva às metas de inflação e às taxas de juros e sua primeira viagem internacional para fortalecimento de laços comerciais com os vizinhos sul-americanos.
A visita de Lula à Argentina e ao Uruguai renovou expectativas e temores, sobretudo, quanto ao uso do BNDES para o financiamento de projetos no exterior e transações domésticas com juros subsidiados que comprometem a política monetária e podem acarretar, como no passado, custos bilionários ao Tesouro Nacional.
Essa coleção de eventos pode dar trégua ao Executivo no início de fevereiro, mas é inevitável seu envolvimento com a agenda legislativa que estará voltada a dois temas cruciais para a economia: a âncora fiscal e a reforma tributária.
O projeto da âncora fiscal poderá ser apresentado até abril, como antecipou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Oficialmente, porém, o governo tem até o fim de junho para encaminhar uma proposta, diz a PEC da Transição.
A reforma tributária, por sua vez, está em discussão madura na Câmara e no Senado, onde tramitam projetos que visam a simplificar o sistema de impostos no país – um grande anseio do setor privado.
No curto prazo, a política e a economia estarão de braços dados e na mira do mercado, inclusive, porque caberá aos parlamentares aprovar nomes de um ou dois diretores do BC em substituição aos atuais, cujos mandatos expiram em 28 de fevereiro.
No curto prazo, a política e a economia estarão de braços dados e na mira do mercado, inclusive, porque caberá aos parlamentares aprovar nomes de um ou dois diretores do BC
Estão sujeitas à mudança de comando – informação vital para o posicionamento de gestores e investidores – as diretorias de Política Monetária e de Fiscalização hoje lideradas por Bruno Serra e Paulo Souza.
É dado como certo que Serra deixará o BC. Não pretende ter seu mandato renovado. Funcionário de carreira do BC e presidente da Associação de Supervisores Bancários das Américas (Asba), Paulo Souza poderá ser reconduzido ao cargo, prerrogativa prevista na lei de autonomia da instituição.
Havendo substituição, impõe-se um rito: o diretor indicado deverá ser sabatinado pela Comissão de Assuntos Econômicos e ser aprovado pelo plenário do Senado e pelo presidente da República.
Dada sua relevância, a execução da agenda parlamentar deverá catalisar a atenção dos agentes econômicos que aguardam a instalação de um Congresso com um perfil mais conservador que emergiu das urnas em outubro.
O que esperar do Congresso
Confirmada essa expectativa, as pautas do governo estarão sujeitas a uma prova de fogo. Mas é possível que essa “oposição” tenha sido reduzida ou esvaziada pelo fato de o presidente Lula contemplar os partidos com cargos em seu gabinete de 37 Pastas.
De todo modo, a fidelidade das legendas ao governo ainda carece de testes que ocorrerão na rotina de avaliação de projetos.
Daí a relevância do monitoramento estreito do posicionamento de parlamentares que desembarcam no Congresso em 1º de fevereiro, dia de eleição das presidências da Câmara e do Senado.
O deputado Arthur Lira (PP-AL), apoiado pelo PT e oposição, deve ser reeleito ao comando da Câmara. O atual presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) também é favorito, mas não é certo que permanecerá no cargo por mais dois anos.
Apoiado por partidos do Centrão, o ex-ministro e senador eleito Rogério Marinho (PL-RN) disputa o posto. E sua vitória, se ocorrer, deverá impor desafios adicionais ao governo.
O Congresso que se estabelece na virada do mês precisa deliberar sobre 27 medidas provisórias. A maioria das medidas está em análise em comissões mistas, informa a Agência Senado.
Entre elas estão três textos editados no governo Lula e que tratam da manutenção do benefício de R$ 600 ao Bolsa Família mais R$ 150 por família com criança até seis anos; a prorrogação da desoneração de tributos federais sobre combustíveis; e a extinção da Fundação Nacional de Saúde, a Funasa.
Os parlamentares também deverão votar matérias encaminhadas anteriormente pelo governo Bolsonaro. Entre elas, a que fixa o valor do salário mínimo em R$ 1.302, considerando que o Orçamento da União de 2023, já aprovado, prevê o mínimo de R$ 1.320.
Os parlamentares também deverão votar matérias encaminhadas anteriormente pelo governo Bolsonaro. Entre elas, a que fixa o valor do salário mínimo
Também está pendente a ampliação de 4 para até 6 anos o prazo de quitação de empréstimos do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe).
Criado em 2020 para dar suporte financeiro aos pequenos negócios durante a pandemia, o programa se tornou política pública permanente do governo federal em 2021.
O Pronampe tirou micro, pequenas e médias empresas, além de microempreendedores individuais, do sufoco. Mas seu custo não é baixo: 6% ao ano mais Selic que está há cinco meses em 13,75%.
Incentivador de crédito e crítico ao juro alto, o governo Lula dificilmente escapará de uma avaliação sobre este assunto.