No cofre, na caixinha de veludo ou adornando pescoços, orelhas ou dedos: joias que trilham as premissas ESG reluzem mais para os consumidores. A Vivara, maior rede joalheira do país, escolheu esse caminho ao atuar no “maior risco do negócio”: a cadeia de fornecimento.
“Temos nosso ouro 100% mapeado e responsável. Compramos da mineradora AngloGold que faz sua extração em Minas Gerais”, disse ao Neofeed o CFO da Vivara, Otavio Lyra.
A empresa, hoje avaliada em R$ 6,2 bilhões, abriu seu capital na B3 em outubro de 2019. Para tanto, teve que se adequar as exigências de governança e sustentabilidade, uma vez que os metais e gemas representam “um terço dos custos”. “Estabelecemos um código de ética para a cadeia de suprimentos e a meta é auditar 100% dos fornecedores de matéria-prima.”
Desde 2020, as metas de ESG estão atreladas ao bônus de executivos da empresa. Em 2021, no entanto, houve uma revisão no plano estratégico e o tema passou a fazer parte do pilar de “sustentação do negócio”.
Hoje, a companhia utiliza 100 quilos de ouro por mês em sua produção. Mas tem se beneficiado de campanhas implantadas há alguns anos baseadas na recompra de joias antigas de consumidores na troca por novas. “Atualmente, um quarto do ouro que usamos já vem dessa prática de economia circular e que, ao mesmo tempo, permite uma recorrência do cliente nas lojas”, diz Lyra.
O próximo passo é implantar o mesmo sistema também para prata, uma vez que 30% do resultado da companhia vem deste metal. O principal canal de venda de prata é a Life, marca de joias mais acessíveis da Vivara, e na qual a companhia deve centrar seu “plano de expansão mais agressivo” com novas lojas.
"Sabemos que 83% dos consumidores preferem comprar de empresas alinhadas com seus valores. Por isso estamos reforçando nossos compromissos no ambiental e no social. Somos membros do RJC (Conselho de Joalheria Responsável), do IRMA (Initiative for Responsible Mining Assurance) e do Pacto Global."
Rastrear a origem do metal precioso é uma tarefa dificílima, mas é crescente o interesse dos consumidores em saber de que forma e de onde vem o ouro que estão comprando. Em especial nas joias de autor, como as do brasileiro Fernando Jorge. Com uma carreira estabelecida em Londres, ele tem sido questionado internacionalmente se o metal que utiliza em suas peças viria de terras indígenas, da Amazônia.
No ano passado, o designer Ara Vartanian também anunciou seu comprometimento em trabalhar com fornecedores que praticam a “mineração consciente”, já se alinhando a esse movimento que tem pautado diferentes players do setor.
Em recente relatório sobre o desempenho do mercado de diamantes, a consultoria Bain & Co em conjunto com o Centro Mundial de Diamantes da Antuérpia (AWDC) destacaram a pressão de investidores e consumidores pela pauta ESG. A rastreabilidade teria se tornado uma das prioridades para as mineradoras.
O conglomerado De Beers, de diamantes, está lançando, por exemplo, um programa com código de origem de suas pedras e a mineradora russa Alrosa está desenvolvendo tecnologia de marcação a laser de seus diamantes.
“Os consumidores estão demandando por rastreabilidade e transparência também na joalheria. No nosso laboratório de verificação, a demanda cresceu 30%. São consumidores, mas também varejistas que precisam dar garantias de autenticidade e procedência da matéria-prima para seus clientes”, diz Écio Morais, diretor do Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos (IBGM).
Por sua constituição geológica e lapidação, explica ele, as gemas são mais fáceis de serem identificadas. Já o metal não carrega estes traços de origem. “Da forma como o setor opera hoje, para se ter a garantia de procedência, é necessário recorrer as grandes mineradoras que atendem ao mercado internacional."
Segundo Morais, elas precisam seguir uma legislação muito mais rígida tanto aqui quanto lá fora, "como regeneração do solo e relatórios de impacto, por exemplo.”
Para se ter uma ideia, destaca, até hoje a emissão de nota fiscal é manual na primeira aquisição do ouro no país - que pode vir ou não do garimpo ilegal. O Banco Central só fiscaliza o metal no momento em que ele entra nas DTVMs.
“Todo o percurso anterior deveria ser fiscalizado pela Agência Nacional de Mineração que tem sido inoperante. Cada vez que o preço do ouro sobe, a informalidade cresce”, diz Morais. O metal precioso chegou a ter uma grande valorização em 2020, mas registrou queda em 2021.
O Brasil produz 100 toneladas de ouro por ano, estima Morais, sendo que 80 toneladas são extraídas pelas grandes mineradoras focadas em exportação. “Cerca de 15 toneladas de ouro no país estão, contudo, numa zona cinzenta.”
Com fábrica na Zona Franca de Manaus, a Vivara poderia recorrer a fornecedores da região por uma questão de custos de logística, mas optou por trabalhar com a AngloGold, em Minas Gerais.
“Estamos assumindo o protagonismo no mercado brasileiro de joalheria que é pulverizado e no qual 80% são de pequenos negócios familiares. Temos um papel de profissionalização a desempenhar. Precisamos ter independência e garantia de fornecimento para dar conta da escala do nosso negócio”, diz Lyra.
A Vivara alcançou uma receita líquida de R$ 916 milhões nos primeiros nove meses de 2021 e registrou um crescimento de 56,3% em relação ao mesmo período de 2020 e 20% de 2019.
Até outubro do ano passado a rede contava com 275 pontos de venda com lojas e quiosques Vivara e Life. “Somos hoje cinco vezes maior que o segundo colocado.” No ranking das joalherias, a vice-liderança fica com Pandora, seguida por H.Stern e Monte Carlo.
É possível medir um reconhecimento do mercado com relação as práticas ESG adotadas pela companhia? “Temos acompanhado o movimento dos principais fundos mundiais e a demanda pelo alto grau de sustentabilidade nos investimentos. Quando a chave virar, estaremos prontos”, diz Lyra.