O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou na quinta-feira, 28 de dezembro, um conjunto de medidas para compensar o chamado “gasto tributário”, as perdas de arrecadação de impostos por conta de leis aprovadas no Congresso Nacional que vêm drenando recursos do governo.
As três medidas, anunciadas em entrevista coletiva em Brasília, incluem a limitação das compensações tributárias feitas pelas empresas e a revogação gradual da renúncia fiscal do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), baixado durante a pandemia.
A terceira medida é uma resposta à derrubada do veto do Congresso à desoneração da folha de pagamento: o governo propõe a isenção, da cota patronal, do primeiro salário mínimo dos trabalhadores celetistas.
De acordo com Haddad, as três propostas serão enviadas por meio de um Medida Provisória (MP) ao Congresso, que deve analisá-las apenas após o recesso de início de ano. Mas já há indícios de que o governo deverá enfrentar resistências políticas e também por parte dos setores atingidos.
“Após a entrevista, percebe-se que o Governo continuará sua busca frenética pelo aumento de arrecadação em 2024, além do que já foi feito até 2023: reforma tributária, alteração da tributação de fundos, subsídios tributários, mudanças nos juros sobre capital próprio (JCP), entre outros”, afirma o tributarista Henrique Erbolato, sócio do escritório Santos Neto Advogados.
Segundo ele, porém, muitas das medidas anunciadas são questionáveis juridicamente. “Portanto, ao invés de gerarem o aumento de receita pretendida, poderão somente fomentar ainda mais o contencioso administrativo e judicial”, adverte.
De acordo com o ministro, o objetivo do pacote é organizar o orçamento federal, mas ele admitiu que as medidas não devem ser suficientes para garantir o déficit zero em 2024.
"Nosso esforço continua no sentido de equilibrar as contas por meio da redução de gastos tributários", aponta o ministro, lembrando que o governo realizou o pagamento de 100% dos precatórios (R$ 90 bilhões), dívidas do governo transitadas em julgado para as quais não cabem mais recursos.
“O gasto tributário no Brasil foi o que mais cresceu, subiu de cerca de 2% do PIB para 6% do PIB", afirma Haddad, reforçando o compromisso do governo de perseguir a meta fiscal prevista no Orçamento de 2024, de déficit zero.
Mas ele admitiu dificuldades para o ano que vem: "Teremos um primeiro trimestre de 2024 que vai inspirar cuidado depois de dois trimestres com perda de arrecadação".
Meio trilhão de reais
Das três medidas, Haddad afirmou que a mais relevante é a que trata das compensações tributárias feitas pelas empresas. Na prática, referem-se a impostos que não serão recolhidos nos próximos anos para "compensar" tributos pagos indevidamente em anos anteriores e já reconhecidos pela Justiça.
“São causas que envolvem meio trilhão de reais, que o governo vem devolvendo desde 2017”, afirma o ministro. A saída proposta impõe um limite sobre o que pode ser compensado de um ano para o outro de 30%.
"Vamos adotar um critério similar à compensação de prejuízo de empresas, que uma limitação a um determinado percentual”, explica. “Há empresas que estão há anos sem pagar imposto, e isso nos dá condições de planejamento.”
A segunda medida diz respeito ao Perse, programa criado para beneficiar o setor cultural e prorrogado pelo Congresso, em maio, até 2026.
As empresas foram beneficiadas com alíquota zero do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ), da Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
De acordo com a lei, a previsão de isenção fiscal para o setor era de R$ 4 bilhões anuais. Neste ano, no entanto, os contribuintes informaram uma renúncia de R$ 16 bilhões, o quádruplo do proposto por ano e 80% do valor total nos cinco anos do programa.
Segundo Haddad, a ideia é retomar a cobrança de tributos. As mudanças serão realizadas gradualmente nos próximos dois anos. "O pacote de R$ 20 bilhões de renúncia por cinco anos será compensado em dois anos, se esgotando em 2024", explica, ressaltando que “uma renúncia total de R$ 100 bilhões com o Perse não teria justificativa”.
Desoneração da folha
A medida mais aguardada era a que pudesse compensar a renúncia fiscal da desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia. O veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi barrado no Congresso, e por isso a desoneração foi prorrogada até 2027.
“Estamos encaminhando ao Congresso uma reoneração gradual, setor a setor, não necessariamente uma volta a 20% da cota patronal original”, enfatiza. Até a derrubada do veto, as empresas pagavam 20% na contribuição previdenciária. Já com a regra diferenciada, que volta a valer, pagam de 1% a 4,5% incidido na receita bruta.
Como contrapartida para o tema reoneração, Haddad anunciou que o governo vai testar um “ingrediente novo”. A medida prevê a desoneração parcial para os empregadores do "primeiro salário mínimo" recebido por cada trabalhador com carteira assinada.
“Se o funcionário ganha 10 salários mínimos, não paga cota patronal de 1 salário mínimo”, diz. “É um caminho interessante para formalização do mercado de trabalho, diminuindo o ônus do emprego para o trabalhador que ganha menos e para quem emprega”, acrescenta.