O presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Josué Gomes da Silva, foi destituído do cargo nesta segunda-feira, 16 de janeiro, numa Assembleia Geral da entidade convocada por sindicatos patronais de oposição, apoiados pelo ex-presidente Paulo Skaf.
Dos 86 delegados que votaram na Assembleia, 62 decidiram pela destituição do presidente da Fiesp, que estava no cargo de janeiro de 2022. Os apoiadores de Gomes da Silva contestaram a validade da votação e prometeram recorrer.
A votação ocorreu horas depois de Gomes da Silva ter obtido o compromisso do vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), Geraldo Alckmin, de que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai acabar com a cobrança do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) na reforma tributária que está sendo elaborada.
O anúncio de Alckmin foi feito ao lado de Gomes da Silva e do ex-presidente Michel Temer (MDB) durante almoço na sede da entidade, antes do início da Assembleia Geral, convocada para as 14h30.
O vice-presidente surpreendeu os representantes dos sindicatos patronais - o fim do IPI era uma antiga reivindicação do setor industrial. A manobra política, porém, não deu resultado.
Filho do empresário José Alencar, que foi vice-presidente da República durante os dois mandatos do governo Lula (2003-2010), Gomes da Silva sempre foi visto por parte dos representantes dos sindicatos da Fiesp como simpático ao PT desde que assumiu o cargo, em janeiro de 2022.
Mesmo sendo eleito na Fiesp com apoio de Skaf – que fez campanha pelo ex-presidente Jair Bolsonaro na eleição presidencial –, Gomes da Silva atraiu a ira de seguidores de Bolsonaro na entidade em agosto do ano passado, ao divulgar um manifesto da Fiesp em favor da democracia. Menos de 15% dos filiados à entidade assinaram o documento.
Depois disso, em meio à polarização da campanha presidencial, o presidente da Fiesp passou a ser cobrado por se ausentar da entidade no dia a dia, dando mais atenção aos seus negócios, e por não atender pedidos de audiência e de cargos feitos por representantes dos sindicatos patronais.
Após a vitória na disputa presidencial, o então presidente eleito Lula chegou a convidar Gomes da Silva para assumir o Ministério da Indústria e Comércio, mas ele declinou.
Ainda no final do ano passado, um grupo de sindicatos patronais tentou marcar a assembleia para o dia 21 de dezembro. Gomes da Silva conseguiu adiar para esta segunda-feira. Os opositores fizeram uma lista de 16 questionamentos para o presidente da Fiesp esclarecer na assembleia.
Por volta de 19h, depois que a maioria dos presentes (62 a 24) considerou que as respostas do presidente da Fiesp aos questionamentos apresentados pela oposição não eram satisfatórias, Gomes da Silva deixou a assembleia.
Foi feita então nova votação, já sem a presença de Gomes da Silva e aliados: 47 votos para retirá-lo do cargo, duas abstenções e um voto a favor de Josué.
O último escrutínio levou aliados do presidente a questionar o quórum da votação e, por tabela, a validade da própria assembleia. Pelo estatuto da Fiesp, o vice-presidente mais velho deve assumir o cargo interinamente até que a cúpula da entidade se reúna.
Empresário de sucesso
Gomes da Silva é herdeiro da Coteminas, dona de marcas como Artex e Santista, que lidera a indústria de itens de cama, mesa e banho das Américas, com fábricas no Brasil, nos Estados Unidos, na Argentina e no México.
Antes de assumir a Fiesp, Gomes da Silva presidiu a Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e Confecção), da qual é atualmente presidente honorário, e o IEDI (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial).
A queda do presidente da Fiesp é atribuída a Skaf, que permaneceu 17 anos no comando da entidade – período no qual atraiu pequenos sindicatos patronais para a entidade, o que sempre lhe garantiu apoio político em diferentes reeleições.
Na sua gestão, Skaf se afastou das principais lideranças industriais do Estado e da discussão sobre políticas industriais, usando a entidade como alavanca para sua carreira política. Skaf foi candidato três vezes ao governo de São Paulo (2010,2014 e 2018), mas perdeu todas.
Liderou a campanha pelo impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT) em 2014, organizando atos na frente da entidade, na Avenida Paulista, que tinha como símbolo um pato amarelo.
Fim do IPI
A derrota de Gomes da Silva ofuscou o anúncio do vice-presidente da República de que o governo federal pretende acabar com o IPI.
Alckmin fez menção à extinção do imposto ao explicar por que o IPI não foi incluído na lista de medidas fiscais apresentadas na semana passada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
“Tinha a possibilidade de ser cancelada a redução de 35% do IPI, e conseguimos que isso não fosse incorporado. A próxima meta é acabar com IPI, e acabar com IPI é pela reforma tributária”, afirmou Alckmin.
Segundo ele, a eliminação do IPI se dará pela unificação de tributos em um único imposto sobre valor agregado, o IVA, previsto nas propostas de reforma tributária já acenadas pelo governo.
De quebra, Alckmin ainda anunciou que pretende criar um programa de financiamento das exportações, com apoio do BNDES, e descartou a possibilidade de o governo revogar a reforma trabalhista ou da reforma da Previdência.
Numa mensagem explícita para a plateia de industriais, Alckmin ainda defendeu o presidente da Fiesp, “um grande industrial brasileiro, uma grande liderança”.
Para o economista Celso Grisi, professor da FIA Business School e da FEA/USP, a crise interna na Fiesp estava desgastando a entidade junto a boa parte do setor industrial.
Ele observa que, embora a instituição seja conhecida pelo conservadorismo, tirar o presidente – como conseguiu o movimento liderado por Skaf – é totalmente condenável. “Pegou mal, mostra que existe uma panela na entidade”, diz.
Grisi, porém, comemorou a proposta anunciada por Alckmin, de acabar com o IPI no bojo da reforma tributária. Segundo ele, a proposta de reforma tributária sinalizada pelo governo deve eliminar cinco impostos, mas tem um longo caminho antes de ser aprovada pelo Congresso Nacional, o que deve ocorrer no segundo semestre, passando por negociações com governadores.
O professor da Fia Business School e da FEA/USP, no entanto, acha prematuro estimar o impacto no setor industrial e na economia como um todo. “Existe um conjunto de variáveis enormes que deve ser considerado, mas certamente vai melhorar a competitividade da indústria de exportação, com redução de preços do mercado interno e outros benefícios”, diz Grisi.