O cânhamo reina absoluto entre as fibras têxteis vegetais. Extraído da Cannabis sativa L., cinco vezes mais resistente e durável do que o algodão, acena com a possibilidade de um futuro mais sustentável para a indústria da moda. Essa primazia, porém, pode estar ameaçada.

Quatro jovens empreendedores ingleses, todos engenheiros de design, desenvolveram um tecido a partir da prosaica batata. Em desenvolvimento desde 2022, nos laboratórios da startup Fibe, em Londres, a fibra Patacel é igualmente forte e duradoura.

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Obtida do caule da planta, tem, no entanto, algumas vantagens. Como o diâmetro da fibra é muito pequeno, comparável ao da seda, os fios do tubérculo tendem a ser mais macios.

Além disso, o talo é venenoso, não servindo, portanto, nem para ração animal nem para compostagem. Ou seja, não seria preciso aumentar a produção de batata, para montar um guarda-roupa todinho à base do alimento. As 250 milhões de toneladas do caule postas no lixo todos os anos, no mundo, supriria cerca de 70% da demanda global por novos têxteis.

Tem mais. A toxina solanina é produzida Naturalmente por algumas plantas, a batata entre elas, como mecanismo de defesa contra insetos, ervas daninhas altas temperaturas, radiação solar em excesso e escassez hídrica, entre outros. O poder antimicrobiano da substância se manteria nas calças, camisas e vestidos confeccionados com a fibra Patacel.

Em relação ao preço, o tecido da Fibe seria até 83% mais barato do que o de cânhamo. Plantar batata, segundo a startup londrina, sai mais em conta do que cultivar Cannabis. Por outro lado, a indústria global de têxteis de cânhamo já está consolidada.

Avaliada em US$ 2,29 bilhões, em 2021, deve atingir US$ 23 bilhões até 2031, evoluindo a uma taxa de crescimento anual composta de 27,1%, informa a consultoria Allied Market Research.

A tecnologia Patacel ainda não saiu do centro de pesquisa. Recentemente, a startup recebeu um aporte de quase meio milhão de libras, do governo britânico. O dinheiro será usado para impulsionar as investigações em torno das fibras de batata, sobretudo em como escalar a inovação.

Se o têxtil é de cânhamo ou de batata, o que importa, no fundo, é levar a moda uma transformação radical. E, nesse movimento, quanto mais alternativas, melhor.

A fibra Patacel é biodegradável na terra e no mar

Com uma cadeia de suprimentos longa e fragmentada, o setor têxtil responde por 20% da poluição industrial das águas e quase 10% das emissões globais de gases de efeito estufa, ficando atrás apenas das companhias petrolíferas.

Para se ter ideia da pressão sobre o planeta, uma única camiseta de algodão consome quase 3 mil litros de água, se fabricada segundo os modelos tradicionais de produção. Todos os anos, aterros sanitários espalhados pelo mundo recebem 50 milhões de toneladas de roupas, contaminando o meio ambiente. A reciclagem ainda é baixa. No Brasil, de cada dez peças descartadas, apenas duas recebem o tratamento adequado.

Do jeito que está, impossível continuar. Nos últimos anos, porém, o setor vem se mobilizando na busca pela renovação. Os consumidores, em especial, os mais jovens, também estão mudando. Mais conscientes e exigentes, topam pagar até 40% mais caro por peças confeccionadas a partir de tecidos sustentáveis.

Não à toa, o mercado global de fibras ecológicas, até 2028, deve bater quase US$ 87 bilhões. Em 2021, não chegou US$ 50 bilhões, lê-se em relatório da Fortune Business Insights.

Nos últimos anos, o setor vem se mobilizando para levar a moda rumo à transformação. E, nesse movimento, a participação dos inovadores do ecossistema fashion se torna imprescindível. A fibra Patacel, por exemplo, é biodegradável e pode ser reciclada com outros têxteis naturais.

A inovação sempre esteve no DNA da moda. Mas, nunca como agora, a vocação para a renovação se fez tão necessária.