Em meados do ano passado, em meio a pandemia e com lojas físicas fechadas, a Zerezes, uma marca independente de óculos, resolveu dar uma guinada em sua estratégia apostando nas vendas online e no modelo D2C (direct-to-consumer).
A inspiração da empresa brasileira era clara: a americana Warby Parker, que acabou de abrir o capital e viu suas ações subirem 35% no primeiro dia de negociação na Bolsa de Nova York, no fim de setembro – atualmente, elas estão com uma alta de 17%.
Agora, a Zerezes está retomando seu plano de crescimento com lojas físicas. Em agosto, inaugurou seu primeiro ponto físico em São Paulo e as vendas equivalem a duas unidades do Rio de Janeiro, onde tem cinco lojas. Em novembro, a Zerezes vai abrir uma nova unidade na capital paulista.
O plano é contar mais sete lojas em 2022, dobrando o número de pontos físicos. As novas unidades vão se concentrar em São Paulo e Rio de Janeiro. “Vamos fazer a expansão digital e física lado a lado”, diz Rodrigo Latini, CEO da Zerezes, em entrevista ao NeoFeed.
Para bancar seu plano de expansão física, a Zerezes vai buscar uma captação com investidores. Até agora, a companhia caminhou com as próprias pernas e deve fechar com um faturamento de R$ 35 milhões em 2021, um crescimento de 250% em relação ao ano passado. As lojas físicas representam 55% desse resultado.
A razão de voltar a apostar em lojas físicas é simples. Segundo estimativas da Zerezes, 99% das vendas de óculos no Brasil acontecem em um ponto físico, um mercado que fatura mais de R$ 20 bilhões por ano, segundo a Associação Brasileira das Indústrias Ópticas (Abióptica).
“Todas as empresas de D2C entenderam que é necessário uma combinação de canais”, afirma Eduardo Yamashita, diretor de operações do Grupo GS& Gouvêa de Souza. “Não dá para estar só no online ou só no físico.”
A Warby Parker, o benchmark da Zerezes, por exemplo, tinha planos de inaugurar 35 lojas em 2021, em um claro sinal de que, apesar de ter nascido online, o futuro era omnichannel. Até o segundo trimestre, a Warby Parker contava com 145 lojas em operação. Neste ano, metade das vendas são online – em 2020, o percentual era de 60%.
Ao apostar nas lojas físicas, a Zerezes não vai deixar de lado o online Ao contrário. A companhia enxerga uma imensa oportunidade nas vendas digitais, uma área em que a maioria dos concorrentes, como Óticas Carol, Diniz e Chilli Beans, não fez investimentos maciços por conta de um modelo de negócios baseado em franquias.
Nas contas da Latini, no mercado americano, onde a Warby Parker abriu caminho, as vendas online de óculos de grau e de sol representam 13% do mercado total. No Brasil, é apenas 1%. A meta da Zerezes é buscar uma fatia de 4% a 5% das vendas digitais no período de cinco ano anos. “Estamos investindo muito na digitalização da empresa”, afirma Latini.
Um exemplo é a tecnologia de inteligência artificial que permite tirar medidas precisas da distância naso pupilar para a confecção de lentes de grau. Outro é o espelho virtual, em que é possível “experimentar” as armações de óculos.
Para os consumidores que ainda têm resistência a comprar uma armação sem experimentar fisicamente, a Zerezes desenvolveu um serviço que entrega na casa do cliente quatro armações para serem testadas sem custo nenhum. No ano que vem, o plano é levar esse modelo para outros Estados – hoje, as entregas são feitas exclusivamente nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro.
A Zerezes foi fundada, em 2012, por Hugo Galindo e Luiz Eduardo Rocha. Latini chegou só em 2016, quando a dupla resolveu abrir a primeira loja e o convidou para tocar a expansão. Desde o começo, os óculos tinham como diferencial o design e o material, que era, em sua maioria, de madeira reaproveitável e leve.
Com a pandemia, o trio de fundadores resolveu pausar a expansão física e fazer um rebrading da Zerezes, focando no modelo D2C. Mas as lojas não foram deixadas de lado e passaram por uma remodelação, antes da expansão que começou neste ano e vai se acelerar em 2022. “Parece uma loja de moda”, afirma Latini.
Atualmente, a produção dos óculos é toda terceirizada da China. A Zerezes, por sua vez, cuida de todo o design, no modelo que consagrou a Apple e a Nike. As lentes vêm também do mercado chinês. A companhia oferece armações e lentes a partir de R$ 395.
“O segredo das marcas digitais é oferecer um produto melhor, por um preço menor”, diz Yamashita, do Grupo GS& Gouvêa de Souza. “Outro alicerce é o relacionamento com o consumidor, que começa na loja física, mas migra para o online.”
Mas a Zerezes não está sozinha nessa disputa para saber quem consegue ter um modelo mais próximo da Warby Parker no Brasil. A Livo, que trouxe Ronaldo Pereira Jr., ex-CEO da Óticas Carol, para o seu conselho, tem estratégia semelhante e faz óculos à mão. Com 10 lojas em São Paulo, Santa Catarina e Porto Alegre, a companhia está duplicando seus pontos físicos em 2021.
As óticas tradicionais, que contam com 26 mil pontos físicos espalhados pelo Brasil, também acordaram para a mistura dos canais físicos e online com a pandemia e que estão investindo na digitalização, mas sem tirar os franqueados da jogada.
Um exemplo é a Chilli Beans, do empresário Caito Maia, que apostou no WhatsApp durante a pandemia. A ferramenta do Facebook foi usada para contatar clientes e levar vendas para o site. Mas o vendedor era sempre comissionado pelo negócio gerado.