Todos os dias, os oncologistas se veem às voltas com a desafiadora decisão de escolher qual é o melhor caminho a seguir no tratamento de seus pacientes. Frequentemente, doentes, com um mesmo perfil e vítimas de um mesmo tipo de tumor, respondem de maneira completamente diferente a um mesmo medicamento.

Prever como o paciente reagirá a uma determinada intervenção é um dos maiores desafios da oncologia. Pois bem, a healthtech Valar Labs desenvolveu uma plataforma de inteligência artificial (IA) capaz de ajudar os médicos nessa tomada de decisão.

Batizada Vesta, a ferramenta, por enquanto, está programada para fazer o rastreamento do câncer de bexiga.

Globalmente, entre todas as neoplasias, a doença é a quarta mais comum entre os homens e o oitava, entre as mulheres. No Brasil, para o triênio 2023-2025, são esperados 11.370 novos casos, por ano — e 4.595 mortes. Quando a doença é diagnosticada em fases iniciais, as chances de cura são altas.

Mas, mesmo nessas situações, um grupo de pacientes não responde à abordagem padrão, a imunoterapia com BCG. Determinar quais deles não são candidatos ao tratamento os poupa dos efeitos colaterais (em geral, severos) e economiza um tempo precioso com uma terapêutica que, mais adiante, se mostraria ineficaz.

Na oncologia, quanto mais precoce é o diagnóstico e mais preciso é o tratamento, maior é a probabilidade de cura, sem grandes prejuízos da qualidade de vida do doente.

Fundada em 2021, em Palo Alto, na Califórnia, por Anirudh Joshi, Damir Vrabac, Pranav Rajpurkar e Viswesh Krishna, a healthtech acaba de levantar US$ 22 milhões, em uma rodada série A, liderada pelos fundos DCVC e 16Z, com a participação das gestoras PearVC e Andreessen Horowitz.

Com o cheque mais recente, o total arrecadado sobe para US$ 26 milhões, segundo a consultoria Crunchbase. O dinheiro será usado para expandir o portfólio da Valar Labs para outros tipos de câncer. Estudos sobre a aplicação da IA em pacientes com tumores pancreáticos já estão em andamento.

Mil pacientes, de quatro continentes

A IA Vesta foi testada em mil pacientes, em quatro continentes. Os resultados dos estudos científicos foram publicados na revista especializada The Journal of Urology, da Associação Americana de Urologia — a aceitação do artigo é um indicativo da qualidade e seriedade dos estudos.

Damir Vrabac (COO), Anirudh Joshi (CEO) e Viswesh Krishna (CTO) fundaram a healthtech em 2021, na Califórnia (Crédito: reprodução valarlabs.com)

Essa é uma amostra de um tecido da bexiga de um paciente com câncer, conforme a imagem é analisada pela IA Vesta (Crédito: reprodução valarlabs.com)

O sistema da Valar Labs funciona em duas etapas. Na primeira, um modelo de visão computacional, treinada em milhares de imagens histológicas de pacientes com câncer, analisa em minúcias o tecido doente.

Os patologistas humanos, em geral, por meio de comparações com células sadias, conseguem identificar que há algo de errado com as cancerosas. Mas frequentemente têm dificuldade para medir as diferenças entre elas.

Mais precisão

Na segunda fase, a IA indica se o paciente se beneficiará ou não da imunoterapia com BCG.

A precisão, segundo os especialistas, é muito maior do que as métricas usadas atualmente, como a avaliação dos fatores de risco, a cistoscopia (exame endoscópico da bexiga) e a biópsia.

Nos estudos da Valar Labs, a Vesta consegue identificar os doentes com o triplo de risco de não responder à imunoterapia com BCG.

Apesar do sucesso da IA, o sistema não substitui a decisão do médico — pelo menos, por enquanto, nenhuma tecnologia é capaz assumir o lugar dos profissionais humanos. A Vesta, porém, acena com a possibilidade de tratamentos cada vez mais personalizados; um sonho antigo da medicina