O recém-lançado Brunello di Montalcino Vigna del Suolo é o primeiro vinho criado desde que o banqueiro André Esteves, chairman do BTG Pactual, comprou a Argiano, em 2013. Riccardo Bogi, diretor-comercial de vinícola, recorda do clima de incerteza na equipe quando souberam que a propriedade tinha um novo dono e a tranquilidade após as diretrizes traçadas por Esteves.

“Ele apenas nos pediu para fazer o melhor Brunello possível, o foco não é fazer grandes volumes, mas produzir o melhor vinho a cada ano. E isto está no DNA de Argiano”, disse Bogi ao NeoFeed. Hoje todo o cultivo da propriedade é orgânico e adotam algumas práticas da biodinâmica.

Um exemplo desta vocação de Argiano está justamente na Vigna del Suolo. Trata-se de uma parcela de vinhedo com 4,4 hectares, plantada em 1965. Na administração anterior a de Esteves, estava nos planos replantar as videiras dessa parcela, que já eram velhas e pouco produtivas. O viticultor Francesco Monari "bateu o pé” e não permitiu o replantio. “Essa vinha é literalmente uma sobrevivente e ali estão nossas maiores joias”, disse Bogi.

A Vigna del Suolo está plantada com 90 diferentes clones de Sangiovese, resultado de trabalho de 30 anos para analisar individualmente cada videira e retrata uma diversidade única em Montalcino. Para entender o pedigree desta vinha, dali saíram as mudas plantadas no principal vinhedo do vizinho Soldera, o Case Basse. Para muitos conhecedores, a maior referência de qualidade em Brunello di Montalcino.

Anterior à criação do Brunello di Montalcino Vigna del Solo, as uvas deste vinhedo davam origem ao Suolo, um vinho com classificação “menor" de IGT (hoje como Brunello é um DOCG), com um rótulo vermelho, que a proprietária anterior, condessa Noemi Marone Cinzano, se inspirou nos saltos de Louboutin (embora já tivesse preço superior ao Brunello di Montalcino annata).

O Vigna del Suolo 2016 sai por R$ 1.780, importado pela Inovini

Entretanto, a grande diferença está na forma de vinificação. Suolo era pensado como um vinho de Bordeaux, colhido com uvas mais maduras, maior extração das cascas e uso de barricas novas de carvalho francês.

Na versão Brunello di Montalcino Vigna del Suolo, a colheita é realizada mais cedo, para preservar a acidez característica da Sangiovese e a vinificação se faz em grandes toneis (botti) de carvalho da Eslovênia e França, de Garbellotto, considerada a Ferrari das tanoarias.

“O preço médio de um botti de 3.000 litros de capacidade está em torno de 10 mil euros”, diz Bogi. O vinho estagia ali por 30 meses e depois segue para a garrafa, onde permanece por mais 10 meses antes de ir ao mercado.

A safra 2016, a segunda produzida como Brunello di Montalcino de vinhedo único (a anterior foi 2015), acaba de chegar ao mercado brasileiro (R$ 1.780,00, importado pela Inovini) e já ganhou as cobiçadas 3 Bicchieri de Gambero Rosso, principal guia de vinhos italianos.

Além disso, arrematou também o título de melhor vinho tinto do ano 2022 pelo mesmo guia. Nesta safra foram produzidas 5.240 garrafas deste rótulo e na safra, 2017, o vinho não será lançado pois as condições climáticas não foram consideradas excepcionais. Neste caso, as uvas foram destinadas ao Brunello di Montalcino annata.

Da mesma parcela Vigna del Suolo saem os 37 clones selecionados para o replantio dos vinhedos de Argiano, conforme a necessidade. Esse trabalho de identificação das videiras, cruzando os dados com o subsolo onde estão plantadas foi um processo incentivado e acelerado pela chegada do consultor-técnico Alberto Antonini, logo em 2014. O enólogo, de origem toscana, levou consigo o especialista chileno em geologia, Pedro Parra. Por acaso, a dupla também atua em outra propriedade icônica de Montalcino, a Biondi-Santi.

A primeira safra do Vigna del Suolo é de 2015. Nessa versão, o Brunello tem a colheita realizada mais cedo para preservar a acidez característica da Sangiovese

Exemplo do resultado do trabalho de Parra pode ser exemplificado de uma comprovação científica de algo empírico. Um dos vinhedos de Argiano se chamava Malavoglia (“à contragosto”, em tradução livre). “Como se pode imaginar, era um vinhedo que não se desenvolvia, as videiras batalhavam para crescer. Com Pedro Parra descobrimos que há cerca de meio metro de profundidade está a rocha mãe e as raízes não conseguiam desenvolver”, comentou Bogi. Logicamente, o vinhedo foi arrancado.

Riccardo Bogi, entretanto, ressalva que não há concorrência ou exclusividade no trabalho com os consultores, afinal, a Biondi Santi está na parte nordeste de Montalcino, com clima mais continental e altitude mais elevada, enquanto Argiano está no sudoeste, no declive do platô de Montalcino em direção à costa tirrena, em altitudes que variam de 280 à 600 metros, duas condições naturais distintas que dão origem a vinhos com diferentes expressões.

Na parte mais baixa estão plantadas variedades que precisam de mais calor para amadurecer, como as francesas Cabernet Sauvignon e Petit Verdot, que dão origem ao Supertoscano Solengo (mescla de Cabernet Sauvignon, Petit Verdot, Merlot e Sangiovese). Solengo de Argiano foi criado pelas mãos de outro craque toscano, o enólogo Giacomo Tachis. Tachis foi o idealizador de Sassicaia, Tignanello e Solaia, entre outros tantos supertoscanos.

No mesmo ano da colheita do celebrado Vigna del Suolo, em 2016, Esteves também investiu na reforma completa da vila de Argiano, chamada de Bell'Aria

Ainda que Solengo mantenha sua reputação, o foco de Argiano está direcionado para as expressões mais tradicionais de Montalcino e com a Sangiovese. Além do Rosso di Montalcino e os Brunello di Montalcino, Brunello Riserva e Brunello Vigna del Suolo, os dois próximos lançamentos previstos também integrarão a linha DOCG de Brunello di Montalcino de vinhedos únicos: Vigna Fornace Nuova e Vigna Poggio al Vento, este possivelmente um Riserva.

No mesmo ano da colheita do celebrado Vigna del Suolo, 2016, Esteves também investiu na reforma completa da vila de Argiano, chamada de Bell'Aria. A construção que também abriga a adega de amadurecimento dos vinhos, data de 1580, ano de fundação da vinícola. “Por ser um patrimônio com arquitetura protegida, a reforma teve que ser lenta e cuidadosa, o que tomou seis anos de obras e alguns milhões de euros”, comentou o diretor comercial da vinícola.

Agora a construção abriga no rooftop uma coleção de obras renascentistas, um piso com habitações para hóspedes, outro com os escritórios e o restaurante, além do subsolo onde está a adega para maturação dos vinhos e parte da coleção de garrafas de Esteves, grande parte com Brunello di Montalcino (não só de Argiano), Bordeaux e Borgonha.