O que falta ao Brasil? O que falta, em boa medida, às empresas? O que falta, de forma recorrente, às relações humanas? Vou apontar algo que me parece essencial. A resposta é: esprit de corps.

Em um Brasil dividido, não há espaço para que o esprit de corps se desenvolva, para que exista. O mesmo ocorre nas empresas cheias de silos. Naquelas que se debatem em um processo sucessório, por exemplo, as forças naturais se opõem, ainda que não se perceba à primeira vista.

O mesmo acontece quando um processo de mudança de cultura não é bem administrado, ou seja, quando não se tem método e ritmo para viver a transformação. Se a empresa é fruto de aquisições sucessivas ou de fusão, pior ainda. O esprit de corps não tem lugar e o que prevalece é um clima do tipo Fla x Flu, na maioria das vezes disfarçado para o topo. E o fato de deixar de ser Fla x Flu não significa que o espirit de corps está presente....

O esprit de corps é um dos potentes motores das equipes de alta performance, com base na consciência de que cada membro faz parte de uma mesma coletividade (o país, a empresa ou a família), da qual depende e para a qual contribui. Na média, porém, temos nota baixa nesse quesito.

Reflita sobre isso. De 0 a 10, qual seria a sua nota como cidadão, como membro de uma organização, de uma família ou de um grupo social específico?

A expressão francesa é geralmente traduzida como “espírito de equipe”, desprezando-se o significado de “corpo” como conjunto de partes, cada uma com características e funções próprias, que trabalham de modo integrado e em sincronia. Assim é o corpo humano.

A expressão francesa é geralmente traduzida como “espírito de equipe”, desprezando-se o significado de “corpo” como conjunto de partes, cada uma com características e funções próprias, que trabalham de modo integrado e em sincronia

Um simples corte no dedo mobiliza funções nervosas, que comunicam a dor, e o sistema imunológico, que trata de enviar anticorpos para proteger o organismo de uma eventual infecção, com reflexos no batimento cardíaco, na respiração, na concentração. Enfim, todo o corpo se mobiliza quando um de seus membros é ameaçado. E não confunda com corporativismo que é uma terrível doença.

A relação de interdependência dos componentes de uma Equipe para seu correto funcionamento exige a noção de unidade, que lhe confere coesão. Essa deveria ser a relação entre os cidadãos. O reconhecimento disso é o pressuposto da atitude de cooperação.

Cooperar significa, etimologicamente, trabalhar junto com o outro. Importante lembrar, como abordado no nosso novo livro Você e seu barco, que um coletivo funciona em estágios: o de Grupo, no qual o resultado geral é menor do que a soma dos resultados individuais; o de Time, que tem resultado coletivo muito próximo à soma dos individuais; e o de Equipe, quando o resultado coletivo é maior do que os individuais somados. A cooperação, já presente no Time, assume na Equipe a dimensão de cooperação solidária.

Você se autoavalia? Não vale só apontar o dedo para as imperfeições alheias. Analise agora sua atuação como membro de um coletivo na cooperação solidária, em sua empresa e como cidadão. Isso implica fazer parte de algo maior, apoiar, consolidar, dar solidez, requisitos que faltam às organizações – e ao Brasil!

As empresas estão embaladas em uma onda de individualismo: as necessidades e os prazeres do indivíduo nunca estiveram tão em alta. Não há solidariedade sem cooperação, mas cooperar sem a noção do todo do qual fazemos parte é apenas trabalhar junto.

As empresas estão embaladas em uma onda de individualismo. Não há solidariedade sem cooperação, mas cooperar sem a noção do todo do qual fazemos parte é apenas trabalhar junto

Quem é solidário colabora com o outro para consolidar algo maior do qual se sente parte, o que permite uma visão do negócio mais abrangente e completa. Você coopera de verdade? É solidário e estimula a solidariedade? Antes de responder, converse consigo mesmo e se pergunte: sou solidário para valer ou faço cena? Estou solidário neste momento de Brasil ou na verdade apenas contribuo para a falta de união, a polarização?

Há uma íntima relação entre esprit de corps e propósito. Cada pessoa sabe, ou deveria saber, o que a motiva em seu trabalho cotidiano, reconhece sua “causa” e tem orgulho do que faz. Isso estimula a integração de propósitos: o individual, o da Equipe e o da empresa. A ação é objetiva, mas tem alma. A atuação coletiva supera a individual e esta última corrobora o espírito de equipe, na qual limitações de alguns da equipe são compensadas por qualidades de outros.

Mais do que isso, a sombra de uns é neutralizada pela atuação de outros e pode, inclusive, ser iluminada pelo brilho desse lado sol. Isso confere unidade à Equipe, à empresa ou ao país. É o que mais precisamos neste momento.

Betania Tanure é sócia-fundadora da BTA (Betania Tanure Associados), atua em empresas nacionais e internacionais com gestão empresarial, cultura, liderança, governança e resultados. É professora e autora de diversas obras publicadas no Brasil e no exterior, entre eles o recém-lançado  'Você e seu barco' (Ed. Qualitymark).