A (re)energisa, braço de energia renovável da Energisa, passou por uma reestruturação dos negócios na primeira semana de outubro. A holding que atua no segmento de geração, transmissão, distribuição e comercialização de energia decidiu “baixar a voltagem” do segmento em virtude dos fracos resultados.

O NeoFeed apurou que a (re)energisa, que detém 95 usinas solares em operação em Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Rio de Janeiro, decidiu cortar 20% do seu quadro de funcionários ao conquistar apenas um terço do total de clientes que projetava para o mercado livre de energia.

A empresa tinha traçado um plano para ser uma das líderes nesse mercado livre de energia. No início deste ano, os clientes de média e alta tensão foram autorizados pela Aneel a escolher o seu fornecedor de energia e negociar diretamente com as comercializadoras (que também podem ser geradoras e desenvolvedoras). Esses são contratos grandes e de longo prazo.

A (re)energisa, por exemplo, conquistou um grande cliente do setor automotivo. Um contrato com prazo de seis anos e receita aproximada de R$ 22 milhões. O problema é que esse é um dos poucos casos da carteira da empresa.

Mas, assim como a (re)energisa colocou sua equipe de vendas para trabalhar, a concorrência também saiu em busca desses consumidores. E a estimativa é que cerca de 80% das empresas desse segmento de média e alta tensão já tenham escolhido suas fornecedoras de longa duração.

Para as empresas de energia, a competição exigiu quase que uma troca: investir na conquista do cliente e rentabilizar no futuro ou com a oferta de serviços de valor agregado (SVA). Nem sempre a empresa consegue resultado imediato. Até o primeiro semestre, a (re)energisa tinha perdido 11,4% de receita líquida em SVA na comparação com o mesmo período de 2023.

A (re)energisa tinha como meta alcançar 1,2 mil contratos no mercado livre de energia. Mas, até o terceiro trimestre, foram assinados cerca de 400 acordos.

Além disso, o que mais tem preocupado é a tendência de crescimento do churn no segmento de energia renovável. A taxa da (re)energisa está em torno de 6% de clientes que têm optado por romper ou cancelar contratos.

O desempenho aquém do esperado trouxe consequências. Toda energia contratada pela companhia à espera desses clientes está à disposição do mercado. E sem ter a quem fornecer, vira custo para a operação.

Segundo relatos ouvidos pelo NeoFeed, a empresa vem acumulando um déficit de R$ 30 milhões nessa unidade de negócios ligada às fontes renováveis de energia. A perda é pequena - até irrelevante - para um grupo que registrou receita operacional bruta de R$ 10,7 bilhões no segundo trimestre deste ano.

Esse desempenho mexeu com a estratégia pensada pela Energisa para a (re)energisa. O marketing, por exemplo, perdeu 60% do orçamento de R$ 15 milhões para o ano - sendo que quase a totalidade autorizada foi utilizada para contratar o treinador da seleção brasileira de vôlei Bernardinho como garoto-propaganda.

A Engie, que é uma grande concorrente no mercado livre, está investindo R$ 50 milhões para reforçar sua estratégia de conquistas de novos clientes. O resultado é que a empresa passou de 1,4 mil contratos assinados. No fim do segundo trimestre, a empresa tinha conseguido aumentar 56,3% o número de clientes em relação ao mesmo período do ano anterior.

Pessoas que participaram de reuniões recentes com Ricardo Botelho, CEO da Energisa, contaram ao NeoFeed terem ouvido o seguinte questionamento sobre a participação da empresa no mercado livre de energia: para que investir tempo e dinheiro se “não estamos trazendo clientes e estamos perdendo para a concorrência”?

Como consequência dessa baixa performance, a direção da Energisa decidiu cortar 20% do quadro de funcionários da (re)energisa. Cerca de 120 pessoas foram desligadas de praticamente todas as áreas na primeira semana de outubro - menos a de engenharia que presta “serviço híbrido” para todos os negócios.

Ao NeoFeed, a (re)energisa afirma que “implementou capturas de sinergias operacionais entre suas áreas de negócio, a fim de aumentar a agilidade em processos e tomada de decisões”.

“A (re)energisa reitera que segue comprometida em ser o parceiro ideal dos clientes, oferecendo as melhores soluções em energias renováveis", complementa a nota da companhia de energia renovável.

A ação na bolsa

Há cerca de três meses, o volume financeiro entre as gestoras compradas e vendidas na ação ENGI11, da Energisa, era equivalente.

O NeoFeed conversou com duas gestoras que estavam short no papel. Ambas relataram que a estratégia era pontual e já desmontaram a posição. E que a Energisa tem fundamentos sólidos para competir com os pares do setor de energia.

“A Energisa é excelente na qualidade, mas tem uma estratégia mais conservadora e perde oportunidades. Preferimos a Equatorial, que cria mais valor para o acionista”, disse um desses gestores.

Entre agosto e setembro, o short interest (ações de uma empresa que estão vendidas a descoberto) da Energisa estava em 1%, sendo o indicador mais baixo do setor. A Auren, por exemplo, que recentemente adquiriu a AES Brasil, oscilou entre 14% e 18% e a Engie Brasil entre 16% e 18%.

Questionados sobre a recente mudança na (re)energisa, os gestores ouvidos pelo NeoFeed disseram que é preferível “a empresa focar os esforços nos negócios que ela sabe gerir bem e ser remunerada por eles”. “O ativo de renovável e a capacidade não mudam em nada a história da empresa”, afirma a outra fonte.

Vladimir Pinto, analista da XP, afirma que a Energisa opera bons ativos e que encontrou um caminho de crescimento interessante no segmento de transição energética com o investimento em gás natural.

“Em gás natural, a penetração é baixa e a rede não é capilarizada no Brasil. É um dos elementos da transição natural de um combustível mais competitivo”, diz o analista, que tem recomendação de compra e preço-alvo de R$ 67 (upside de pouco mais de 54%).

Para o BTG Pactual, a ação ENGI11 também é compra, com preço-alvo de R$ 63, o que significa um upside de quase 45% sobre o valor atual de tela. O retorno sobre o patrimônio líquido (ROE) projetado pelo banco para este ano é de 16,1% e em 2025, de 12,2%.

“Embora os custos tenham permanecido sob controle em seu braço de distribuição, as despesas consolidadas com pessoal, material, serviço e outros (PMSO) da Energisa cresceram 13% no ano contra ano, impulsionadas por maiores despesas com pessoal (+11%), materiais (+6%) e terceiros (+18%). A inadimplência também aumentou 63% no ano contra ano”, escreveram Joao Pimentel, Gisele Gushiken e Maria Resende, analistas do BTG, em relatório.

No balanço divulgado no fim do segundo trimestre, a dívida líquida da Energisa estava em R$ 23,44 bilhões. A alavancagem da companhia era de 2,7 vezes (x) a relação dívida líquida sobre o Ebitda. Os covenants para contratos de empréstimo e financiamento é de 4x para aqueles assinados até 2019 e de 4,25x desde então.

Com valor de mercado de R$ 22,2 bilhões, a ação da Energisa está em queda de 16,7% no ano, até quarta-feira, 9 de outubro.