Passado o boom das vacinas durante a pandemia da Covid-19, os medicamentos para tratar a obesidade vêm se consolidando como uma das novas prioridades da indústria farmacêutica. Mas já há exemplos de projetos que talvez tenham exagerado a dose no apetite pela categoria.

Na sexta-feira, 1º de dezembro, a Pfizer informou ao mercado que vai interromper o desenvolvimento de uma versão do Danuglipron, pílula para o tratamento da obesidade, que seria administrada duas vezes ao dia.

A decisão foi tomada em função dos índices elevados de efeitos colaterais nos pacientes durante os estudos clínicos. Em contrapartida, a farmacêutica americana afirmou que dará sequência aos testes para uma versão com uma dose diária, com resultados previstos para o primeiro semestre de 2024.

“Os resultados dos estudos atuais e futuros da formulação do Danuglipron uma vez ao dia irão informar sobre um possível caminho a seguir com o objetivo de melhorar o perfil de tolerabilidade e otimizar tanto o desenvolvimento do estudo como sua execução”, afirmou Mikael Dolsten, presidente e Chief Scientific Officer da área de pesquisa e desenvolvimento da Pfizer.

A escolha de não avançar para a terceira etapa dos estudos foi divulgada juntamente com os principais resultados da fase 2 do projeto. Nesse estágio, entre outros dados, o Danugliprom com duas dosagens ao dia contabilizou patamares médios de redução de peso nos pacientes de 6,9% a 11,7%.

No comunicado, a Pfizer observou que os efeitos colaterais mais comuns foram leves e de natureza gastrointestinal, consistentes com o medicamento. Mas ressaltou que as reações vieram com taxas elevadas. Um dos exemplos foram as náuseas, com índices de até 73%.

Negociadas na Bolsa de Nova York, as ações da Pfizer não ficaram imunes aos anúncios dessa sexta-feira. Os papéis chegaram a cair mais de 6% na manhã de hoje e, por volta das 12h20 (horário local) recuavam 4%, cotados em US$ 29,25, dando à empresa um valor de mercado de US$ 165,3 bilhões.

Em Wall Street, o avanço no tratamento da obesidade era visto, até pouco tempo, como uma das vias mais promissoras para a companhia se recuperar da queda na demanda por seus medicamentos pós-Covid, um desempenho que se reflete numa desvalorização de 42,9% em suas ações em 2023.

Tal visão também era compartilhada por Albert Bourla, CEO da Pfizer. Em janeiro, durante uma conferência, o executivo destacou a categoria, que surge como uma alternativa aos tratamentos por meio de injeções. E ressaltou seu potencial para movimentar US$ 90 bilhões anualmente.

Em outro dado que reforça esse cenário, um levantamento da Organização Mundial da Saúde (OMS), divulgado em 2022, apontou um universo de mais de 1 bilhão de pessoas no mundo com obesidade, entre crianças e adultos.

À parte desses números, a percepção do mercado em relação à Pfizer já tinha sido abalada em junho deste ano, quando a empresa descartou dar sequência aos estudos de uma pílula de uma dose diária baseada em outro candidato, o Lotiglipron, e se concentrar justamente no Danuglipron.

Dentro desse contexto, a reação inicial do mercado ao anúncio de hoje pode ser interpretada como o entendimento de que a Pfizer está atrasada em uma corrida que também está guiando as estratégias de outros players do setor. E cujos testes mostram, a princípio, resultados mais animadores.

No caso da também americana Eli Lilly, por exemplo, os dados da fase dois de um medicamento similar mostraram reduções de peso nos pacientes de até 14,7%, após ensaios clínicos com duração de 36 semanas.

De olho na demanda crescente pela categoria, a farmacêutica anunciou, há duas semanas, um investimento de US$ 2,5 bilhões para erguer uma fábrica na Alemanha, voltada a medicamentos dessa natureza e que deve entrar em operação em 2027.

Uma semana antes da Eli Lilly, quem também deu sua tacada nesse espaço foi a Astra Zeneca, que firmou uma parceria com a Eccogene, empresa chinesa de biotecnologia, para desenvolver uma pílula para obesidade. O acordo prevê um investimento de até US$ 2 bilhões por parte do grupo britânico.

Quem largou na frente, porém, foi a dinamarquesa Novo Nordisk, cujo medicamento, batizado de Ozempic, deu início a essa onda e alimentou a forte e crescente procura pela categoria. O que trouxe, inclusive, um impacto significativo sobre o PIB da Dinamarca.

Na esteira desse sucesso, em setembro, a Novo Nordisk alcançou o posto de empresa mais valiosa da Europa, ao ser avaliada em US$ 444 bilhões. Desde então, o valor de mercado da companhia ganhou novos dígitos, alcançando o patamar atual de US$ 451,4 bilhões.