A geopolítica do mercado global de arte mudou. No início dos anos 2010, com os Estados Unidos e a Europa em recessão, as peças deste enorme tabuleiro se movimentaram em direção à América Latina. Desde a pandemia de covid-19, no entanto, elas foram rumo à Ásia e ao Oriente Médio.

Apesar de todos os obstáculos, o Brasil conseguiu se manter relevante no cenário internacional. E a SP-Arte ilustra à perfeição a resiliência do mercado brasileiro — e o prestígio de nossa arte e de nossos artistas no exterior.

A ser realizada entre 2 e 6 de abril, no Pavilhão da Bienal, no Parque do Ibirapuera, a maior feira de arte da América Latina, do qual o NeoFeed é parceiro de mídia, chega à sua 21ª edição, com um recorde e muitas novidades.

Está confirmada a presença de 70 convidados internacionais, entre patronos e curadores de instituições, como o Museu de Sydney, e colecionadores americanos, japoneses e alemães.

“É o triplo do que veio nos últimos anos”, afirma a advogada e colecionadora Fernanda Feitosa, diretora-executiva da SP-Arte, em conversa com o NeoFeed. “Como muitos vêm com seus art advisors, a expectativa é de que seja um público com intenção de compra.”

Em número de expositores, porém, a participação estrangeira está menor. As galerias de fora já representaram cerca de 30% dos participantes. Agora, em 2025, somam pouco mais de 10% — exatas 12 em um total de 102. Delas, quatro são estreantes, o que sinaliza uma renovação no interesse internacional pela SP-Arte e, consequentemente, pelo Brasil.

Assim, Fernanda segue firme no propósito de fomentar a expansão de arte brasileira no mercado global. Ao longo das duas últimas, porém, ela fez mais. Os brasileiros passaram a se interessar pelo o que é produzido aqui e os negócios fervilharam.

“A SP-Arte é o faturamento mais importante de 99% das galerias brasileiras”, diz a diretora do evento. Em cinco dias, pelos corredores do prédio projetado por Oscar Niemeyer, a feira chega a movimentar cerca de 30% de todas as vendas realizadas no Brasil, ao longo de um ano inteiro.

O mercado nacional girou, em 2023, US$ 580 milhões. Esse montante, porém, equivale a somente 0,89% do mundial, como mostra o levantamento da Abact. Ou seja, há ainda muito espaço a ser conquistado pela arte brasileira no mundo. Mas, como costuma dizer Fernanda, “o Brasil precisa ajudar, né?”

A seguir, o NeoFeed faz um apanhado dos principais destaques da SP-Arte, revelando as tendências para 2025:

Os mecenas do nosso tempo 

Criado para esta edição, o Palco SP-Arte promoverá nove rodas de conversa, cujos temas abordam também o papel do colecionador, figura fundamental para todo o ecossistema de arte.

“Seja pequeno, médio ou grande, ele é um treasure keeper que acaba influenciando todos e tudo à sua volta, fazendo a engrenagem rodar”, diz Fernanda. “O mecenas do passado é o colecionador contemporâneo.”

Cinco obras do artista da cadeira "Chifruda" estarão à venda na SP-Arte. Desenvolvida por Sérgio Rodrigues (1927-2014), nos anos 1960, a peça é emblemática da potência do design brasileiro (Foto: sergiorodriguesatelier.com.br)

A galeria Galetea leva para a SP-Arte um díptico do belga Francis Alÿs, de 65 anos. A peça faz parte da série ‘The Sign Painting Project", uma interpretação do artista sobre o trabalho dos chamados rotulistas, os pintores comerciais especializados em anúncios. O projeto foi desenvolvido entre 1993 e 1997, na Cidade do México, onde Alÿs vive (Foto: Ding Musa/Olivia Tavares)

"Parede com incisões", de 2000, é a homenagem da carioca Adriana Varejão ao argentino-italiano Lucio Fontana (1899-1968). Com a série "Buchi", de 1949, o artista rasgava e furava as telas, em uma reflexão sobre o espaço por trás daquelas superfícies planas. O trabalho de Adriana será levado à SP-Arte pela Galatea (Foto: Eduardo Ortega)

Vivendo em Paris, o artista e cineasta colombiano Iván Ragote será representado na feira pela galeria Vermelho. Aos 41 anos, ele é conhecido por suas grandes instalações. A obra "Juntes” se conecta a “O Outro, Eu e Os Outros”, instalação interativa que, desde a semana passada, ocupa o Vão do MASP (Foto: Edouard Fraipont/Nicolas Garavello)

Entre os trabalhos a serem apresentados pela recém-inaugurada galeria Yehudi Hollander-Pappi, está "Stalker I (The War of the Roses),", de 2024, da mineira Luisa Alcântara.

"Cadeira Docinho" foi desenvolvida pelas designers Fernanda Pompermayer e Anália Moraes. Integrante da mostra "Inteligência material", o objeto é todo feito de upcycling: a cadeira for garimpada e revestida com celulose de bitucas de cigarro e cacos de cerâmica (Foto: Divulgação)

O interesse por obras de artistas mulheres vem em alta, como aponta o estande da galeria Flexa; inteiramente dedicado a elas. Entre os trabalhos, está o "Infinity nets", de 2014, da japonesa Yayoi Kusama (Foto: Rafael Salim/Maria Gabriela Mexias Rodrigues)

A colombiana Olga de Amaral, de 92 anos, é uma das representas mais importantes da artes têxtil. No ano passado, ela ganhou uma exposição na Fundação Cartier, em Paris . Olga estreou na SP-Arte em 2014 e voltou à feirra nos dois anos seguintes. Nesta edição, sua obra é representada pela Casa Zirio (Foto: Casa Zirio Gallery/Estefania Carbo)

O estande da galeria RGR reúne figuras fundamentais da arte cinética e geométrica. Entre eles, o venezuelano Carlos Cruz-Diez (1923-2019). A obra "Physichromie Panam 198", de 2015, ilustra sua reflexão sobre a cor como uma experiência em si mesma (Foto: Jessica Balsaneli)

A designer chilena Margarita Talep descobriu no ágar, substância gelatinosa encontrada nas algas marinhas, a matéria-prima para a criação de vasos. As peças fazem parte da exposição patrocinada pela empresa Arauco (Foto: Divulgação)

A urna cinerária Mar faz parte da exposição "Inteligência material". Desenvolvida pelos designers da Furf, a convite da Mush, startup focada em produtos feitos de micélio, a peça flutua na água e se degrada lentamente, espalhando as cinzas por onde passa (Foto: Divulgação/Mush)

Além de fomentar o mercado, os colecionadores ajudam as instituições de arte com empréstimos e doações de obras. O primeiro Djanira do Masp, A vendedora de flores, de 1947, por exemplo, foi oferecido ao museu paulista por Orandi Momesso, dez anos atrás, lembra Fernanda.

A própria SP-Arte tem um programa de incentivo às doações. Quase duas centenas de trabalhos já foram comprados por colecionadores e empresas e repassados para o Masp, o MAM e a Pinacoteca de São Paulo, entre outros.

É comum também que os colecionadores ajudem diretamente os artistas. “A quem eles recorrem quando precisam de dinheiro? Ao governo? Não, às suas galerias e/ou colecionadores”, comenta Fernanda. "Os colecionadores formam uma comunidade muito comprometida.” Marcada, como ela diz, por um forte sentimento de responsabilidade.

Um dos panelistas do Palco SP-Arte é americano David Teplitzky. Aos 63 anos, radicado na Tailândia, ele é um entusiasta das novas gerações. “Ele veio na SP-Arte do ano passado e amou tanto que voltou em agosto para a Rotas [a feira SP-Arte Rotas Brasileiras, dedicada às produções regionais] e está voltando agora de novo”, diz Fernanda. “Ele quer falar sobre o que está descobrindo no Brasil.”

Mulheres em alta

As obras de artistas mulheres continuam em ascensão. Pesquisa da organização Art Basel, em parceria com o banco e do UBS, mostra: nas coleções dos HNWIs, elas somam hoje, em média, 44% dos acervos — o nível mais alto em sete anos, quando eram 33%. E esse índice é ainda maior (52%) entre os que gastaram mais de US$ 10 milhões em arte, no ano passado.

Estreante na SP-Arte, a galeria carioca Flexa terá um estande composto exclusivamente por trabalhos assinados por mulheres, reunindo diferentes gerações de nomes nacionais e internacionais. Entre elas, Yayoi Kusama, Beatriz Milhazes, Judith Lauand, Lygia Pape e Sonia Gomes.

Viva o design

Em 2025, a presença de designers na SP-Arte será ainda maior. Eles chegaram na edição de 2016 e agora são 81 — em 2024, foram 71.

Um dos destaques é a mostra Inteligência material, pela Arauco, empresa de celulose e madeira. “O mote da exposição é a relação estabelecida entre o designer e os materiais que escolhe para fazer suas peças, cujo resultado nem sempre é aquele que ele esperava”, explica Fernanda. “Existe uma certa poética nesse embate.”

A maioria das peças é assinada por jovens designers e prima pela inovação, tendo como foco a sustentabilidade. Fernanda Pompermayer e Anália Moraes criaram a Cadeira Docinho, inteiramente feita de upcycling.

Sobre uma cadeira garimpada, elas sobrepuseram celulose de bitucas de cigarro recicladas e fragmentos de cerâmica (veja nas imagens acima outros trabalhos da exposição bem como algumas obras de arte presentes na feira).

A dois anos do centenário de nascimento do gênio do design Sérgio Rodrigues, o atelier que leva seu nome, coloca à venda cinco provas do artista da poltrona Chifruda.

De 1962, a peça foi desenvolvida para a exposição Móvel como objeto de arte, na galeria carioca OCA, em 1962.

Prêmios

Este ano, a SPA-Arte lança dois prêmios. O vencedor do Arauco SP-Arte de Inovação e Sustentabilidade será agraciado com uma viagem para o Salão do Móvel de Milão 2026 e crédito para participar do evento paulista em 2026.

Já o Artefacto SP-Arte Melhor Design oferece um convite para Art Basel Miami Beach 2025 e um estande na 22ª edição da feira paulista.

Os grandes

Em um evento de arte que se propõe internacional, não podem faltar os artistas já consagrados. Alguns dos nomes mais emblemáticos das artes plásticas (do Brasil e do mundo) estarão presentes na SP-Arte. Amilcar de Castro, Eleonore Koch, Maxwell Alexandre, Pierre-Auguste Renoir, Mira Schendel, Siron Franco, Olga de Amaral, Louise Bourgeois, Alfredo Volpi, Bruce Nauman, Francisco Brennand, Joan Miró… e Lucas Arruda, o pintor paulistano de 41 anos, primeiro brasileiro a expor no Musée d’Orsay, em Paris, com uma individual a ser aberta em 8 de abril.