Em uma reviravolta dos acontecimentos, o empresário Michael Klein, da família de acionistas do Grupo Casas Bahia, voltou atrás do pedido de convocação de assembleia geral extraordinária (AGE) para trocar membros do conselho de administração, com a intenção de reassumir a presidência da companhia.

Numa carta enviada ao board na segunda-feira, 7 de abril, revelada ao mercado em fato relevante, Klein afirma que o cancelamento do pedido de substituição ocorreu após interações com stakeholders nos últimos dias, sem entrar em detalhes.

Segundo ele, a decisão “confere um voto de confiança, por mais um período, aos esforços que vêm sendo envidados pela administração, em especial pela diretoria, com vistas ao saneamento da situação financeira da companhia”. No entanto, destaca que continuará “cobrando a retomada da rota de crescimento da companhia, tendo como foco a reconquista da confiança de clientes e investidores, em um mercado dominado por gigantes digitais”.

No fim de março, Klein enviou uma carta ao conselho pedindo a destituição do presidente do conselho, Renato Carvalho do Nascimento, e do conselheiro Rogério Paulo Calderón Peres. Ao mesmo tempo, pleiteava a sua indicação e de Luiz Carlos Nannini, afirmando que isso abriria espaço para a “retomada da rota de crescimento de seus negócios e geração de valor aos seus acionistas”.

Apesar de surpreendente, o passo atrás de Klein não era algo totalmente inesperado, segundo pessoas ouvidas pelo NeoFeed, que pediram para não serem identificadas. Elas dizem que o empresário vinham sinalizando essa possibilidade nos bastidores, por conta de reações que recebeu pelo movimento tempestivo, classificado como "inesperado" e "tempestivo".

A justificativa apresentada por Klein no pedido inicial foi vista com estranhamento, considerando que agenda de reestruturação em curso é corroborada pelo conselho de administração, que supostamente conta com o apoio de Klein. “Até onde eu sei, ele entende a estratégia como correta”, diz uma das fontes.

Por mais que tenha falado em não “causar movimentos disruptivos”, Klein gerou dúvidas e preocupações no momento em que a Casas Bahia tenta reconquistar sua credibilidade com uma estratégia de retomar a rentabilidade e de colocar as finanças em ordem antes de voltar a pensar em crescer vendas e expandir a operação, especialmente num momento em que o varejo sofre com os juros altos.

“Imagino que, no conselho, ele teria uma pegada mais varejista, porque gosta de crescimento”, diz uma fonte. “Sendo que, no momento, a estratégia atual da empresa é de disciplina financeira. Consistência neste momento é importante.”

O timming da mudança que queria promover no conselho, órgão que deixou em 2020, quando a companhia se chamava Via Varejo, também chamou a atenção. A argumentação é de que, se está de acordo com os princípios gerais da administração, Klein poderia ter esperado o vencimento do mandato do conselho de administração, marcado para ocorrer no ano que vem.

Uma fonte chegou ao ponto de falar que Klein tinha vontade de capitalizar o momento da empresa, depois que boa parte da dureza dos ajustes ficou para trás. “Parece que ele quer sair na foto, quer mostrar a cara quando as coisas estão indo bem”, afirma.

Klein possui atualmente uma participação de 10,4% no capital social da Casas Bahia, após uma série de operações no mercado em março, antes de declarar sua intenção de voltar ao conselho. No período, o investidor Rafael Ferri também elevou sua participação na empresa, a 5,1%. Sobre esse segundo movimento, uma fonte entende que foi uma “tese de investidor financeiro”.

A troca proposta por Klein ocorreu no momento em que o plano de reestruturação tocado pelo CEO Renato Franklin entra no último ano, pelo menos de acordo com o que foi traçado pelo executivo, apresentando resultados.

A diretoria tem sinalizado ao mercado que o objetivo é seguir expandindo suas margens e endereçar a questão da estrutura de capital. Ao mesmo tempo, a Casas Bahia quer manter sua atuação focada em linha branca, estratégica apelidada por Franklin como back to basics, e manter os ganhos com os cortes de gastos promovidos e com a administração de passivos.

No fim de abril do ano passado, a Casas Bahia fechou um acordo de reperfilamento de sua dívida bancária, renegociando um endividamento financeiro total de R$ 4,1 bilhões. O prazo médio de amortização passou de 22 meses para 72 meses.

Como parte desse acordo, Bradesco e Banco do Brasil podem converter R$ 1,5 bilhão da dívida em participação, o que representaria mais uma medida de alívio financeiro. Klein tentava impedir o movimento para evitar diluição.

A companhia, que saiu do processo de recuperação extrajudicial em agosto, também tem se apoiado na monetização de créditos fiscais e avalia trazer recursos com a venda de ativos não core, muitos deles adquiridos quando a empresa buscava ser um grande player de e-commerce.

A Casas Bahia fechou o quarto trimestre com um prejuízo de R$ 452 milhões, uma melhora de 55% em relação à perda de R$ 1 bilhão apurada no mesmo período de 2023. A receita líquida subiu 7,6%, para R$ 8 bilhões, enquanto o Ebitda ajustado cresceu quatro vezes, para R$ 640 milhões, com a margem passando de 2,2% para 8%.

Procurado pelo NeoFeed antes de voltar atrás do desistir da assembleia extraordinária, Michael Klein enviou uma nota dizendo que o pedido de convocação reconhecia "os esforços da atual diretoria na equalização financeira da companhia e propõe preservar o núcleo executivo, garantindo a continuidade do trabalho recente”. A nota dizia que “a empresa precisa de uma liderança com visão estratégica para adaptar o modelo tradicional às atuais demandas do mercado consumidor”.

As ações da Casas Bahia fecharam o pregão de ontem com alta de 1,20%, a R$ 7,59. No ano, acumulam alta de 167,25%, levando o valor de mercado a R$ 721,7 milhões.