Em março de 2021, quando a Hapvida e o Grupo Notre Dame Intermédica (GNDI) anunciaram um acordo para combinar suas operações, a transação foi definida por boa parte do mercado como um “casamento perfeito”, ao criar, na época, uma empresa de saúde verticalizada, bastante complementar em termos de geografias e avaliada em mais de R$ 110 bilhões

A união foi selada oficialmente no início deste ano, com a aprovação da fusão pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e foi simbolizada pela escolha de um modelo no qual a operação seria comandada pelos CEOs das duas empresas. Jorge Pinheiro, da Hapvida, e Irlau Machado Filho, pelo GNDI.

Essa relação ganhou, porém, um novo componente nesta terça-feira, 22 de novembro. Ou melhor, perdeu. Em fato relevante, a Hapvida anunciou a renúncia de Machado aos postos de Co-CEO e de membro do board da companhia, atribuindo a decisão a “propósitos e objetivos pessoais” do executivo.

No documento, além de agradecer a Machado, a empresa destacou que suas funções passarão a ser exercidas por Pinheiro, que será o único CEO da operação. E acrescentou que seu assento no Conselho de Administração permanecerá vago até que seja feita uma nova indicação para recompor o board.

Em quatro parágrafos, o fato relevante foi direto ao ponto. E, com poucas palavras, gerou no mercado uma mescla de surpresa e estranhamento, como ressaltam relatórios divulgados na sequência do anúncio feito pelo grupo.

“Sempre suspeitamos que a estrutura de dois CEOs tinha uma data de validade, mas o timing e a forma com que o anúncio foi feito levantam algumas questões”, escreveram os analistas Samuel Alves, Yan Cesquim e Pedro Lima, do BTG Pactual.

O trio destacou que a alegação de “motivos pessoais” para que Machado deixasse os dois postos, soa um tanto abrupta quando se refere, especificamente, ao assento ocupado por ele no Conselho de Administração. O banco também questiona essa decisão em relação à sequência do grupo no dia a dia.

“Ele é um executivo de primeira linha e a comunidade de investidores esperava que ele fosse uma força motriz no processo de integração”, destacaram os analistas do BTG. “Essa mudança de gestão provavelmente forçará a empresa a fornecer mais visibilidade sobre as tendências de curto prazo e seu plano de integração.”

Nesse contexto, o processo de combinação das duas companhias também foi um dos pontos de atenção ressaltados em relatório divulgado pelo Goldman Sachs, assinado pelos analistas Gustavo Miele e Emerson Vieira.

“Acreditamos que uma mudança para um único CEO pode simplificar a estrutura de gestão, pois elimina o risco de possíveis divergências”, observou a dupla. “No entanto, notamos que o momento da decisão nos surpreendeu um pouco, pois a integração com o GNDI ainda não amadureceu.”

Os analistas do Itaú BBA seguiram na mesma linha, ao frisarem que, apesar de já esperar a simplificação da estrutura de comando, na esteira da integração das duas operações, as informações fornecidas pelo anúncio não atenderam plenamente às expectativas.

“Os termos de saída foram um pouco diferentes daqueles que prevíamos. Machado é um executivo conceituado e preferíamos vê-lo ainda desempenhando um papel na empresa como membro do conselho”, escreveram Vinicius Figueiredo, Lucca Genreali Marquezini e Felipe Amancio.

Os analistas do Itaú BBA observaram ainda que esperam entender melhor o possível risco de Machado assumir o comando de uma empresa concorrente, pois o fato relevante não menciona qualquer cláusula de non-compete.

No pregão da B3, a reação inicial ao anúncio também não está sendo positiva. Por volta das 15h25, as ações da Hapvida estavam sendo negociadas com queda de 3,75%. Antes, chegaram a recuar mais de 5%. No ano, os papéis acumulam uma desvalorização próxima de 48%. O grupo está avaliado em R$ 38,2 bilhões.