Há pelo menos cinco décadas, o mercado publicitário trabalha com boa parte de seus acordos de anúncios sendo firmados com meses de antecedência. Mas o novo coronavírus pode mudar esse sistema e os seus valores.

Nos Estados Unidos, grandes empresas como General Motors, PespiCo e General Mills admitem a possibilidade de reduzir o tamanho e as cifras das negociações vigentes com os principais canais de tevê no país.

Segunda uma reportagem do The Wall Street Journal, os gastos com esse tipo de publicidade já sofreram queda no início da pandemia, mas o impacto foi amortizado porque boa parte dos US$ 42 bilhões gastos com comerciais de TV estavam assegurados por contrato, garantindo fôlego até setembro.

Mas desde o dia 1º de maio os anunciantes têm nas mãos a oportunidade de reduzir em 50% os valores das negociações pré-acordadas, referente às campanhas que vão ao ar no terceiro trimestre deste ano. 

A expectativa é que os anunciantes enxuguem entre US$ 1 bilhão e US$ 1,5 bilhão os gastos com essas estratégias – o que é algo inédito. Essa premissa de redução há anos é contemplada nas cláusulas contratuais, mas nunca foi explorada nesta extensão.

Mudança tão "radical" reflete a preocupação das agências de publicidade e departamentos de marketing quanto aos efeitos colaterais das incertezas sociais e econômicas provocadas pela luta contra a Covid-19. 

As emissoras de tevê, por outro lado, tentam contornar os diversos desafios apresentados por essa crise. Ao mesmo tempo em que lidam com as indecisões quanto à grade de programação, afetada pelo cancelamento de gravações e mudanças estruturais, como a suspensão de shows de auditório, os canais precisam se preparar para a queda de arrecadação. 

Bob Bakish, CEO da ViacomCBS, disse em reunião com investidores, na semana passada, que a previsão "não é nada bonita". O pessimismo do executivo ecoa as estimativas da AMC Networks, que trabalha com a probabilidade de queda de 30% na receita do segundo trimestre de 2020. 

Alguns acreditam ainda que essa crise pode acelerar a migração dos grandes anunciantes para mídias digitais, com Google e Facebook liderando o setor.

"Os clientes gostam de retorno mensurável e as redes sociais e plataformas eletrônicas permitem monitorar com bastante exatidão o desempenho de uma campanha", disse ao NeoFeed, em condição de anonimato, uma diretora de arte que trabalha em uma grande agência de publicidade sediada em Atlanta.

Para ela, as estratégias para mídia eletrônica dão mais retorno por um investimento menor. "Sobretudo porque permitem uma segmentação do público-alvo que a televisão não consegue." 

Apesar das vantagens, a diretora não acredita na "morte" da publicidade televisiva. "Acho que cada veículo tem sua função e seu espaço, então os anúncios de tevê com certeza vão continuar existindo, mas de uma forma diferente". 

Ao WSJ, Chris Brandt, CMO da rede de fast-food de comida mexicana Chipotle, disse que "viu excelentes resultados nas campanhas do Facebook e do Instagram". 

Um porta-voz da General Mills, conglomerado dono de marcas como Cheerios e Nature Valley, confirmou que a empresa está redirecionando parte de seu orçamento de propaganda televisiva para vídeos digitais, sites de e-commerce e outras plataformas que estão ganhando tração durante a pandemia. 

Embora ainda estejamos longe de um desfecho para essa história, tudo indica que o drama das emissoras não tenha um final feliz. A consultoria Kantar Media identificou uma retração de US$ 2 bilhões, ou 30%, em algumas categorias de anúncios de televisão, entre 17 de fevereiro e 26 de abril. 

Alguns canais mantêm viva a expectativa de virar o jogo no segundo semestre, confiantes de que a NFL, a liga profissional de futebol americano, retome suas atividades em setembro, conforme planejado.

OS EUA celebram também em setembro o Dia do Trabalho, um feriado nacional relevante para o país, que é seguido do lançamento dos novos modelos de carros no mercado americano. 

Com tantos acontecimentos, a rede ABC estabeleceu, em 1962, que estrearia sua programação sempre em setembro. Outras emissoras logo adotaram o mesmo calendário. 

As conversas sobre patrocínio e campanhas publicitárias começam em maio, com direito a rodadas de reuniões e pitches presenciais. Este ano, todos os eventos do gênero foram cancelados e os executivos acreditam que isso reflita no volume de contratos assinados.  

Enquanto alguns defendem a mudança nesse calendário histórico, outros acreditam que seja mais prudente estabelecer acordos mais flexíveis, que permitam o "reembolso" dos anunciantes em caso de uma segunda onda de contágio pelo novo coronavírus.

De qualquer maneira, a forma de fazer televisão – e de anunciar nela – nunca mais será a mesma depois da crise. 

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