Dois anos após a quebra do Silicon Valley Bank, os bancos regionais nos Estados Unidos voltam a ocupar o centro das atenções do mercado financeiro. Desta vez, por causa de potenciais fraudes na concessão de empréstimos que levantaram dúvidas sobre a qualidade do crédito e os controles de risco dessas instituições.
O primeiro alerta veio do Zions Bancorporation, banco regional sediado em Utah, que anunciou uma provisão de US$ 50 milhões relacionada a empréstimos comerciais marcados por indícios de fraude por parte dos tomadores. Outro banco do mesmo porte, o Western Alliance, também revelou exposição a casos suspeitos de fraude ou disputas legais envolvendo um de seus clientes corporativos.
No pregão de quinta-feira, 16 de outubro, as ações do Zions recuaram pouco mais de 13%, enquanto as do Western Alliance caíram quase 11%. O movimento derrubou o índice KBW de bancos regionais em 6,3%, contaminando também os principais índices acionários, como o S&P 500, e pressionando o dólar no mercado internacional.
“O contágio para outras classes de ativos mostra que o mercado ainda está sensível às preocupações com bancos regionais dos Estados Unidos, um legado do colapso do SVB”, diz Chris Turner, head global do banco ING, em relatório. Apesar das semelhanças, há diferenças.
Na época da quebra do SVB, as preocupações estavam concentradas na exposição dos bancos regionais a títulos de longo prazo, que perderam valor com a rápida elevação dos juros pelo Federal Reserve. “O institucional que investia em bancos de primeira linha ou menos começou a olhar mais para a questão da liquidez”, diz Pedro Carvalho, Head Non-Bank FIs em Brazil da Fitch Ratings.
Agora, com a economia americana em desaceleração, Ian Lopes, economista da Valor Investimentos, afirma que a maior preocupação é o risco de inadimplência. “Há uma maior preocupação com isso. Os bancos, o sistema de crédito, são interligados e pode haver um efeito dominó. É algo que temos que acompanhar”, afirma.
A expectativa do ING é de que esse novo episódio possa ter efeito maior sobre os mercados de crédito dos Estados Unidos, que já vinham operando com spreads amassados nos últimos meses. “Os riscos parecem mais isolados desta vez. Mas podem alimentar a narrativa de que o ambiente de negócios e a qualidade do crédito nos Estados Unidos estão em situação pior do que os dados indicam.”
Leonardo Otero, sócio-fundador e gestor da Arbor Capital, aponta que, além da sombra do SVB ainda se fazer presente, esses bancos regionais têm maior exposição ao mercado imobiliário, que considera um ponto de vulnerabilidade na economia atual.
“Parecem ser problemas isolados, mas alimentam o medo de que possa haver uma deterioração de crédito mais ampla em todo o sistema financeiro”, diz.
Um sinal adicional de estresse veio do mercado de financiamento de curtíssimo prazo, onde a taxa SOFR — referência para as operações overnight garantidas por títulos do Tesouro — subiu para 4,29%, ultrapassando o limite superior da faixa de juros definida pelo Federal Reserve, de 4,25%.
Raro, o movimento sugere que o sistema de financiamento começa a mostrar sinais de congestionamento, à medida que bancos e fundos competem por recursos de curto prazo para cobrir suas posições diárias.
Nesta sexta, 17 de outubro, o mercado financeiro global passa por uma leve recuperação, mas o ambiente ainda é de cautela. O VIX, índice de volatilidade que reflete o nível de preocupação dos investidores, caminha para encerrar a semana em alta de cerca de 8%. Já o dólar registra queda semanal em relação às principais moedas globais, pressionado pelo aumento do apetite por risco fora dos Estados Unidos.
“No momento, o risco de insolvência generalizada é considerado baixo, pois os problemas parecem contidos. Mas a situação é instável”, afirma Otero.
Para o gestor, a estabilidade futura do setor dependerá da confiança dos investidores e depositantes, além do desempenho dos empréstimos imobiliários. Se sugerirem novos problemas de crédito, complementa, o cenário tende a piorar.