“O único homem de quem já tive medo foi uma mulher chamada Griselda Blanco.” A frase, atribuída a Pablo Escobar, dá uma ideia do peso da colombiana conhecida nas décadas de 1970 e 1980 como “a rainha da cocaína’’ e “a madrinha’’ do Cartel de Medellín.
Embora Escobar tenha entrado para a história como o traficante mais perigoso e rico do mundo, Griselda Blanco (1943-2012) foi quem criou as primeiras rotas de tráfico para os Estados Unidos, via Miami, usadas posteriormente por El Patrón.
Toda a trajetória da chefona das drogas, responsável por cerca de 250 assassinatos e pelo envio mensal de mais de uma tonelada de cocaína aos EUA, é resgatado agora em “Griselda”. A minissérie de seis episódios acaba de chegar ao catálogo da Netflix.
“O que mais me interessou inicialmente foi o fato de eu nunca ter ouvido falar dela e eu cresci na Colômbia naquela época”, disse a atriz Sofía Vergara, de 51 anos, produtora e protagonista de “Griselda”. De Los Angeles, ela participou de painel virtual sobre a série, que teve cobertura do NeoFeed.
“Com o tráfico de drogas em alta, todo mundo sabia quem eram os caras envolvidos no Cartel de Medellín. Até porque os Estados Unidos estavam sempre à caça deles. Eu só não imaginava que uma mulher tivesse conseguido chegar a esse nível com os homens”, comentou a atriz.
Partiu de Sofía, mais conhecida pela personagem Gloria Delgado da série “Modern Family” (2009-2020), a ideia de recapitular a vida da traficante em “Griselda”. Ela desenvolveu o projeto com Eric Newman, o showrunner de “Narcos” (2015-2017), que teve a primeira e a segunda temporadas dedicadas a Escobar, e de “Narcos: México” (2018-2021).
“Ao longo dos anos, tínhamos encontrado Griselda em nossas pesquisas para ‘Narcos’. Ela era do Cartel de Medellín e cruzou o caminho de Escobar, dos Ochoas [os irmãos Juan David, Jorge Luis e Fabio, figuras poderosas do narcotráfico] e de alguns outros grandes”, contou Newman, de 53 anos, durante o encontro online.
Griselda era uma personagem atraente por ser a primeira e única mulher com destaque no tráfico, mas como lembrou Newman, a equipe não encontrou um jeito de incluí-la em “Narcos’’.
Agora, ela ganha uma narrativa própria, assim que ela foge da Colômbia, em 1978, e desembarca em Miami, depois de matar o marido, Alberto Bravo, que traficava drogas de Medellín para Nova York. O crime lhe rendeu o apelido de “Viúva Negra”.
Como Griselda estava por trás das operações de Bravo, ela acaba usando a sua expertise para estabelecer uma nova rota de tráfico para os Estados Unidos.
Tudo começa com um quilo de cocaína, trazido escondido em sua bagagem. No princípio, ela usa o contrabando para sustentar os três filhos.
Aos poucos, porém, Griselda se transforma na “Madrinha” do cartel – em uma referência ao filme “Poderoso Chefão” (“The Godfather”, em inglês), de 1972. Para construir seu império, deixa um rastro de sangue pelo caminho, como qualquer homem teria feito.
“Eu me identifiquei com ela por ser mulher, colombiana, mãe solteira, imigrante e ter começado a trabalhar desde muito jovem”, afirmou Sofía, que usou prótese no nariz e nos dentes para perder os traços delicados e ficar mais parecida com a traficante.
“Meu irmão ainda fez parte do negócio das drogas, infelizmente. E acabou morto na Colômbia”, contou a atriz, referindo-se a Julio, preso várias vezes por agressão e porte de cocaína e maconha nos Estados Unidos.
“Eu senti na pele como as famílias são destruídas e não apenas a pessoa que faz as coisas ilegais. E foi por isso que, como atriz, eu tentei imaginar por que uma mãe faria algo assim. É mais natural que os homens corram atrás de poder e dinheiro nesse submundo.”
Por serem muito populares as tramas sobre traficantes de drogas na indústria do entretenimento, o fato de “Griselda” registrar a ascensão de uma mulher é o que faz a série destoar das demais, na visão de Sofía. “Aqui não se trata apenas do negócio do tráfico e de como ele funciona. Todos nós já vimos um monte de programas de TV e filmes sobre isso. É um gênero que o público realmente ama”, comentou a atriz.
Ao conquistar o poder, a protagonista passa por uma espécie de dessensibilização. “Griselda foi capaz de se tornar tão brutal quanto os homens. Por ser uma mãe, que cria seus filhos, você não espera que ela possa chegar a esses níveis de ódio e horror. Mas ela começou a perder todos os seus valores e as boas intenções que, acredito, Griselda tinha, no início”, completou a atriz.
Depois de passar mais de 20 anos na prisão, por narcotráfico e três assassinatos, Griselda acabou assassinada. Morreu baleada, ao sair de um açougue em Medellín. Como Sofia resumiu: “Por tudo o que conquistou, eu sinto que, se ela tivesse tomado outro rumo, poderia ter sido, se realmente quisesse, até presidente da Colômbia”.