Tóquio - Assim que o sol nasce em Tóquio, os viajantes a negócios e os nômades digitais invadem os cafés e os espaços de coworkings com internet de alta velocidade. A capital japonesa, uma das metrópoles mais fascinantes do planeta, é conhecida não só pelas boas condições de trabalho remoto, mas por garantir 24 horas de diversão.
Sim, Tóquio foi escolhida este ano como o melhor destino para “workation”, por unir work (“trabalho”) e vacation (“férias”), uma tendência mundial desde a popularização do trabalho remoto. Afinal, a cidade que muitas vezes lembra cenário de filme de ficção científica impressiona pela modernidade, limpeza das ruas, eficiência do transporte, organização e segurança.
Por lá, os policiais certamente passam mais tempo ajudando turistas perdidos nas ruas do que lutando contra a criminalidade. E, ao mesmo tempo, com o seu ritmo frenético e pulsante, Tóquio simplesmente não dorme, o que facilita a vida do visitante castigado pelo jet lag, podendo caçar o que fazer madrugada adentro.
Dia ou noite, há gente para todo lado. Uma das áreas com a maior concentração de pessoas por metro quadrado é o bairro de Shibuya, chamado de “formigueiro humano”. Lá está o maior cruzamento do mundo, rodeado de edifícios que abrigam hotéis, lojas, karaokês, bares, restaurantes e uma infinidade de cafés work-friendly, como o Freeman Café e o Valley Park Stand.
De fato, são muitos os motivos que fazem dessa região metropolitana, uma das mais populosas do mundo, com 33 milhões de habitantes, a cidade dos sonhos para equilibrar trabalho e lazer. Até a qualidade de comida pesa a favor, já que Tóquio se mantém como a capital mundial da gastronomia, ao somar o maior número de restaurantes com estrelas concedidas pelo Guia Michelin.
Outros critérios, como clima, acomodações, sustentabilidade e cultura, contribuíram para colocar Tóquio no topo do último Barômetro do Trabalho Remoto. Assim é chamado o levantamento anual realizado pela International Workplace Group (IWG), empresa suíça especializada em soluções de espaço de trabalho.
O que também ajudou Tóquio a conquistar 91 dos 120 pontos máximos da pesquisa foi a sua proximidade das montanhas, das regiões costeiras e dos parques nacionais. “Ideal para trabalhadores híbridos que buscam uma atmosfera urbana estimulante aliada a escapadas pela natureza”, conforme justifica a IWG no relatório.
A paulista Anna Ligia Pozzetti, que viaja com regularidade ao Japão como intérprete de conferências, concorda com a escolha de Tóquio como um paraíso para quem viaja a trabalho.
“A cidade dá a oportunidade de vagar em busca de descobertas, com muitas opções de descanso e descompressão”, conta ao NeoFeed Pozzetti, mestre em história econômica pela Unicamp, com pesquisa sobre a formação do capitalismo no Japão.
“Ao final do dia, tenho um universo de possibilidades pela frente. A cidade oferece uma atmosfera vibrante, mas também refúgios de silêncio, natureza e calmaria. Tudo isso recarrega as minhas energias e, acredito, impacta positivamente na minha produtividade”, completa.
O avanço do “workation” em Tóquio ainda acirra a competitividade entre os hotéis. O estiloso Agora Tokyo Ginza oferece dois ambientes confortáveis para “trabalho, networking e relaxamento”: o Ichié Lounge e um espaço ao ar livre, no último andar do hotel, situado em Ginza, um dos bairros preferidos dos profissionais interessados em compras de luxo e alta gastronomia nas horas vagas.
“Somos um retiro de Ginza, onde moda e cultura se misturam durante o dia e os adultos se reúnem, depois do trabalho, para uma vida noturna sofisticada”, afirma o gerente geral do hotel, Shigehiko Ito, em entrevista ao NeoFeed.
Outra estratégia dos hotéis é ajudar no vigor físico de quem vem de longe e precisa começar a trabalhar imediatamente, apesar de se sentir grogue nos primeiros dias.
“O foco do nosso café da manhã é justamente o bem-estar. Foi criado para aliviar o cansaço de viagens longas e iniciar o dia confortavelmente, com ingredientes nacionais da estação e temperos sem aditivos no cardápio”, afirma ao NeoFeed Yoshitomo Fujikawa, gerente de marca do Shiba Park Hotel, que oferece um curry vegetariano “milagroso” para começar o dia.
Como o hotel está do lado do Shiba Park, no distrito de Shiba, Fujikawa aconselha o profissional remoto a passear pelo parque, “para recalibrar o corpo e a mente”, antes do trabalho. E se o hóspede conseguir fazer uma pausa de uma hora ao longo do dia, ele recomenda as experiências culturais dentro do hotel. Seja o ritual da cerimônia do chá ou um workshop de Kintsugi, a arte japonesa de reparar cerâmicas quebradas, juntando os cacos e realçando a beleza das imperfeições.
São muitas as iniciativas para inserir o profissional remoto na cultura japonesa. O Park Hotel Tokyo, no distrito de Higashi-Shinbashi, por exemplo, apresenta Artista no Hotel, um projeto nos moldes de residência, em que artistas japoneses transformam cada quarto em obra de arte única, proporcionando uma experiência imersiva.
Wakako Kawakami e Nagisa Nakauchi foram as últimas a assinarem um quarto no Park. Segundo a curadora do projeto, o quarto batizado de Utopia no Japão oferece “relaxamento em um mundo tranquilo inspirado na estética tradicional japonesa de pássaros e flores”.
Outro modo de mesclar trabalho e descontração é aderir ao que o gerente do hotel Tsuki Tokyo, Tatsuya Kobayashi, chama de “sabedoria nipônica”, ao vivenciar em um só lugar vários aspectos da cultura local. “Temos quartos com banheiras de ofurôs de madeira hinoki (cipreste) e uma opção de banho comunitário”, conta em conversa com o NeoFeed, lembrando que o hotel ainda oferece um bar de saquê japonês, outra tradição.
Independentemente do hotel, o mais importante para o americano Travis Wright é “caminhar por Tóquio com a mente aberta, tomada pela curiosidade”: “Você tem acesso a tudo por lá, do simples ao caótico. E o melhor é que, nas horas vagas, a próxima coisa a explorar é muito fácil de encontrar, já que tudo é tão organizado”.
Foi assim que Wright, criador de conteúdo digital sobre cultura e viagem em língua inglesa, encontrou a Tanuki Street, no distrito de Asakusa, na sua última passagem a trabalho por Tóquio, em junho. “É uma rua com várias estátuas representando diferentes tipos de Tanukis”, comenta ele com o NeoFeed, referindo-se à figura mitológica de uma espécie de cão-guaxinim.
Sua imagem é, algumas vezes, retratada com uma garrafa de saquê em uma mão e, na outra, boletos de contas que ele se recusa a pagar. Fascinado há anos pelo Tanuki, a ponto de tatuá-lo no seu antebraço direito, um vendedor de estátuas clássicas do personagem. “Ele não acreditou quando mostrei a minha tatuagem”, lembra, rindo.