Na manhã de terça-feira, 14 de novembro, a Natura&Co deu mais um passo em seu processo de reestruturação e simplificação das suas operações ao anunciar a venda da The Body Shop à gestora alemã Aurelius Investment, em uma transação avaliada em 207 milhões de libras, ou R$ 1,25 bilhão.

Com expectativa de conclusão até 31 de dezembro, o acordo também inclui um potencial earn out de 90 milhões de libras (R$ 543 milhões), o que elevaria o montante total para cerca de R$ 1,8 bilhão, ainda aquém das projeções mais recentes de analistas, na faixa de R$ 2 bilhões.

A venda também ficou abaixo do valor desembolsado pela Natura, de 1 bilhão de libras, na compra do ativo, em 2017. Mas, à parte as diferenças entre todas essas cifras, o grupo brasileiro preferiu dar ênfase a um outro saldo resultante da negociação.

“Nós entendemos que não temos a expertise do varejo propriamente dito”, disse Fabio Barbosa, CEO da Natura&Co, em conversa com jornalistas. “Então, nosso foco agora é o back to basics. Vamos fazer aquilo que fazemos bem-feito: as vendas diretas e saindo disso para o omnichannel.”

Antes de dar um direcionamento sobre essa volta ao básico, o executivo observou que a Natura ainda não tem definido qual será o destino dos recursos obtidos com a transação. E aproveitou para ressaltar uma outra “lição”.

“Eu aprendi que os maiores erros acontecem quando você tem excesso de capital”, ressaltou Barbosa. “Por isso, sou o maior defensor de que precisamos manter a disciplina financeira.”

O grupo tem, no entanto, bem definida as vendas diretas como a prioridade na América Latina. Na região, outro ponto ressaltado foram os avanços na estratégia multicanal, sob o desafio já antigo de integrar nesse processo o batalhão de 4 milhões de consultoras que fizeram a fama do grupo.

“Hoje, das nossas quase mil lojas Natura, cerca de 700 já são operadas por consultoras que viraram franqueadas”, disse João Paulo Ferreira, CEO da Natura&Co na América Latina. “Em outro ponto, cerca de 5% da nossa receita na região está no online e metade desse volume vem dessas consultoras.”

Ferreira ressaltou ainda que, em função da onda de integração entre as operações da Natura e da Avon no Brasil, iniciada em setembro, a empresa vem lidando com problemas na disponibilidade de produtos e atrasos na entrega. Ele observou, porém, que essas questões serão normalizadas até o fim do ano.

Já no caso da Avon International, operação que engloba 43 países e todas os mercados fora da América Latina, o plano da Natura é reforçar os investimentos na marca e em maximizar a capilaridade da operação, seja via presença direta ou por meio de acordos de distribuição.

“Agora, com menos iniciativas e mais capitalizados, vamos ter mais tempo para fazer os investimentos necessários”, afirmou Barbosa. “A ideia é focar nas vendas diretas em países de renda média e, na Avon International, em mercados como Turquia, África do Sul, Filipinas e leste europeu.”

Ao falar sobre esse mapa, Barbosa fez questão de frisar que o grupo não vai direcionar todos os seus esforços para o mercado latino-americano, dado que, com exceção da Avon, a empresa vem se desfazendo dos ativos que compunham a estratégia de construir uma plataforma global de marcas de cosméticos.

Fabio Barbosa, CEO da Natura&Co
Fabio Barbosa, CEO da Natura&Co

Com o tempo, essa tese não gerou os resultados esperados. E, na contramão da ambição inicial, um movimento anterior ao desinvestimento na The Body Shop veio em abril deste ano, com a venda da Aesop para a L’Oréal, em um acordo de US$ 2,5 bilhões.

“A Aesop deu certo até demais, tanto que vendemos a operação por um múltiplo substancial em relação ao valor inicial”, afirmou o CEO. “Ela não foi vendida por ser um problema, mas justamente por ser uma solução para o reenquadramento do balanço da empresa.”

Do prejuízo ao lucro

A venda da Aesop foi justamente um dos fatores que impulsionaram o lucro líquido de R$ 7,02 bilhões da Natura&Co no terceiro trimestre. Com a última linha do balanço turbinada, o grupo reverteu o prejuízo de R$ 559,8 milhões, divulgado um ano antes.

Entre julho e setembro, a receita líquida caiu 10,5%, para R$ 7,5 bilhões. Na divisão por unidade, a Natura&Co Latam recuou 9,4%, para R$ 5,2 bilhões, enquanto a Avon International e a The Body Shop tiveram quedas, respectivamente, de 11,6% e 15%, para R$ 1,4 bilhão e R$ 829,4 milhões.

Já o Ebitda ajustado do trimestre ficou em R$ 751,4 milhões, o que representou um salto de 10% em base anual. A margem Ebtida ajustada evoluiu de 8,1% para 10% nesse intervalo.

O grupo ressaltou ainda que encerrou o período com um caixa líquido (excluindo leasing) de R$ 700 milhões, comparado a uma dívida líquida de R$ 10 bilhões no segundo trimestre desse ano.

Em relatório, o BTG Pactual ressaltou o fato de a reestruturação da Natura ainda estar em curso, agora, porém, sob uma estrutura de capital muito melhor. Além de destacar que, apesar das vendas seguirem fracas e impactadas por esse processo, a empresa já mostra boa melhora nas margens. Mas observou:

“Embora olhemos com satisfação os esforços para simplificar a sua estrutura e melhorar as margens, o ritmo de recuperação permanece incerto, o que nos leva a manter nossa classificação neutra”, escreveu o time liderado por Luiz Guanais, com preço-alvo para a ação de R$ 18.

Na mesma linha, mas com preço-alvo de R$ 21 para o papel, o Itaú BBA destacou que o resultado trouxe sinais encorajadores do turnaround da empresa. Esses avanços também ajudaram a impulsionar o desempenho das ações da companhia, que chegaram a subir mais de 5% na manhã de hoje.

Por volta das 13h30, os papéis estavam sendo negociados um pouco abaixo desse patamar, com alta de 4,10%, cotados a R$ 14,47. No, as ações acumulam uma valorização de 24,6%. A Natura&Co está avaliada em R$ 19,9 bilhões.