Considerado pela revista Time um dos 25 livros de gestão e negócios mais influentes de todos os tempos, há exatos 30 anos, era lançado Inteligência Emocional, de Daniel Goleman. A obra vendeu cinco milhões de cópias apenas nos Estados Unidos e se tornou um clássico sem fronteiras, traduzido em mais de 40 idiomas.

O psicólogo, escritor e jornalista americano, hoje, com 79 anos, popularizou o conceito de “inteligência emocional” (IE), ao argumentar com solidez que, ao contrário do que se afirmava até então, esse aspecto é tão ou mais importante que a inteligência intelectual (QI) para o sucesso na vida e no trabalho.

Na prática, o livro mudou a forma como empresas avaliam e desenvolvem seus talentos, ao dar protagonismo às habilidades socioemocionais como parte essencial do desempenho profissional. No Brasil, o estudo ganhou no subtítulo um complemento esclarecedor: “A teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente”.

Uma revolução silenciosa que continua até hoje — especialmente em tempos de transformação digital e trabalho remoto, em que a IE tem sido cada vez mais valorizada.

Outro impacto importante foi as mudanças de concepção do chamado "perfil de liderança". Para Goleman, os líderes mais eficazes não são necessariamente os mais inteligentes no sentido técnico, mas os mais emocionalmente inteligentes, que sabem o que fazer nos momentos que pedem uma postura de ação equilibrada.

Depois de Inteligência Emocional, o psicólogo lançou outros livros de sucesso, como Liderança: A inteligência emocional na formação do líder de sucesso e A ciência da meditação: Como transformar o cérebro, a mente e o corpo, entre outros — todos fazem parte do catálogo da editora Objetiva, do grupo Companhia das Letras.

Agora, sai no Brasil Inteligência Emocional e Liderança: Textos essenciais, descrito como “uma coletânea concisa e poderosa com os principais textos de Goleman sobre inteligência emocional e liderança”. É, como o autor afirma, um guia prático que busca orientar líderes e educadores sobre como aplicar a inteligência emocional no dia a dia. Ou seja, “para quem deseja liderar com empatia, clareza e propósito”.

"As redes sociais são um ponto que me preocupa bastante, especialmente no caso de crianças e adolescentes", diz o escritor (Foto: Editora Objetiva)

Com 208 páginas, o novo livro do psicólo custa R$ 69,90 (Foto: Editora Objetiva)

Nascido em Stockton, na Califórnia, em março de 1946, Goleman foi aluno do Amherst College e da Universidade da Califórnia, em Berkeley. Recebeu o PhD na Universidade Harvard, onde também lecionou.

Por 12 anos, foi jornalista setorizado do jornal The New York Times, onde cobria a seção de ciências do comportamento e do cérebro. Também trabalhou como editor da revista científica Psychology Today. Atualmente, realiza palestras para grupos profissionais.

Acompanhe a seguir os principais trechos da entrevista exclusiva de Goleman para o NeoFeed:

Como o senhor avalia o impacto alcançado pela obra Inteligência Emocional?
Fiquei bastante surpreso com o enorme interesse global despertado pelo meu livro. Não imaginei, quando o publiquei, que ele iria ressoar de forma tão ampla com pessoas em diferentes culturas e contextos. Desde então, tornou-se especialmente influente tanto no mundo dos negócios quanto na área da educação, impactando práticas, debates e pesquisas.

Qual foi a ideia inovadora de seu estudo que, segundo a Harvard Business Review, ajudou a quebrar paradigmas no mundo da gestão e do comportamento humano?
A ideia que realmente mudou o paradigma foi mostrar que o sucesso nos negócios ou na carreira poderia estar mais ligado a habilidades emocionais e sociais do que apenas ao QI. Essas competências incluem empatia, autoconhecimento, capacidade de trabalhar em equipe e gerir emoções. Em muitos contextos, tais habilidades se revelam até mais determinantes do que o intelecto puro para alcançar resultados duradouros.

"Em um ambiente de trabalho cada vez mais virtual, recomendo que se criem oportunidades de contato humano, mesmo que a distância"

Por que suas ideias foram tão bem recebidas?
Em 1995, predominava uma crença bastante consolidada: a de que o intelecto, medido pelo QI, era suficiente para garantir o sucesso na vida profissional e pessoal. O impacto da obra foi justamente questionar essa visão limitada, mostrar que havia outros fatores decisivos para o desempenho humano. Essa mudança de perspectiva foi decisiva, portanto.

Três décadas depois, os conceitos de IE continuam sendo aplicados em empresas para formar líderes mais empáticos e eficazes. Há algo que precisa ser aperfeiçoado ou atualizado em suas ideias?
Se tivesse de destacar um ponto essencial hoje, colocaria em evidência a importância da adaptabilidade — uma competência central da inteligência emocional. Ela será fundamental para enfrentar as mudanças constantes que a inteligência artificial trará ao ambiente de trabalho, exigindo que as pessoas ajustem seus comportamentos, estratégias e até suas expectativas diante de cenários novos.

O trabalho remoto e a comunicação digital dificultam a percepção de sinais não verbais. Como manter relações saudáveis e produtivas em ambientes virtuais?
Em um ambiente de trabalho cada vez mais virtual, recomendo que se criem oportunidades de contato humano, mesmo que à distância. Pode ser uma sessão no Zoom ou uma ligação telefônica dedicada apenas a conhecer melhor o colega, sem tratar de tarefas imediatas. Isso ajuda a fortalecer laços de confiança. Sempre que possível, o ideal é que esse contato ocorra também presencialmente.

O uso intenso de redes sociais tem impacto direto na autoestima, no bem-estar e na regulação emocional. Que efeitos mais preocupam o senhor?
As redes sociais são um ponto que me preocupa bastante, especialmente no caso de crianças e adolescentes. O uso excessivo pode enfraquecer a capacidade deles de lidar com interações presenciais, de entender nuances da comunicação face a face e de desenvolver competências sociais essenciais. Esse é um risco que não podemos ignorar.

"A IA pode, em alguns casos, servir como apoio para a prática de certas habilidades emocionais"

O senhor defende a alfabetização emocional, especialmente entre jovens. Como isso pode ajudar na construção de resiliência e na consciência crítica diante das pressões do ambiente digital?
A chamada alfabetização emocional — hoje frequentemente conhecida como “aprendizagem socioemocional” (ou SEL, em inglês) — oferece às crianças um repertório completo de habilidades pessoais e interpessoais. Ensina desde o autoconhecimento até a empatia e a colaboração. Tenho convicção de que, diante das mudanças sociais e tecnológicas, essa formação se tornará cada vez mais indispensável.

A educação cada vez mais digitalizada torna urgente a inclusão de competências socioemocionais no ensino remoto e híbrido? Por que, na sua opinião, isso é fundamental para a formação das novas gerações?
A educação em SEL pode ser vista também como uma ferramenta de recuperação das habilidades interpessoais que se perdem em um mundo dominado por interações digitais e remotas. Ela funciona como um contrapeso importante, reintroduzindo práticas de convivência e comunicação que são fundamentais para a vida em sociedade.

O senhor afirma que a escola deve formar não apenas cérebros, mas também corações emocionalmente saudáveis. Essa ideia ganhou ainda mais relevância diante do distanciamento imposto pela tecnologia?
Sim. E fico feliz em ver que o SEL vem sendo adotado em escala cada vez maior em diferentes partes do mundo. Essa expansão provavelmente tem como um dos impulsos justamente o avanço da tecnologia e a necessidade de reequilibrar nossa formação humana em meio a tantas mudanças.

Hoje já existem aplicativos de IA voltados para meditação, autoconsciência e desenvolvimento interpessoal. A tecnologia pode ser uma aliada no fortalecimento das competências emocionais?
A tecnologia de inteligência artificial pode, em alguns casos, servir como apoio para a prática de certas habilidades emocionais, oferecendo feedbacks ou simulações. No entanto, é importante lembrar que ela nunca conseguirá substituir aquilo que só o contato humano verdadeiro pode proporcionar: o calor, a confiança e a qualidade única da relação entre pessoas.

Em sua nova obra, o senhor reúne artigos escritos ao longo de mais de duas décadas. Qual foi o propósito dessa seleção?
O livro reúne principalmente reflexões e textos sobre o papel decisivo da inteligência emocional para o exercício da liderança. Nele, procuro mostrar como gestores e líderes podem se beneficiar desse conjunto de competências no cotidiano profissional.

Podemos considerá-lo um novo passo na aplicação da inteligência emocional no cotidiano?
Minha expectativa é que esse trabalho auxilie líderes, profissionais de recursos humanos e também educadores interessados em levar essas habilidades humanas para suas práticas diárias. Trata-se de um investimento que pode transformar não apenas o ambiente de trabalho, mas também a qualidade de vida de todos os envolvidos.

Olhando para o futuro, como o senhor imagina que a IE poderá moldar as próximas gerações de líderes em um mundo cada vez mais tecnológico e incerto?
À medida que mais e mais líderes devam lidar com as transformações que a IA traz ao trabalho, eles precisarão contar com habilidades de inteligência emocional como adaptabilidade, equilíbrio emocional e resiliência, além do otimismo — sem esquecer a empatia e a capacidade de influenciar e até inspirar um bom trabalho.