Nas últimas semanas, dois nomes estão dominando e dividindo boa parte das atenções da mídia global especializada no mundo dos negócios. E, em muitas oportunidades, eles têm, inclusive, extrapolado essa fronteira.

Acostumado a atrair os holofotes, o primeiro é Elon Musk, que vem ganhando ainda mais as manchetes após concluir, em outubro, a compra do Twitter, em um acordo de US$ 44 bilhões. O segundo é Sam Bankman-Fried, fundador da FTX, plataforma de criptomoedas que pediu falência em novembro.

Nesta semana, um dos espaços reservados à dupla foi a coluna de Paul Krugman no jornal The New York Times. E, no texto, o vencedor do Prêmio Nobel de Economia em 2008 usa os dois personagens como os fios condutores de uma visão nada positiva sobre o cenário atual. A começar por Musk.

“Os privilegiados normalmente estão cercados por pessoas que nunca ousariam dizer a eles que estão se comportando mal”, escreve Krugman. “É por isso que não estou chocado com o espetáculo de autoimolação da reputação de Elon Musk.”

Aqui, o economista faz uma referência às primeiras semanas do Twitter sob a nova liderança. Em menos de dois meses, o início da gestão de Musk tem sido marcado por uma série de decisões polêmicas, intempestivas e controversas.

“Quando um homem imensamente rico, acostumado não apenas a conseguir o que quer, mas também a ser um ícone muito admirado, se vê não apenas perdendo sua aura, mas se tornando alvo de ridicularizações generalizadas, é claro que ele ataca erraticamente e, assim, torna seus problemas ainda piores”, afirma.

Essa não é a primeira vez que Krugman tece críticas ao bilionário dono da Tesla e da SpaceX. No ano passado, em outra coluna, ele já havia chamado Musk de “bilionário inseguro”. Agora, ele acrescenta uma nova reflexão a esses comentários.

“A questão mais interessante é por que agora somos governados por essas pessoas. Pois estamos claramente vivendo na era do oligarca petulante”, observa.

Krugman diz que parte da resposta a essa pergunta está na concentração extrema da riqueza, algo que Musk, dono de uma fortuna de US$ 155 bilhões, ilustra bem. Ele cita as estimativas de que os “0,00001% mais ricos” têm hoje uma fatia da riqueza total quase dez vezes maior do que há quatro décadas. “

“E a imensa riqueza da superelite moderna certamente trouxe muito poder, inclusive o poder de agir infantilmente. Além disso, muitos dos super-ricos, que costumavam ser reservados, tornaram-se celebridades”, escreve.

Nesse trecho, Krugman ressalta que o arquétipo do empreendedor inovador que enriquece à medida que muda o mundo não é novo. Entretanto, o economista aponta uma mudança na construção dessa imagem.

“As grandes fortunas feitas em tecnologia da informação transformaram essa narrativa em um culto completo, com tipos aspirantes ou semelhantes a Steve Jobs em todos os lugares que você olha”, pontua.

Krugman recorre à trajetória de Sam Bankman-Fried para reforçar essa visão. Para ele, o culto ao “empresário genial” cumpriu um grande papel no que classifica como o “desastre contínuo” que é o mercado das criptomoedas.

Bankman-Fried está enfrentando acusações de fraude e de lavagem de dinheiro após a derrocada da FTX. Como consequência desse colapso e em um efeito de bola de neve, outras companhias do setor também têm sido afetadas nesse contexto.

“Sam Bankman-Fried, da FTX, não estava vendendo um produto real nem, pelo que se sabe, seus ex-concorrentes, que ainda não faliram: Depois de todo esse tempo, ninguém apareceu com usos para criptomoedas além da lavagem de dinheiro”, afirma.

Ele prossegue: O que Bankman-Fried estava vendendo, em vez disso, era uma imagem, a do visionário de cabelos despenteados e roupas desalinhadas que agarra o futuro de uma forma que os ‘normaizinhos’ não conseguem”.

Krugman estabelece uma diferença entre os dois personagens, ao dizer que as empresas de Musk fabricam, de fato, produtos que entregam aquilo a que se propõem. Mas frisa que as vendas e, em especial, os valores de mercado das suas empresas dependem, certamente, da força da marca pessoal do empresário.

Ele conclui afirmando que Musk e Bankman-Fried podem acabar prestando um serviço público ao mancharem a lenda do empresário genial.

“Por enquanto, no entanto, as travessuras de Musk no Twitter estão degradando o que se tornou um recurso útil, um lugar onde alguns de nós buscamos informações de pessoas que realmente sabiam do que estavam falando. E um final feliz para essa história parece cada vez mais improvável.”

Krugman não está sozinho nessa visão pouco elogiosa, especialmente no que se refere a Elon Musk. Há cerca de um mês, Scott Galloway, escritor, professor da Universidade de Nova York e uma espécie de guru do Vale do Silício, já tinha feito comentários semelhantes em entrevista ao canal CNN.

Entre outras questões, Galloway disse que Musk mostrava um “complexo de Deus” e era um “péssimo modelo para jovens empreendedores”. E afirmou que o culto ao bilionário distorcia qualquer análise sobre suas decisões.

“Nosso novo Jesus Cristo era Steve Jobs e, agora, Elon Musk está assumindo esse manto. E cada movimento irracional, ridiculamente mesquinho e sem sentido que ele faz é, de alguma forma, visto como um movimento de xadrez”, observou.