Enquanto o projeto de lei complementar do novo arcabouço fiscal segue o ritual no Senado após aprovação na Câmara, em 24 de maio, a carta aos cotistas da Kinea recorre a Santo Agostinho, um dos mais importantes filósofos dos primeiros anos de cristianismo, para explicar o enrosco fiscal brasileiro.

No material que começa a ser distribuído na quinta-feira, 1º de junho, recebido com exclusividade pelo NeoFeed, a gestora que detêm R$ 78,3 bilhões sob gestão afirma que o governo terá uma forte expansão de gastos em 2023, permitida pela PEC da Transição, e que a proposta de arcabouço fiscal liberou novo aumento em 2024. Com isso, a Kinea acredita que o governo deve buscar os 2,5% acima da inflação passada.

“O que Agostinho de Hipona e a situação fiscal brasileira têm em comum? O novo arcabouço fiscal proposto pelo governo parece sofrer das mesmas angústias que o jovem Agostinho: buscamos controlar nossos gastos, “mas não ainda”, escreveu a equipe de gestão.

A referência lembrando uma das recordações do jovem Agostinho: “Senhor, conceda-me castidade e continência, mas não ainda”.

De acordo com Ruy Alves, gestor de macro global, a Kinea acredita que o arcabouço fiscal brasileiro deve ser aprovado sem grandes alterações em cerca de duas semanas.

Outra preocupação que está na carta mensal da Kinea é uma possível recessão nos Estados Unidos.

Na análise da equipe de gestão, esse processo de desaceleração é distinto ao que ocorreu nas últimas três recessões. Em 2001 e 2008, as crises financeiras foram ocasionadas por estouros das bolhas de tecnologia e imobiliária. Em 2020, a pandemia foi um processo agudo mais intenso.

Desta vez, é o dramaturgo inglês Samuel Beckett e sua peça de teatro “À espera de Godot” que ilustra a explicação da Kinea:

“Estamos fazendo a analogia de Godot com a esperada, mas elusiva, recessão nos Estados Unidos. Quais as razões da resiliência da economia norte-americana?”, questiona o texto antes de responder.

“No momento, a economia está gradualmente sentindo os efeitos da política monetária, e ao invés de um processo mais agudo causado por crises financeiras ou pandemias, estamos vivendo um processo mais crônico, ou gradual.”

Lembrando que a peça retrata duas pessoas que esperam por um sujeito que “talvez” se chame Godot. Sua chegada parece iminente, mas é constantemente adiada. Ou seja, é um evento que se espera muito, mas que nunca chega.

Nesse sentindo, o Congresso americano deve encerrar as negociações sobre o teto de endividamento da dívida americana neste fim de semana. É esperado um acordo entre os congressistas e o governo Biden.

“Consideramos que o episódio do debt ceiling norte-americano está superado e deve ser aprovado no Congresso, com o mercado passando a focar na realidade dos dados econômicos”, afirma Alves.

Nesse sentido, Godot não chegou no calote da dívida. Será que a recessão ainda o espera?