Na mesma medida que valorizamos e celebramos o sucesso, também costumamos temer e rechaçar os erros. Nos negócios, no ambiente de trabalho e na vida pessoal, o fracasso é historicamente um imperativo a ser evitado a qualquer custo. Mas todos os fracassos são iguais?

É a partir dessa provocação que Amy Edmondson, professora de liderança e gestão na Harvard Business School, nos convida a examinar a nossa relação com a falha em seu novo livro The Right Kind of Wrong: The Science of Failing Well (“O Tipo Certo de Erro: A Ciência de Falhar Bem”, ainda sem tradução em português).

Em 368 páginas, Amy questiona como a sociedade e as organizações enxergam e lidam com a derrota e pontua: “Estamos fracassando na forma como fracassamos”.

A obra foi eleita recentemente o "Melhor Livro de Negócios de 2023", pelo Financial Times. Nele, a autora explora histórias pessoais e cases da ciência e do mercado que tratam de erros ocorridos em empresas de petróleo, bancos e farmacêuticas, entre outros.

The Right Kind of Wrong é a primeira obra de gestão convencional premiada pelo jornal inglês em 19 edições do prêmio. Ano passado, o vencedor foi Chip War, de Chris Miller, sobre a batalha global pela supremacia dos semicondutores.

“Falhar bem é difícil por três motivos: aversão, confusão e medo. A aversão refere-se a uma resposta emocional instintiva ao fracasso. A confusão surge quando não temos acesso a uma estrutura para distinguir os tipos de fracasso. O medo vem do estigma social”, escreve Amy.

Estudando segurança psicológica no ambiente de trabalho há mais de 20 anos, ela afirma que para "errar certo" é fundamental haver uma cultura corporativa onde os colaboradores se sintam instigados a expressar suas opiniões sem medo de punição. “Se quisermos ter sucesso num mundo em mudança, devemos ter um ambiente onde as pessoas se sintam seguras para falar sobre tudo.”

A obra não endossa a tomada de riscos impensados, alerta a autora
A obra não endossa a tomada de riscos impensados, alerta a autora

No livro, a autora apresenta três arquétipos de fracasso: básico, complexo e inteligente.

Ela diz que as falhas básicas têm uma única causa e podem ser evitadas. Em 2020, por exemplo, três funcionários do Citigroup transferiram acidentalmente US$ 900 milhões ― em vez de US$ 8 milhões ― para empresas que gerenciavam um empréstimo. Um dos maiores erros humanos da história bancária americana.

“Ao contrário das falhas inteligentes, que ocorrem em território desconhecido, as falhas básicas envolvem erros em um terreno já conhecido. Elas não são o tipo certo de erro.”

Para Amy, as falhas básicas podem ser evitadas com sistemas simples de organização, mas para isso é preciso criar uma cultura de segurança psicológica onde erros não são tabu.

“Os hospitais, por exemplo, usam listas de verificação cirúrgica para garantir que os cirurgiões não deixem objetos no corpo do paciente, uma falha básica evitável”.

Outro tipo de falha abordada no livro são as tidas como complexas: erros causados por múltiplos fatores que se alinham, mas que por si só não causariam problemas. Amy cita como exemplo o desastre de Torrey Canyon, nos anos 1970, quando um navio de petróleo colidiu com um recife de corais e despejou mais de 100 mil toneladas de óleo na costa inglesa.

No julgamento do caso, o capitão da embarcação afirmou que "pequenas coisas se somaram e se transformaram em um grande desastre”. Entre os erros estavam um prazo de entrega apertado, mudanças inesperadas na rota, neblina, problema no leme do navio e até barcos pesqueiros de lagosta que entraram no caminho do petroleiro.

“Devemos tratar o fracasso com sobriedade, porque alguns são absolutamente catastróficos. Assim como as falhas básicas, as falhas complexas não são o tipo certo de erro", defende. "Por outro lado, dizer que falhas complexas não são o tipo certo de erro não significa considerar que elas são culpáveis.”

Parte do livro é destinada a explorar o que Amy classifica como "fracasso inteligente", ou seja, o melhor (ou menos pior) tipo de erro que podemos cometer. Essas falhas acontecem quando testamos hipóteses em cenários inexplorados, usando o conhecimento que temos, e minimizando o tamanho de um possível mau resultado.

Nos anos 1990, a farmacêutica Eli Lilly gastou mais de uma década e dezenas de milhões de dólares para desenvolver um medicamento para o tratamento do câncer de pulmão, mas nos ensaios clínicos alargados, o medicamento não funcionou e nunca chegou às farmácias. Ainda assim, a pesquisa forneceu novidades valiosas para a indústria.

Esse tipo de fracasso inteligente é o que Amy diz que devemos perseguir no âmbito pessoal e nas organizações. Fracassar é inevitável e desagradável, então, se for para errar, que erremos fazendo descobertas interessantes.

“Bons fracassos são aqueles que nos trazem novas informações valiosas que simplesmente não poderiam ter sido obtidas de outra forma”, escreve.

Como podemos reconhecer (e praticar) um fracasso inteligente? A autora elenca quatro características:

. O experimento ocorre em um território inexplorado.

. Ele é orientado por hipóteses factíveis.

. O plano é bem pensado e intencional, oferecendo uma recompensa significativa se for bem-sucedido.

. O projeto não arrisca recursos excessivos caso algo dê errado.

Roula Khalaf, presidente do júri do Financial Times, considera o trabalho de Amy  “altamente legível e relevante, com lições importantes para líderes e gestores em todo o mundo”.

No livro, a autora frisa que sua narrativa não é um endosso à tomada de riscos impensados, mas sim uma provocação sobre nossa relação com a possibilidade de fracassar.

A professora de Harvard defende: “Não queremos que as pessoas se envolvam em comportamentos de risco e não tenham medo. Queremos que as pessoas tenham um grau adequado de respeito pelo fracasso”.

Capa do livro

Serviço
"The Right Kind of Wrong: The Science of Failing Well"
Amy Edmondson
368 páginas
Livro impresso: US$ 19,26
E-book: US$ 9,99
Editora Atria Books