Em 2012, quando a historiadora Luiza e o banqueiro Antônio Carlos de Almeida Braga compraram a Fazenda das Palmas, no Vale do Café fluminense, eles só queriam um lugar onde a família pudesse descansar. Qual não foi a surpresa do casal ao descobrir que a propriedade abrigara o terceiro alambique comercial mais antigo do Rio de Janeiro.

Datada de 1855, a construção estava em ruínas, mas a caldeira inglesa, de ferro fundido, de 1909, era um convite à restauração. Orçado em R$ 2,5 milhões, o projeto de recuperação do alambique foi um dos últimos do qual Braguinha, como o financista era conhecido, participou mais ativamente, antes de sua morte, em janeiro de 2021, aos 94 anos.

Hoje, Luiza está à frente dos negócios, com a ajuda das filhas Joana e Maria e do genro Rafael Daló. Herdeiro da Atlântica Seguros, incorporada ao Bradesco, nos anos 1980, fundador do banco Icatu e mecenas do esporte nacional, apesar de apreciador de uma boa caipirinha de limão, o empresário nunca pensara em produzir a bebida. Nem ele nem ninguém da família; então foram todos aprender.

Quando a família decidiu fabricar cachaça, Maria matriculou-se em um curso de curta duração sobre sistemas agroflorestais. “As aulas abriram meus olhos para o potencial que a gente tinha na fazenda”, conta Maria ao NeoFeed. Um de seus professores foi Sergio Olaya, discípulo do suíço Ernst Götsch, que morou na Fazenda das Palmas por seis anos e ajudou a família no reflorestamento da Mata Atlântica e na adoção do novo modelo agrícola.

Depois de quatro anos de estudos e experimentações, em 2017, a cachaça Pindorama foi lançada em Portugal, onde os Braga têm uma quinta. Envasado em garrafas francesas, a aguardente chegou ao Brasil quatro anos depois. Recentemente, começou a ser vendida também na Espanha e na Inglaterra.

A produção atualmente está em torno de 45 mil litros por ano. A ideia é chegar, em 2028, aos 75 mil litros, o equivalente a 100 mil garrafas. Nesse período, a receita bruta deve atingir R$ 500 mil mensais. Apesar de novata no setor, a Pindorama já ganhou alguns prêmios. No último deles, foi eleita a segunda melhor cachaça do Brasil, em 2022.

O sucesso da bebida produzida na Fazenda das Palmas mostra que é possível, sim, aumentar a produção agrícola e, ao mesmo tempo, preservar e regenerar o meio ambiente. O alambique está em uma área de 100 hectares de Mata Atlântica e uma das primeiras iniciativas da família foi recuperar parte do que havia sido perdido, ao longo de anos de devastação.

Cachaça Pindorama da família Almeida Braga

Manter a floresta de pé não faz bem apenas ao planeta, mas aos negócios também. A proximidade com a mata ajuda a manter as condições ideais para a fabricação da cachaça. A umidade típica do bioma é importante, por exemplo, para o processo de fermentação da bebida. “Queremos recriar floresta por onde passarmos”, diz Daló.

No modelo agroflorestal adotado na fazenda, o canavial dividia os 4,6 hectares de lavoura com feijão e milho. Atualmente, os talhões de cana são intercalados com espécies nativas da Mata Atlântica.

Ao contrário das monoculturas extrativistas, a lavoura consorciada promove a regeneração do solo e, consequentemente, torna o sistema mais sustentável e produtivo. “Com esse sistema, melhora a qualidade da cana”, completa Daló.

Alambique da Fazenda Palmas que produz a cachaça Pindorama
O alambique restaurado da Fazenda Palmas

Lá, na Fazenda das Palmas, até o bagaço da cana tem valor. O material, que tradicionalmente vai para o lixo, fornece a energia que faz o alambique funcionar. Os barris usados na fabricação da cachaça Pindorama Ouro são feitos de amburana, árvore típica brasileira.

Ainda que não sejam produzidos pelos Braga, eles decidiram que, para cada tonel, serão plantados dez pés de amburana – o que, nos próximos dois anos, resultará em cem árvores plantadas. “A ideia é compensar as amburanas que estão sendo usadas”, explica Luiza.

Estigmatizada por muito tempo, nos últimos anos, a aguardente passou a ser vista como uma bebida nobre. Com isso, o mercado expandiu, mas ainda há muito espaço para crescer. A capacidade produtiva do País é de 1,2 bilhão de litros anuais, mas a produção é de cerca de 800 milhões, nos cálculos do Instituto Brasileiro da Cachaça.

Em relação às exportações, em torno de 1% do total de bebida fabricada aqui chegou ao mercado internacional, em 2022. As vendas somaram apenas US$ 18,5 milhões, um valor que é recorde para a cachaça brasileira, que chega a 72 países. Em relação ao ano anterior, o crescimento é de 57,4%, em valor, e de 30,4%, em volume.

Apesar da boa aceitação da Pindorama e do potencial de crescimento do setor, a família Braga não vai além das 100 mil garrafas previstas para 2028. “Aí chega! Para ir além dessa quantidade, vai descaracterizar a maneira como produzimos e não queremos ter uma fazenda com essas dimensões”, defende Luiza. “Teríamos de transformar floresta em cana e não faremos isso.”

Ao que Maria resume: “É qualidade versus quantidade”. Em tempo, a caldeira inglesa de 1909, que funcionava a lenha, foi substituída por uma de biomassa.