Com incentivos da ordem de US$ 53 bilhões, no âmbito da Lei dos Chips, aprovada há dois anos, os esforços para fortalecer a indústria local de semicondutores têm sido uma das bandeiras do mandato de Joe Biden, presidente dos Estados Unidos e candidato à reeleição ao posto neste ano.

Como parte dessa agenda, o mandatário está prestes a ganhar um reforço bilionário e de fora dos limites do país para traduzir essa política em resultados. É o que mostra uma reportagem publicada na sexta-feira, 5 de abril, pelo The Wall Street Journal.

Segundo o jornal americano, que cita fontes próximas à empresa, a Samsung planeja mais do que dobrar seu volume de investimentos para produzir chips no estado do Texas. De um aporte inicial de US$ 17 bilhões, a gigante sul-coreana deve elevar a cifra a ser desembolsada para US$ 44 bilhões.

O montante será aplicado na cidade de Taylor, nos arredores de Austin, onde a companhia está erguendo uma fábrica de semicondutores e já tem outras operações próximas. Os recursos seriam destinados a uma segunda unidade voltada à produção de chips, além de pesquisa e desenvolvimento.

Dentro desse projeto, a expectativa é de que a Samsung, que está em negociações com o Departamento de Comércio dos Estados Unidos, receba um dos maiores volumes de subsídios concedidos pela Lei dos Chips.

O valor do investimento não é a única razão por trás desse cenário. A Samsung é uma das três empresas no mundo capaz de produzir chips avançados e essenciais para segmentos como defesa e inteligência artificial.

As outras duas companhias que completam o trio e fortalecem a política encampada por Biden são a Taiwan Semiconductor Manufacturing (TSMC) e a americana Intel, que também já têm investimentos anunciados no país.

Recentemente, quem ampliou essa conta foi a Intel. Em março deste ano, a companhia anunciou um plano de investimentos de US$ 100 bilhões para construir e expandir fábricas de semicondutores nos estados do Arizona, Oregon, Ohio e Novo México.

Para levar à frente esses projetos, previstos para serem concluídos em cinco anos, a empresa assegurou US$ 19,5 bilhões em subsídios e empréstimos federais. E tem a expectativa de garantir um volume adicional de US$ 25 bilhões em incentivos fiscais.

Antes disso, em 2022, a taiwanesa anunciou a construção de uma segunda fábrica de semicondutores no estado do Arizona, ampliando seus investimentos em solo americano de US$ 12 bilhões para US$ 40 bilhões.

Ao ocupar o território americano com tais projetos, esse volume bilionário de investimentos e incentivos têm como pano de fundo mais um capítulo dos embates travados entre os Estados Unidos e a China.

Ao mesmo tempo em que avança e busca recuperar terreno na fabricação de chips – a participação do país na produção global caiu de 37%, em 1990, para 12%, em 2020, o governo de Joe Biden tenta minar os esforços da China nesse front.

Atualmente, Taiwan é responsável por 90% da produção global de semicondutores avançados, incluindo nessa conta chips em áreas de segurança e defesa, consideradas vitais tanto para os Estados Unidos como para a China.

Em meio a essas batalhas, a descoberta de que a China gasta mais dinheiro importando chips do que petróleo foi o mote para que o americano Chris Miller, professor de história internacional da Tufts University, de Massachusetts, escrevesse o livro Chip War.

Eleito o livro de negócios de 2022 pelo jornal britânico Financial Times, a obra trata justamente da relevância crescente dos chips no mapa global e da disputa pela hegemonia nessa arena, duas questões que foram temas também de uma entrevista concedida pelo autor ao NeoFeed, em 2023.

“Decidi escrever Chip War quando percebi a dependência gigantesca que o mundo globalizado tem dos semicondutores. Todas as nações avançadas necessitam desses chips para diferentes propósitos, que passam pelo desenvolvimento tecnológico e pelo uso militar”, disse Miller, na época.

Ele também ressaltou algumas das principais implicações para a economia e a política mundial a partir desse contexto. Entre eles, as possíveis consequências caso a China seja bem-sucedida em sua tentativa de importar menos chips e produzir mais semicondutores.

"Isso redesenharia o mapa econômico, impactando países da Ásia que hoje dependem criticamente das vendas de chips para a China", afirmou. "Além do mais, se a China atingir capacidades de ponta, ela as implantará em sistemas militares, corroendo a vantagem militar dos EUA e intensificando o risco para Taiwan. E a probabilidade de uma grande guerra na Ásia."

À parte dessas projeções, há quem, mesmo distante dessa guerra pelo domínio nos chips, veja oportunidades nesse cenário. Esse é o caso de Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul, que falou sobre o tema ao NeoFeed, em março deste ano.

“Estamos observando a necessidade de grandes empresas ocidentais deixarem de depender da produção de semicondutores a partir da Ásia. Dentro dessa geopolítica, entendemos que um olhar para a fabricação de chips para a América Latina já começa a acontecer. E queremos que o Rio Grande do Sul seja foco disso”, afirmou Leite.