A Covid-19 trouxe duros efeitos em toda a economia, mais foi ainda mais implacável para segmentos como o turismo. Além da queda brutal da receita na quarentena, o setor convive com a perspectiva de um caminho repleto de percalços no pós-crise.
Fundada em 2005 por Guilherme Paulus, empresário também conhecido pela criação da CVC, a GJP Hotels & Resorts, dona de nove hotéis no País, é um dos grupos que estão lidando com esses dilemas.
Mesmo diante desse desafio, a empresa está reafirmando uma estratégia traçada pouco antes da pandemia: o plano de investir R$ 800 milhões nos próximos dez anos. “Nunca paramos de trabalhar”, afirma Fabio Godinho, CEO da GJP, ao NeoFeed. “Temos uma série de projetos no radar.”
O executivo explica, porém, que boa parte dessas iniciativas, intensivas em capital, é financiada com certificados de recebíveis imobiliários (CRI), o que pode gerar atrasos nesse roteiro.
“Nós tínhamos um mercado de crédito imobiliário extremamente líquido”, diz Godinho. “Agora, está mais restrito, mas acredito que isso seja plenamente restabelecido até o primeiro semestre de 2021.” Para dar sequência ao plano, a GJP já captou parte dos recursos. O montante não foi revelado pelo executivo.
Em dezembro, o grupo inaugura o Linx Canoas, primeiro projeto desse pacote. Localizado a 14 minutos do Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, o hotel terá 162 quartos e integra o complexo Max Plaza, da construtora Melnick Even, que reúne ainda torres residenciais, comerciais, centros de compra, serviços e um hub de saúde.
Previsto para o segundo semestre de 2022, o Air São Paulo é mais uma escala na expansão. Além da estreia na capital paulista, o empreendimento marca o lançamento da Air, quinta bandeira no portfólio da GJP.
O Air São Paulo será instalado no antigo prédio da agência de publicidade DPZ, no bairro do Itaim Bibi, e terá 62 quartos, além de espaços como coworking e rooftop, com um nightclub.
O projeto foi inspirado no conceito de “luxo acessível”, criado por Ian Schrager. O empresário americano é também um dos fundadores da lendária boate Studio 54, em Nova York, e tornou-se um dos ícones da indústria hoteleira, ao assinar projetos como a reabertura do Gramercy Park Hotel, em 2006, e o Public Hotel, ambos localizados na Big Apple.
“O Air será um hotel lifestyle, contemporâneo, que mescla negócios e lazer”, diz Godinho. “De concreto, por enquanto, temos São Paulo, mas é uma marca que pode ser expandida”, afirma o executivo, que aponta o Rio de Janeiro como um possível próximo ponto no mapa de ampliação da bandeira.
Outros investimentos em fase de maturação e de definições de escopo e de prazos integram o plano de dez anos. A lista passa, por exemplo, pela ampliação do hotel Wish, de Gramado, no Rio Grande do Sul.
Maceió e Foz do Iguaçu, onde a GJP tem terrenos de 700 mil metros quadrados, devem ser o destino de uma boa parcela da soma milionária
Nesse roteiro, Maceió e Foz do Iguaçu, onde a GJP tem terrenos de 700 mil metros quadrados, devem ser o destino de uma boa parcela da soma milionária. Na capital alagoana, a área fica na praia de Ipioca. Já na cidade das cataratas, está localizada ao lado do hotel do grupo.
“Estamos pensando em projetos ao redor dos hotéis”, diz Godinho. “O desenho original de Maceió prevê, por exemplo, um resort e condomínios que podem ser vendidos tanto como timeshare ou como multipropriedade.”
O primeiro conceito já é explorado há alguns anos pela GJP, por meio de um programa que dá acesso à rede do grupo no Brasil e aos hotéis da parceira RCI no exterior. Com planos que vão de dois a 15 anos, a iniciativa conta com cerca de dois mil sócios.
Já a segunda modalidade seria um nicho mais novo para a GJP. Bastante difundida nos Estados Unidos e por redes como Hilton e Marriott, a multipropriedade envolve a venda fracionada de unidades e o compartilhamento do uso e dos custos pelos cotistas.
“Esse conceito será o grande viabilizador da hotelaria de lazer do País nos próximos anos”, diz José Ernesto Marino Neto, CEO da consultoria BSH International. “É um modelo inteligente de ter uma propriedade de férias sem os custos de um ativo permanente.”
Check-out da crise
No curto prazo, a GJP procurou estancar os efeitos da pandemia. Com seus hotéis fechados desde abril, a rede recorreu a medidas como a inclusão de 80% de seu quadro de 1,5 mil funcionários na Medida Provisória 936.
Pouco a pouco, no entanto, a empresa começa a reduzir esse índice, a partir da estratégia de reabertura dos hotéis, que terá início em julho. Até setembro, o plano é ter todos os empreendimentos em operação.
Os hotéis de lazer e com um bom histórico de demanda em um raio de 400 quilômetros serão os primeiros, a começar pelo Wish Serrano, no dia 9 de julho. A lista inclui as outras três unidades da bandeira Wish, em Natal (RN), Salvador (BA) e Foz do Iguaçu (PR), além do Prodigy Gramado e do resort Marupiara, na praia de Porto de Galinhas (PE).
Em uma segunda etapa, será a vez dos empreendimentos mais voltados às viagens de negócio e instalados próximos a aeroportos. É o caso dos hotéis econômicos Confins (MG) e Galeão (RJ), da marca Linx, e do Prodigy Santos Dumont, também no Rio de Janeiro.
“A GJP tende a ter uma performance melhor do que a Accor, por exemplo, que é muito dedicada à hotelaria urbana”, diz Marino Neto. “Ao mesmo tempo, o custo operacional de um hotel de lazer é muito superior, o que pode tornar o caminho deles mais complicado.”
Para Godinho, alguns elementos irão favorecer o turismo doméstico e a retomada gradual do grupo. Além das possíveis restrições de viagens ao exterior, ele cita o dólar nas alturas e o cenário mais complicado no setor de cruzeiros, que compete pelo mesmo turista que os hotéis e resorts.
“No quarto trimestre, esperamos chegar entre 75% e 80% da receita que fizemos no mesmo período, em 2019”, diz Godinho. Ele projeta recuperar o patamar de faturamento de 2019, próximo de R$ 270 milhões, em 2021. “Esse ano está praticamente perdido.”
Para começar a reverter esse quadro, a GJP investiu em um extenso programa que irá estabelecer novos protocolos aos funcionários e hóspedes em seus empreendimentos. Fruto de um aporte de R$ 3 milhões, o projeto foi desenhado em parceria com o hospital Sírio-Libanês.
O plano partiu da análise das plantas, fluxos e pontos de interação para definir novas práticas em cada hotel. O pacote inclui desde a higienização dos ambientes até regras de distanciamento social e de limitação no número de pessoas em espaços como piscinas, academias, restaurantes e elevadores.
A GJP projeta recuperar o patamar de faturamento de 2019, próximo de R$ 270 milhões, em 2021
O projeto envolve ainda um aplicativo, pelo qual o hóspede poderá fazer o check-in e o check-out, além de pedir um hambúrguer na piscina ou agendar uma massagem. A rede também negocia o uso da plataforma de telemedicina do Sírio, caso seja necessário o atendimento a turistas e funcionários.
O hospital irá avaliar a execução do programa e fornecer um certificado para cada hotel da rede. E fará auditorias mensais para revalidar esse processo. Para reforçar esse diferencial, a GJP prevê investir cerca de R$ 4 milhões em uma campanha que será veiculada a partir de julho.
À parte do pacote, o grupo não planeja apostar em descontos para atrair reservas. “Vamos manter a racionalidade, mesmo porque, esses protocolos trazem um custo que não tínhamos antes”, diz Godinho. Ele não lamenta, porém, esse gasto adicional. “É inevitável. Toda a indústria vai ter que se reinventar.”
Siga o NeoFeed nas redes sociais. Estamos no Facebook, no LinkedIn, no Twitter e no Instagram. Assista aos nossos vídeos no canal do YouTube e assine a nossa newsletter para receber notícias diariamente.