Avenida Faria Lima, 3.600, em São Paulo. Durante nove anos, a sede da Cyrela foi o destino diário de Paulo Gonçalves. Desde março, no entanto, o executivo, ex-diretor da incorporadora, tem um novo endereço profissional.
A pouco mais de um quilômetro dali, o quarto andar do prédio instalado no número 242, da Rua Olimpíadas, abriga a CashMe, fintech de empréstimo com garantia em imóveis. A startup foi gestada dentro da própria Cyrela, a partir de 2017, sob o comando de Gonçalves e de Juliano Bello, outro ex-diretor da “casa”.
A distância entre os dois endereços é curta. A mudança, porém, é simbólica. A CashMe segue como uma subsidiária da incorporadora mas, além da sede, está ganhando vida própria e ampliando seu alcance. “Temos um mundo de coisas para fazer nesse segmento”, diz Gonçalves, cofundador da empresa, ao NeoFeed.
Como parte dessa visão, a CashMe vai começar a oferecer uma nova modalidade de empréstimos, voltada a condomínios. Na prática, a startup vai conceder crédito para que os prédios residenciais financiem obras, reformas e demais expansões.
O projeto-piloto será lançado na primeira quinzena deste mês. Algumas métricas ainda estão em fase de definição, como a taxa média a ser cobrada. Ao mesmo tempo, a empresa estabeleceu que o valor do financiamento será de até 10% das receitas de condomínio do prédio em questão.
“Muitas vezes, alguns moradores não têm condições de arcar com reformas que precisam ser feitas”, diz Gonçalves. “Nós conseguimos oferecer um prazo relativamente longo.” No modelo, a startup vai testar linhas com prazos de até seis anos, com o pagamento diluído nas cotas condominiais.
A CashMe já tem outras três linhas de empréstimos com garantia em imóvel. Mais voltada a pessoas físicas e pequenos e médios empresários, a primeira delas é a de home equity, um segmento que atrai cada vez mais competidores, como BCredi, Credihome e, em especial, a Creditas.
No caso da CashMe, os créditos em home equity são ofertados com prazos de até 12 anos e taxas a partir de 0,99% ao mês, mais o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Os tomadores do empréstimo podem financiar até 60% do valor do imóvel que é dado como garantia.
Há também modelos para construtoras e incorporadoras de pequeno e médio porte. Um dos formatos envolve o uso dos estoques de empreendimentos dessas empresas como garantia, para que elas financiem parte de suas obras.
A terceira modalidade envolve operações estruturadas, que são direcionadas a empresas que buscam capital de giro, o que pode incluir desde administradoras de shopping centers até companhias de qualquer segmento com ativos imobiliários.
Na carteira
Com esse portfólio, a CashMe trabalha com tíquetes médios que variam de R$ 800 mil, em home equity, até R$ 7 milhões, no crédito de capital de giro. A startup fechou 2019 com uma carteira de R$ 400 milhões, cujo funding vem de operações de securitização no mercado de capitais. “A meta é chegar a R$ 800 milhões nesse ano e dobrar a operação em 2021”, diz o executivo.
Para Roberto Sampaio, CEO da gestora Empirica Real Estate, o Brasil, ao contrário de países como os Estados Unidos, ainda tem muito a avançar no segmento. “Mas com a taxa de juros baixa, os investidores têm cada vez mais apetite em financiar essas operações lastreadas em uma garantia real.”
Ele entende que o modelo variado da CashMe é uma boa aposta para se diferenciar em um espaço cada vez mais concorrido. Mas ressalta que executar o modelo não é simples. “São negócios totalmente diferentes. O home equity, por exemplo, é varejo. Exige escala e capilaridade.”
Para atender a esses desafios, a empresa vem ampliando seu time. Em três anos, a CashMe saiu de três para os atuais 80 funcionários. Além desse time e das estratégias orgânicas de captação, a startup conta com outros braços para ganhar tração em suas ofertas.
Em home equity, a companhia está se aproximando de administradoras de shopping centers para que essas empresas possam oferecer financiamentos aos lojistas de seus empreendimentos. A estratégia é recente e já originou cerca de R$ 7 milhões em transações.
A CashMe trabalha com tíquetes médios que variam de R$ 800 mil, em home equity, até R$ 7 milhões, no crédito de capital de giro
Hoje, nesse segmento, a CashMe tem parcerias com a Cyrela Commercial Properties (CCP), braço da Cyrela no setor; o grupo Saphir, dono do Fashion Mall, no Rio de Janeiro e outros 11 centros de compra; e com o grupo Terral, do Centro-Oeste, que também tem 12 empreendimentos em seu portfólio.
Ao mesmo tempo, a startup conta com cerca de 600 consultores autônomos, distribuídos em todo o País e, em sua maioria, ex-gerentes de banco. “São pessoas com boas redes de relacionamento”, diz Gonçalves. “E que, além do home equity, trazem muitos negócios em capital de giro.”
No médio prazo, a startup não descarta investir em subprodutos dentro de suas linhas principais. Nessa direção, uma das possíveis áreas a serem exploradas é a oferta de produtos financeiros, como seguros.
Spin-off
A CashMe é o primeiro spin-off dentro da estratégia da Cyrela de estimular a criação de startups internas. Essa orientação começou a ganhar fôlego em 2014 faz parte de um esforço mais amplo da incorporadora, que inclui ainda questões como a aproximação com o ecossistema de inovação.
No fim de 2017, quando alcançou uma carteira de R$ 100 milhões, a CashMe ganhou, de fato, o status de empresa, com a aprovação do Conselho de Administração da Cyrela. Nos anos seguintes, a operação foi atraindo mais atenção e recursos da incorporadora.
Além da sede própria, a companhia quer consolidar uma estrutura operacional independente da Cyrela. “Estamos desmamando aos poucos”, brinca Gonçalves. “Mas, em relação ao apoio institucional, nada muda. Hoje, ainda somos uma empresa da Cyrela. E a intenção é seguir assim por muito tempo.”
A CashMe não é a única startup criada nas fileiras da Cyrela. Outro projeto é a Mude.me, plataforma que ajuda a organizar festas de casamento e permite trocar listas de presentes pela arrecadação de recursos para dar entrada em um imóvel próprio. Além do estoque da incorporadora, o inventário à disposição inclui empreendimentos de empresas como Setin e Trisul.
A Cyrela tem ainda projetos como o MIT Hub, coworking voltado a startups ligadas ao setor imobiliário, criado em 2018. Mais recentemente, o grupo lançou a Next Floor, iniciativa que, entre outras áreas, buscará novos negócios para investimentos estratégicos da incorporadora.
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