Em meio a uma das principais crises enfrentadas pelo mercado de criptomoedas em seus poucos anos de existência, deflagrada pelo colapso da FTX, integrantes do Banco Central Europeu (BCE) reforçaram o coro dos críticos desses ativos, afirmando que o bitcoin está no caminho para se tornar irrelevante. 

Num post feito no blog da autoridade monetária europeia nesta quarta-feira, 30 de novembro, o diretor-geral Ulrich Bindseil e o analista Jürgen Schaaf retomaram algumas dos principais questionamentos sobre o bitcoin, a principal moeda digital do mundo, cujo valor de mercado está na casa dos US$ 327,6 bilhões. 

Uma das críticas da postagem é que o bitcoin não é um meio de pagamento, por ser caro e incapaz de ser utilizado na economia real. Tampouco se enquadra como um investimento, por não gerar fluxo de caixa, como imóveis, ou dividendos, como as ações. 

A dupla afirma que o bitcoin também não pode ser usado produtivamente, como as commodities, nem fornece benefícios sociais, como o ouro. 

“O design conceitual e as deficiências tecnológicas do bitcoin o tornam questionável como meio de pagamento”, destaca um trecho do texto. “O valor de mercado do bitcoin, portanto, é baseado puramente em especulação.”

Nessa quarta-feira, a cotação do bitcoin ultrapassou a marca de US$ 17 mil pela primeira vez em duas semanas, chegando a alcançar sua maior cotação desde 8 de novembro durante o dia, segundo dados da Coin Metrics compilados pela rede americana CNBC

Por volta das 17h38, ele avançava 3,66%, a R$ 17.062,73, apoiado nas declarações do presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), Jerome Powell, de que o ritmo de aperto monetário pode ser aliviado na última reunião do ano, em dezembro. 

Bindseil e Schaaf destacam ainda que o bitcoin desvalorizou 75,3% desde que atingiu o seu pico, em novembro de 2021. E mesmo que, aparentemente, tenha se estabilizado nas últimas semanas, levando seus entusiastas a afirmarem que ele aponta para uma forte valorização, os membros do BCE praticamente descartam essa possibilidade. 

“O mais provável, no entanto, é que seja um último suspiro, induzido artificialmente, antes de ele caminhar para a irrelevância, algo que já era previsível antes de a FTX falir e enviar o preço do bitcoin para bem abaixo dos US$ 16 mil”, destacam eles, em outro trecho do texto. 

Essa não é a primeira vez que um membro do BCE levanta dúvidas a respeito das criptomoedas. Em maio, a presidente da autoridade monetária europeia, Christine Lagarde, disse que esses ativos “não valem nada”.

Seus comentários vieram depois de outro escândalo que abalou o mundo cripto, a implosão da stablecoin algorítimica terraUSD, ativo atrelado ao dólar americano e que acabou perdendo sua paridade, gerando prejuízos multibilionários. 

O outro lado da moeda

Crises como essa e da FTX acabam suscitando questionamentos sobre as criptomoedas. Os críticos afirmam que elas são resultados da fragilidade inerente desses ativos e descartam que eles tenham qualquer utilidade. 

No outro lado da moeda, Reinaldo Rabelo, CEO do Mercado Bitcoin (MB), ressalta que essas crises são produzidas por empresas que muitas vezes apostam em replicar produtos de alto risco dos mercados tradicionais, como arbitragem, derivativos e alavancagem.

“A atual crise no mercado nada tem a ver com a tecnologia”, disse ele ao NeoFeed, destacando que o texto de membros do BCE representa "mais uma morte anunciada para o bitcoin, como as centenas de vezes anteriores que não se confirmaram”.

“Parece mais um desejo, requentando teses antigas sobre lentidão, custo da rede e comparações esdrúxulas com ativos tradicionais”, complementou. 

Rabelo destaca que, embora tenha nascido com o propósito de se tornar um meio de pagamento, o bitcoin atualmente é “o maior e mais seguro sistema descentralizado”, reconhecido como um bom investimento ou uma reserva de valor segura.

“Se considerarmos a instabilidade de economias, vide casos de uso na Venezuela e Argentina, e de governos, como no Afeganistão e na Ucrânia, o bitcoin acaba servindo como um tipo especial de reserva de valor, uma ferramenta para proteção de direitos individuais”, afirmou. 

Rabelo disse que casos como o da FTX trazem prejuízos para todo o ecossistema e para a imagem dos criptoativos, e não são um exemplo de como a indústria opera ou dos fundamentos desses ativos.

“Nem todo mundo vai separar o caso deles, uma exchange pirata, que se escondia em um paraíso fiscal e se dizia global, das empresas sérias, estabelecidas e reguladas”, afirmou. 

Diante desses fatos, muitos governos começam a se movimentar para criar legislações para enquadrar o mercado de criptoativos. Na terça-feira, 29 de novembro, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que cria o marco regulatório das criptomoedas no Brasil, definindo a regulamentação da prestação de serviços com criptoativos. O texto segue para a sanção do presidente da República. 

Na Europa, oficiais da Comissão Europeia, membros do Parlamento Europeu e representantes dos países membros da União Europeia chegaram a um acordo, em junho, para estabelecer regras para regular a indústria de criptoativos.