A Kodak já foi uma das empresas mais inovadoras do mundo na área de fotografia. Mas ficou para trás durante o processo de digitalização, numa história que já ficou clássica.
Vale repetir rapidamente: a empresa inventou a máquina fotográfica digital, mas não apostou suas fichas na inovação. Ao contrário. Preferiu proteger seu mercado de filmes tradicionais e analógicos.
Em 2012, ela entrou em concordata, que durou um ano. Desde então, a empresa tentou se enveredar por outros caminhos. Ela já chegou a apostar em impressoras para escritórios e gráficas, investiu em películas para filmes de cinema e lançou uma plataforma de criptomoeda para fotógrafos. Nada deu muito certo.
Agora, a Kodak tenta mais uma cartada para renascer nas cinzas. A empresa acaba de ganhar um empréstimo de US$ 765 milhões do governo americano para produzir princípios ativos usados no desenvolvimento de medicamentos.
Entre os princípios ativos que serão produzido pela Kodak está a hidroxicloroquina, usada no combate à malária, mas que chegou a ser uma esperança de tratamento para a Covid-19 – hoje, pesquisas científicas têm mostrado que a droga, defendida por políticos como Donald Trump e Jair Bolsonaro, não tem nenhuma eficácia no tratamento do novo coronavírus.
Os recursos recebidos pela Kodak vieram por conta da Lei de Produção de Defesa, antes usada pela administração Trump para acelerar a produção de ventiladores pulmonares, necessários para o combate da Covid-19.
A expectativa é que, com a força da Kodak, os EUA consigam reduzir a dependência internacional, sobretudo da China e da Índia. De acordo com o chefe da força-tarefa de supply chain da Casa Branca, John Polowcyzk, a produção doméstica desse tipo de material passou a ser internacionalizada em 1970, a fim de reduzir os custos.
Atualmente, a China é o maior fornecedor mundial de princípios ativos usados na base dos remédios modernos. Só em 2017, os Estados Unidos importaram US$ 3,9 bilhões em bens relativos a esse segmento, segundo a agência IHS Markit.
A novidade foi comemorada pelo governador de Nova York, Andrew Cuomo, que escreveu em seu Twitter: "Os americanos não devem jamais voltar a contar com insumos estrangeiros durante uma pandemia. O governo federal fez bem em usar a Lei de Produção de Defesa para dar US$ 765 milhões à Kodak para a produção de medicamentos".
Mas nem todo mundo parece celebrar a notícia. Um usuário da rede social, em resposta a Cuomo, disse: "A Kodak produzia máquinas fotográficas, como podemos confiar nela para fazer remédio? Isso parece um pesadelo. Ah, e esqueci de dizer que a empresa tentou construir equipamento para mineração de bitcoin – isso diz tudo!".
De fato, a Kodak chegou ao sucesso graças à fotografia. Nos tempos áureos, na década de 1990, a companhia seria o equivalente à Apple, empregando 145 mil funcionários e dominando 90% do mercado de filmes fotográficos e 85% do de câmeras.
Mas os erros de estratégia e a dificuldade de se adaptar ao mundo digital deixaram a Kodak longe das manchetes e da preferência do consumidor. A entrada no ramo farmacêutico é uma tentativa de recuperar um pouco do tempo perdido. Mas será que uma empresa de fotografia tem capacidade de atuar nessa área?
O CEO da Kodak, Jim Continenza, garante que a infraestrutura e a longa trajetória da companhia na confecção e manipulação de materiais químicos vai permitir que a organização "fique de pé rapidamente" nesse novo mercado de atuação.
A operação de filmes, de fato, requeria a manipulação de alguns materiais químicos, como hidroquinona, fenidona e dimezona, entre outros. Além disso, a empresa teve sua incursão no mundo farmacêutico em 1988, quando comprou a Sterling Drugs por US$ 5,1 bilhões.
Com foco em agentes para diagnóstico por imagem, produtos hormonais, produtos cardiovasculares, analgésicos, anti-histamínicos e relaxantes musculares, a farmacêutica ficou sob domínio da Kodak até 1994.
"Assim que a operação estiver estabelecida, a Kodak Pharmaceuticals terá capacidade para produzir até 25% dos ingredientes farmacêuticos ativos usados em medicamentos genéricos não-biológicos e não-antibacterianos", disse a empresa em comunicado oficial.
A Kodak afirmou, em nota, que "retomar" a atuação nesse setor deve responder por 30% a 40% da receita da companhia ao longo do tempo.
Tamanho otimismo mexeu com o desempenho da ação na bolsa de valores: o valor dos papéis da Kodak passaram de US$ 2,62 para US$ 43,30, nesta quarta-feira, 29 de julho, uma alta de mais de 1.500%. O valor de mercado atingiu US$ 1,8 bilhão.
O dinheiro foi cedido à empresa pela Corporação Financeira de Desenvolvimento Internacional dos EUA, e a Kodak deve pagar esse empréstimo ao longo dos próximos 25 anos. Nesse período, a empresa deve gerar cerca de 1,2 mil empregos indiretos e 350 diretos, sendo 300 vagas na cidade de Rochester, no estado de Nova York, e 50 em Minnesota.
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