Há muito se fala sobre os perigos da epidemia silenciosa do mundo industrializado: o consumo exagerado de açúcar. Com a emergência sanitária imposta pelo coronavírus, no entanto, o debate “sabor versus nutrição” ganhou uma nova dimensão.
No pós-pandemia, a maioria dos consumidores está firmemente decidida a encontrar alternativas mais saudáveis para adoçar seus pratos –uma preocupação antes restrita ao universo das orientações médicas e das receitas dos influenciadores de bem-estar.
Esse é o resultado do estudo Sensibly Sweet, do grupo alimentício irlandês Kerry. Divulgado recentemente, o levantamento ouviu 2.784 pessoas, em 24 países – o Brasil, entre os quais.
Quase 80% dos entrevistados estão convictos de que os melhores alimentos e bebidas são os de baixos teores de sacarose, ou seja, o açúcar convencional. A maior parte deles topa, inclusive, pagar mais caro por esses produtos. E, na prática, sete em cada dez já restringem o ingrediente em seu dia a dia.
Nesse capítulo, a pesquisa Sensibly Sweet traz uma curiosidade. O ganho de peso deixou de ser o principal motivo para a redução no consumo do ingrediente, como acontecia no passado. Mais informados, os consumidores sabem que o abuso pode desencadear diabetes, hipertensão, infarto, derrame e até problemas imunológicos.
O movimento contra o açúcar é liderado pelos millenials mais jovens e os representantes da geração Z. Eles são mais abertos a produtos com pouco açúcar e novos adoçantes, desde que o perfil de sabor seja semelhante aos dos alimentos e bebidas adocicados com sacarose.
“O mercado de agora é muito consciente e a fidelidade à marca é um conceito vago, especialmente entre os consumidores das faixas etárias mais baixas”, analisa Soumya Nair, diretora global de pesquisa e percepções do consumidor da Kerry.
Os adoçantes naturais
Outro ponto importante é a origem dos edulcorantes. O mel é o preferido. Em segundo lugar, vem o stevia. Extraído da planta Stevia rebaudiana, o produto não tem caloria e adoça 300 vezes mais do que a sacarose. O problema é o gosto um pouco amargo que deixa na boca.
O ritmo de avanço dos adoçantes naturais é maior do que o de adoçantes em geral. Em 2030, o setor, como um todo, deve chegar a US$ 732,6 bilhões, a uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 3,51%, segundo a consultoria Market Research Future. Já o CAGR dos naturais é de 8%.
O "açúcar oculto"
A mudança de comportamento dos consumidores impacta toda a indústria. Além do açúcar que usamos para adoçar o cafezinho ou preparar o bolo do final de semana, o ingrediente está presente em vários alimentos, em especial os ultraprocessados. O chamado “açúcar oculto” dá cor, aroma e textura e aumenta o prazo de validade dos produtos. Quase 80% dos consumidores fazem questão de saber o que vai em seus pratos.
Reduzir o açúcar, porém, não significa aboli-lo. Apenas 30% dos consultados pela Kerry estão à procura de formulações sem qualquer tipo de adoçante. Dois terços valorizam o dulçor proporcionado pela sacarose.
E isso acontece, sobretudo, em duas ocasiões: nos lanches e momentos de indulgência intencional. Situações ligadas à nostalgia e à busca por conforto exigem, informam os pesquisadores, um grau comparativamente menor de redução de açúcar.
A negativa para os adoçantes
As novas diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS), divulgadas em maio passado, porém, desaconselham o consumo de adoçantes. Os produtos são indicados apenas para os portadores de diabetes.
Para a população em geral, não têm serventia alguma na redução de peso tampouco na prevenção de doenças crônicas. E mais, o uso prolongado dos substitutos do açúcar, conforme os especialistas da OMS, está associado a uma série de problemas de saúde, como o aumento dos riscos cardiovasculares.
Em comunicado, Francesco Branca, diretor de Nutrição e Segurança Alimentar, da organização, recomenda eliminar os alimentos adoçados artificialmente do cardápio e reduzir o dulçor da dietas. A proposta prevê uma mudança ainda mais radical (e difícil) de comportamento - a reeducação do paladar.