Um cenário bastante instável, que tem se refletido em poucas movimentações nas indústrias de private equity e de venture capital, e em um volume que insiste em se distanciar da onda de transações registradas até 2021. Mas há quem consiga ver além desse contexto, à primeira vista, desafiador.

“Você tem que se isolar do barulho”, afirmou Patrice Etlin, managing partner da gestora americana de private equity Advent, durante evento realizado pela XP Asset na tarde de quinta-feira, 27 de novembro, em São Paulo.

“Os nossos melhores deals no Brasil foram nos piores momentos”, prosseguiu Etlin, citando as aquisições da operação brasileira do Walmart, em 2018, durante a greve dos caminhoneiros, e do Grupo CRM, dono da Kopenhagen, em 2020, em meio à pandemia.

“Independentemente do cenário macro, que sempre vai estar volátil, é a expertise setorial que nos permite sempre trazer retornos”, afirmou o sócio da Advent, ressaltando o foco da gestora nos segmentos de saúde, varejo e consumo, serviços financeiros e tecnologia.

Alguns números mostram como os cenários adversos não foram capazes de frear o apetite da Advent pela América Latina e, principalmente, pelo Brasil. A começar pelos quase 30 anos em que a gestora atua na região, período em que vários de seus pares desembarcaram e deixaram esse mercado.

Desde então, foram oito fundos captados para a América Latina. O último deles, em 2020, de US$ 2 bilhões – uma diferença expressiva para os pouco mais de R$ 100 milhões arrecadados no primeiro veículo em 1996.

Desde então, o Brasil concentrou cerca de 70% dos recursos dedicados à América Latina e se consolidou como o quarto principal destino global dos investimentos da gestora, atrás apenas de Estados Unidos, Inglaterra e Alemanha.

Disposto a dar sequência a essa trajetória no País, Etlin ressaltou que, com a taxa básica de juros bastante elevada, o cenário no Brasil é de crescimentos pífios em diversos setores, o que se reflete em empresas muito machucadas, que não são o foco da Advent.

“É um contexto muito desafiador no fundraising para todos os ativos, mas muito interessante do lado da compra. Nessa ponta, para quem está com dinheiro em caixa, o momento é excelente no Brasil”, disse. “Nós já anunciamos duas transações este ano e tem mais coisas por vir.”

Em linha com essa visão, Chu Kong, head de private equity da XP Asset, ressaltou que o contexto macro atual facilita a procura dessas companhias pelos recursos e auxílios das gestoras de private equity. Em contrapartida, isso cria o desafio de trazer retornos exponenciais com esses investimentos.

“Quando montamos nosso fundo, em 2020, a Selic estava em 2%. Se eu trouxesse um retorno de 10% para o cotista, estava ótimo”, disse Kong. “Agora, com a taxa a 15%, se eu trouxer um retorno de 20%, ele vai achar pouco. Então, tenho que elevar minha barra para tentar procurar algo acima de 30%.”

No saldo entre oportunidades e desafios, quem também trouxe uma análise favorável sobre o momento do mercado, sob a ótica dos investimentos de venture capital, foi Romero Rodrigues, head de venture capital da XP Asset.

“No caso do venture capital, com o cenário macro mais difícil, muitas vezes é quando você tem as melhores safras de empresas de tecnologia sendo criadas”, afirmou Rodrigues, ressaltando que isso acontece justamente porque o ambiente está “mais arisco” para as captações. Inclusive dos fundos.

“Mas os poucos que conseguem, vão enfrentar pouca competição”, prosseguiu ele. “Ou seja, se eu invisto em uma startup de um determinado setor e o macro está difícil, ninguém vai investir na concorrente dessa empresa. E, mais do que isso, essa empresa vai ter mais capital que as rivais.”

Em outra frente, Rodrigues destacou que o boom de investimentos realizados até 2021 – e, na sequência, as correções que dominaram todo o mercado – trouxeram um bom legado para o ecossistema de venture capital no Brasil.

“Hoje, nós temos empreendedores com uma visão de crescimento semelhantes ao dos seus pares de 2018 a 2022, mas com uma cabeça de eficiência de capital, que é da minha geração lá atrás, que quase não tinha acesso a recursos”, afirmou. “Essa combinação é muito mais saudável.”