Com cerca de meio centímetro de tamanho, uma leguminosa de cor dourada vem ganhando espaço na composição dos leites vegetais. Ao lado de soja, amêndoa e aveia, a ervilha amarela entra na disputa por um mercado global avaliado em US$ 30 bilhões, em 2030.
Um dos sinais mais emblemáticos do avanço do grão no ecossistema de inovação agroalimentar é o interesse crescente dos venture capital pelo vegetal.
A americana Ripple Foods, por exemplo, fecha 2023 com a entrada em caixa de US$ 49 milhões. A rodada série F foi liderada pela S2G Ventures, Ajax Strategies e Bloom8 e eleva o total financiado para US$ 313 milhões, informa a plataforma Crunchbase.
Fundada em 2014 pelos engenheiros químicos Adam Lowry e Neil Renninger, a empresa desenvolveu a Ripptein, uma proteína de cor e sabor neutros - o grande diferencial da startup de Berkeley, na Califórnia, avaliam os analistas do setor.
Apesar dos progressos da tecnologia de alimentos, a maioria dos leites e laticínios feitos de plantas ainda carrega muito das características sensoriais dos vegetais, um entrave para a indústria plant-based na conquista de novos consumidores.
E a Ripple Foods conseguiu vencer essa barreira sem comprometer o valor nutricional da ervilha amarela. Ao contrário.
Lançado comercialmente em 2016, o leite da foodtech tem oito gramas de proteína por porção de 240 mililitros, menos açúcar e mais fibras do que seus similares vegetais e 50% mais cálcio do que o leite de vaca. A marca hoje inclui também shakes, iogurtes e produtos infantis, com distribuição nos Estados Unidos.
Para crianças
O maior sucesso da startup é o Ripple Kids, o primeiro leite plant-based para crianças do mundo e responsável pelo “crescimento explosivo” da empresa, nos últimos dois anos, como define a CEO Laura Flanagan, em comunicado recente. Naquele ano, a startup levantou quase US$ 78 milhões, em duas rodadas de investimentos.
Em julho passado, a Ripple Foods apresentou a nova versão do produto; agora, sem açúcar e enriquecido com ômega 3, a gordura do bem, essencial para a saúde do coração e do cérebro. O entusiasmo em torno do Ripple Kids se explica: a proteína do leite de vaca encabeça a lista das alergias alimentares mais comuns, sobretudo na infância, ao longo do primeiro ano de vida.
Conforme avançam as ciências da nutrição, a ervilha amarela ganha relevância como ingrediente dos lácteos vegetais. Um estudo coordenado pelo químico Ben Redan, pesquisador da FDA, a agência americana de controle de alimentos e remédios, comparou os leites à base de plantas com o produto de origem animal quanto às concentrações de quatro minerais.
Pelos resultados apresentados no encontro da American Chemical Society 2022, as bebidas feitas de ervilha contêm 50% mais fósforo, zinco e selênio. O leite de soja apresenta taxas maiores de magnésio. Fundamentais ao bom funcionamento do organismo, esses compostos não são produzidos pelo corpo humano, sendo obtidos apenas por meio da alimentação.
Avaliações realizadas anteriormente demonstram que, de todos os leites vegetais, o de ervilha é o que mais se aproxima ao de vaca nas quantidades de proteína, cálcio e vitamina D.
Boa para a saúde humana e do planeta
Consumida sob as mais diversas formas, a ervilha amarela é tida como um superalimento. Além das proteínas, minerais e vitaminas, é fonte de fibras e carboidratos complexos, responsáveis pelo controle das taxas de açúcar no sangue.
Há benefícios para o planeta também. O cultivo da leguminosa exige menos água e emite menos gases de efeito estufa, em relação a outras plantas da mesma categoria. Originária do sudoeste asiático e consumida há pelo menos 5 mil anos, a ervilha amarela tem a capacidade única de fixar o nitrogênio do ar e convertê-lo em alimento para o solo.
Não à toa, o mercado global do grão deve saltar dos atuais US$ 2 bilhões para US$ 3,6 bilhões, na próxima década, informa a consultoria Maxwer Group.
“As ervilhas amarelas evoluíram de leguminosas humildes para intervenientes significativas no comércio agrícola global”, lê-se em relatório da empresa suíça. “A sua versatilidade, valor nutricional e benefícios ambientais impulsionaram sua popularidade, tornando-as um ingrediente indispensável em vários produtos e alternativas à base de plantas.”
E, no caso da Ripple Foods, especificamente dos US$ 49 milhões arrecadados recentemente, o grão foi responsável também por um dos maiores investimentos já captados por uma foodtech liderada por uma mulher. Laura Flanagan assumiu o comando dos negócios em outubro de 2019.