À primeira vista, as fotos da atriz Alice Wegmann e da modelo Gabriella Ghader na praia, na piscina e a bordo de um iate parecem apenas mais um editorial  de swimwear. Mas, os dois “Gs”, espelhados, afixados discretamente nos biquinis e maiôs, no kaftan e no summer dress, não são de nenhuma grife famosa. Pelo menos, não de roupa — os “Gs” da Gucci são de outro tipo.

Aquela logo é do resort Rosewood Le Guanahani, em St. Barth, o destino preferido dos milionários no Caribe. E aquela coleção, batizada Tropical Joie de Vivre, foi criada, em 2023, pela estilista paulistana Adriana Degreas em uma colaboração exclusiva com o hotel, ilustrando uma tendência que ganha cada vez mais espaço no mercado global de luxo: a parceria criativa entre as indústrias da moda e do turismo.

A associação entre marcas ultrassofisticadas e propriedades hoteleiras igualmente requintadas já vem de longa data. Lembrem-se dos frasquinhos de xampus e cremes, entre outras amenidades, oferecidos aos hóspedes como cortesia. Ou dos itens fashionistas vendidos nas lojinhas dos hotéis — a própria Adriana Degreas está na boutique do resort caribenho há uma década.

Nos últimos anos, grifes como Dolce & Gabbana, Missoni e Dior passaram a “vestir” alguns hotéis estrelados, mundo afora. Outras, como a Bulgari, do grupo LVMH, inclusive, lançaram suas próprias propriedades. Mas não é disso que se trata.

O novo modelo de negócios estreita ainda mais as parcerias e transforma as criações nascidas dessas collabs em objetos de desejo. Assim, roupas, sapatos, bolsas, malas, acessórios, perfumes e até bebidas "made in hotels" viram artigos únicos — símbolos de status e exclusividade, com os preços à altura, claro.

Alguns já foram parar em lojas de luxo. Os jeans do Ritz, de Paris, criado em parceria com a descolada Frame, por exemplo, estavam nas araras das inglesas Harrods e no site da Net-a-Porter.

No relatório The State of Fashion 2023, a consultoria global McKinsey já adiantava: “As viagens serão um motor para a indústria da moda”.

Enquanto as reservas nos hotéis mais sofisticados seguem em ascensão no mundo todo (aumento de 27%, em 2022, e mais 17% sobre esse crescimento, no ano passado), os conglomerados de luxo vivem uma fase de desaceleração — alguns analistas julgam ser precipitado declarar, neste momento, a crise do setor.

O SO/Paris e a grife alemã Tom Àdam, por exemplo, criaram uma edição limitada de loungewear nas cores do hotel francês, em tecido sustentável confeccionado à mão. O conjunto de pijama custa € 295 (quase R$ 2 mil); o equivalente a 60% da diária inicial da propriedade.

Eleito por diversas vezes o melhor hotel do mundo, o Royal Mansour Marrakech se juntou ao designer parisiense Christian Louboutin na confecção de uma babuche. Batizado Lady Mansour, o calçado tem a estampa inspirada na decoração do emblemático spa da propriedade marroquina. Finalizado com delicados detalhes em couro specchio, tem a inconfundível sola vermelha, marca registrada de Louboutin. A € 800 (R$ 4,9 mil, aproximadamente), foi um enorme sucesso de vendas.

A babouche criada por Christian Louboutin em parceria com o Royal Mansour Marrakech custa quase R$ 5 mil (Foto: Divulgação)

Os lenços de seda do Savoy, de Florença, com a marca Emilio Pucci traz desenhos do hotel e da Piazza della Repubblica, endereço da propriedade na Toscana (Foto: Divulgação)

Os pijamas feitos a mão, fruto da associação do SO/Paris e Tom Àdam, custam cerca de R$ 2 mil (Foto: Divulgação)

O conjunto de malas e bolsas do Grand Hotel Tremezzo, confeccionado pela Bric's, refletem o clima das férias no Lago di Como, na Itália (Reprodução: sensoflake.com)

Os quatro perfumes da Guerlain para os hotéis Cheval Blanc foram inspirados nas propriedades do hotel em Courchevel, St Tropez, St Barth e Randhell (Foto: Divulgação)

O Lutetia, em Paris, inovou ao criar um tabuleiro de gamão com a fábrica francesa Hector Saxe,. O preço: R$ 6 mil, aproximadamente (Foto: Divulgação)

O nova-iorquino The Mark, da Preferred Hotels & Resorts, se uniu à britânica Orlebar Brown, famosa por seus shorts masculinos, feitos à mão. Com o monograma e detalhes em cor de laranja, característicos do hotel, as peças custam US$ 395 (R$ 2,2 mil).

O Savoy, de Florença, convidou a secular casa de moda italiana Emilio Pucci para a criação conjunta de uma série de acessórios. Entre eles, um lenço de seda, com o desenho do hotel e da Piazza della Repubblica, endereço da propriedade em Firenze, na Toscana. Seu preço: € 295 (R$ 1,87 mil).

Para além da moda

As collabs dos hotéis com as marcas de luxo se estendem para além do guarda-roupa. Tem a coleção de bolsas, pochetes e malas, com as cores e logotipo do The Beverly Hills Hotel, criadas pela badalada Stoney Clover Lane, cujos preços variam de US$ 24 a US$ 298; o equivalente a R$ 150 a R$ 1,6 mil. E ainda o conjunto de malas da milanesa Bric’s para o Grand Hotel Tremezzo, no Lago di Como, entre € 450 e € 550 (de R$ 2,7 mil a R$ 3,4 mil).

Os luxuosos hotéis Cheval Blanc se uniram à casa de perfumes Guerlain para criar quatro fragrâncias exclusivas, inspiradas nas propriedades do hotel  em Courchevel, St Tropez, St Barth e Randheli. Além disso, lançaram também t-shirts em parceria com a Maison Labiche, lenços e bolsas com a Be Parisian. E entre chinelinhos de quarto, canetas, bloquinhos e necessaires para guardar itens molhados, oferecem cerca de 70 amenidades diferentes para seus hóspedes como cortesia.

O Lutetia, na "rive gauche" de Paris, fez diferente ao propor à fábrica francesa Hector Saxe, que criasse um tabuleiro de gamão exclusivo. Em couro de búfalo, feito à mão, o objeto de decoração custa € 969 (quase R$ 6 mil). O também parisiense Le Scribe se associou à badalada Ely's cocktails para engarrafar os drinques mais famosos do hotel, em versões ready-to-drink — € 12 (R$ 74), cada uma, com 200 mililitros.

Um namoro de férias, que sobe a serra

O sucesso de tais produtos são reveladores de como, ao longo dos últimos anos, os limites entre bens e experiências sofisticadas estão cada vez mais tênues, sobretudo na indústria do turismo. A evolução no conceito de luxo é um movimento liderado, em grande parte pelas novas gerações de viajantes.

E as parcerias são, na imensa maioria dos casos, operações win-win. Ganham os hotéis, com a oportunidade de reforçar ainda mais a relação com seus hóspedes, de se fazerem presentes na vida deles mesmo depois das viagens e de ampliar suas fontes de receita.

Ganham também as marcas que têm a possibilidade de acompanhar seus clientes onde quer que eles estejam, de desbravar novos mercados e conquistar diferentes perfis de consumidores.

A associação entre o Ritz, de Paris, e a Frame, por exemplo, teria sido ideia da empresária Camilla Fayed, filha de Mohamed Al-Fayed, dono da propriedade. A collab com uma das grifes de jeans prediletas dos fashionistas moderninhos seria uma forma de aproximar o hotel dos turistas das novas gerações.

Ao que tudo indica, a relação entre a alta hotelaria e as marcas de luxo, sobretudo as de moda, não é amor passageiro de férias. Tem, sim, tudo para se firmar como casamento dos mais duradouros. Como mostra a International Luxury Travel Market (ILTM), no relatório Barton e Wealth-X, essas colaborações tendem a dar muito certo porque, ao fim e ao cabo, todos os segmentos envolvidos têm um mesmo público-alvo.

A partir de agora, ao voltar as férias, os viajantes mais endinheirados devem trocar o tradicional "comprei em Paris, Florença e Nova York" por "comprei no Ritz, no Savoy e no The Mark".