“Estamos nos afogando em nosso descontentamento, submersos nas profundezas de não sermos o suficiente, buscando a perfeição porque todos os outros parecem perfeitos sem esforço”.

Esse trecho do livro "A armadilha da perfeição: O poder de ser bom o suficiente em um mundo que sempre quer mais" (Ed. Fontanar) sintetiza o pensamento de Thomas Curran, professor de psicologia da London School of Economics e que se tornou um fenômeno mundial no assunto ao ser o primeiro a comparar o perfeccionismo entre gerações.

Curran, que foge do tom alarmista e procura apresentar insights, já alcançou mais de três milhões de viewers no YouTube, com sua palestra no TED sobre a temática.

No fundo, diz ele, sabemos que o perfeccionismo não é uma forma normal ou natural de existir. “Entendemos, por sermos humanos, que ninguém é nem nunca pode ser perfeito. E reconhecemos em nosso coração, senão em nossa cabeça, que essa grande armadura está nos pesando”.

Em 13 capítulos, o psicólogo social, que se autoproclama um perfeccionista, escreve com linguagem acessível a quem se sente sobrecarregado – o que se tornou um lugar comum nas corporações.

No livro, ele oferece lições importantes sobre os perigos de se celebrar a busca do perfeccionismo em nossa sociedade nos diferentes ambientes, seja na escola, em casa, e, principalmente, no trabalho.

O mais preocupante para o estudioso britânico é que, nos últimos 25 anos, como aponta sua pesquisa, a obsessão pelo perfeccionismo aumentou tanto que está impactando de forma brutal a saúde mental das pessoas, sobretudo a dos jovens, a ponto de haver crescimento significativo na taxa de suicídio ao redor do planeta.

Curran enxerga o trabalhador da sociedade contemporânea como alguém inseguro. Ele enumera uma série de circunstâncias nos últimos anos que nos fizeram desembocar neste estado psicológico que classifica como doentio: desmantelamento das proteções trabalhistas, maiores exigências para os autônomos e ameaças das novas tecnologias em acabar com empregos, como a Inteligência Artificial.

Uma de suas interpretações é que nos apavoramos hoje com o fato de nos termos tornado “dispensáveis”. De acordo com seus cálculos, um adulto médio, via de regra, vai trocar de emprego ao menos 12 vezes ao longo de sua carreira e passar grande parte dela no que chama de “o mais desanimador dos lugares: a economia informal”.

A outra questão apresentada no livro é o altíssimo nível de exigência dentro das empresas, com pressão constante para que o funcionário seja cada vez mais veloz. “Dentro dessa economia diferente, o mais importante não é o quanto você pode se aprofundar em algo, mas o quão rápido consegue terminar uma coisa e passar para a próxima”, escreve ele.

E a régua das expectativas sobe à medida que as demandas profissionais aumentam. Curran relata algumas histórias de como esses padrões de perfeccionismo dentro das companhias estão chegando a níveis alarmantes.

Usa como um dos exemplos a fintech mais valiosa da Grã-Bretanha, a Revolut, que em seu anúncio de vagas alertava aos candidatos que se eles ficassem abaixo da ‘perfeição’ seriam avaliados com rigor e não com generosidade.

Como já demonstram vários estudos no campo da saúde, o sentimento de exaustão foi exacerbado com a pandemia do coronavírus. O livro destaca uma pesquisa de trabalho e bem-estar da Associação Americana de Psicologia, com taxas acentuadas de burnout entre 2020 e 2021: oito em cada dez relataram estresse acentuado relacionado ao trabalho.

Mas não é só nos Estados Unidos. O autor traz outro levantamento global de 2022, com cerca de 15 mil empregados de 13 países, em que cada quatro de dez entrevistados menciona sintomas de burnout.

E o que se fazer a respeito disso? Curran é esperançoso ao recomendar que devemos aceitar melhor nossos fracassos, com menos culpa, já que somos seres humanos “falíveis”. Ele, inclusive, discorda do famoso discurso de 2009 de Barack Obama dirigido a crianças norte-americanas. “Você não pode deixar que os fracassos definam você”, disse o ex-presidente.

“Parece um conselho sábio. Mas, se você olhar com mais atenção, a mensagem essencial defende algo definitivamente inumano, pois a implicação é que seus fracassos e defeitos não podem ter a permissão de nos envolver como uma lembrança boa do significado de ser um indivíduo falível”, conclui.

Curran também aconselha a desaceleração como cura para a acentuada busca da perfeição. E neste sentido, ele se assemelha ao sociólogo italiano Domenico De Masi, conhecido internacionalmente pelo conceito de ócio criativo.

“Confie que pode diminuir a velocidade, confie que pode ser feliz quando as coisas estão boas o suficiente, confie que pode ir para casa e ver sua família, visitar seus amigos e passar tempo fazendo as coisas que ama fora do escritório sem se preocupar ou se sentir culpado com o que está sendo perdido.”

Capa do livro

Serviço:
"A armadilha da perfeição: O poder de ser bom o suficiente em um mundo que sempre quer mais"
Thomas Curran
320 páginas
Impresso: R$ 89,90
Selo Fontanar