Onde há comida, há risco de desperdício. Onde há risco de desperdício, há uma frente a ser investigada. E lá está o economista americano Brian Roe. Professor do departamento de economia agrícola, ambiental e do desenvolvimento da Universidade Estadual de Ohio, ele é o autor da clássica “pesquisa do leite”, sobre o impacto dos prazos de validade nas perdas alimentares.

Roe também foi pioneiro nos estudos sobre a relação entre os remédios da classe do Ozempic e o descarte de alimentos. Agora, o pesquisador é o primeiro a medir a quantidade de comida posta fora pelos turistas adeptos dos aluguéis de curta duração, como os oferecidos pela plataforma Airbnb.

Publicado na revista científica Waste Management, o trabalho mostra: terminada a viagem, o valor dos alimentos deixados para trás equivale a 5,1%, em média, da diária de locação. Pode parecer pouca coisa, mas, ao final de um ano, é como jogar US$ 2,3 bilhões no lixo. E isso apenas nos Estados Unidos.

Apesar de a pesquisa de Ohio contar apenas com a participação de americanos, seus resultados servem de alerta para a indústria de aluguel de imóveis por temporada, para os formuladores de políticas públicas e para as organizações de defesa da segurança alimentar e nutricional.

À medida que esse modelo de hospedagem ganha popularidade, cresce, no mesmo ritmo, a montanha de alimentos não consumidos pelos inquilinos até o fim da estadia.

Veja só o tamanho do problema. Globalmente, em 2022, os hóspedes de curto prazo somavam 700 milhões.

Em quatro anos, eles devem chegar a um bilhão — movimentando US$ 256,3 bilhões ante os US$ 134,5 bilhões de 2024, informa a consultoria Grand View Research.

Dos 502 entrevistados pela equipe de Roe, apenas 21% foram instruídos pelos anfitriões sobre como tratar os alimentos excedentes.

Por outro lado, do total de voluntários, quatro em cada dez declararam estar “muito interessados” em contar com esse tipo de conhecimento.

E é aí que o professor Roe vê uma ótima oportunidade a ser explorada pelas plataformas peer-to-peer e pelos anfitriões. As informações sobre o que fazer com as sobras de comida poderiam também entrar no rol dos diferenciais oferecidos pelos imóveis.

Em tempos de caos climático, ameaça aos sistemas agroalimentares e escalada da insegurança alimentar e nutricional, orientações sobre como evitar o desperdício podem valer tanto quanto a localização vantajosa, a alta funcionalidade e a vista privilegiada da casa de aluguel.

Ser um “anfitrião sustentável” pega muito bem.

Os produtos prontos para consumo, como lasanha congelada, são os mais desperdiçados durante a estadia em locações por temporada

Apenas nos Estados Unidos, os custos com os alimentos descartados na hospedagem de curto prazo equivalem a jogar no lixo US$ 2,3 bilhões por ano

Professor da Universidade Estadual de Ohio, Brian Roe é um dos principais nomes das pesquisas contemporâneas sobre o desperdcio de alimentos da atualidade (Foto: aede.osu.edu)

“A lacuna entre as informações fornecidas e as consideradas úteis pelos hóspedes sugere possíveis intervenções, como listar os locais para doação de alimentos e compostagem dos resíduos”, escreve Roe no artigo da Waste Management.

“Essa abordagem, entre outros efeitos, diminui a produção de resíduos, que causam problemas ambientais e logísticos para as cidades”, complementa.

Ao traçar os hábitos e comportamentos alimentares dos inquilinos de temporada, o estudo de Ohio torna-se uma ferramenta importante para a elaboração de programas de combate ao desperdício.

Nove em dez participantes da pesquisa compraram mantimentos durante a estadia, gastando US$ 34,40, em média, por dia. E, de todos os produtos “esquecidos” na locação, 37,1% correspondem a itens prontos para consumo. Em seguida, aparecem os hortifrutigranjeiros, com 22%.

Pelo menos uma vez ao longo da viagem, praticamente todos prepararam uma refeição em casa e saíram para comer fora. Quase oito em cada dez levaram as sobras do restaurante de volta para a unidade alugada. Cerca de 15% da comida, porém, permaneceu intocada na geladeira dos locatários.

Em geral, nota Roe, quanto maior o preço do aluguel, maior é o desperdício. Quando há crianças no grupo, as perdas também tendem a se avolumar.

Algumas descobertas, porém, chamaram a atenção dos estudiosos. O propósito da viagem, por exemplo, não interferiu na quantidade de alimentos descartados.

“Seria de se supor que, com as refeições pagas pela empresa, os turistas de negócios fossem menos frugais”, diz Roe. Justamente por não terem de usar o próprio dinheiro para comprar comida, talvez eles prefiram comer em restaurantes.