O setor produtivo brasileiro vai pagar em 2025 uma parte da diferença de resultado que o governo federal precisa arrecadar para zerar o déficit público até o final do ano que vem – e da pior forma possível, com aumento de tributos, opção que a equipe econômica vinha evitando lançar mão para conter as críticas sobre a falta de controle dos gastos públicos.

Esse aumento veio encomendado pelo projeto de lei do Orçamento de 2025, entregue pela equipe econômica ao Congresso Nacional na última sexta-feira, 30 de agosto. O PL estima que o governo buscará R$ 166,2 bilhões em receitas extras.

Essa diferença virá, entre outras fontes, com o aumento de 1% da alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) para a maioria das empresas, e em dois pontos percentuais da alíquota para as instituições financeiras. A proposta também prevê o aumento, de 15% para 20%, do Imposto de Renda cobrado dos Juros sobre Capital Próprio (JCP), forma de distribuição de lucro por meio da qual o acionista é tributado.

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, afirmou na segunda-feira, 2 de setembro, que a desoneração da folha de pagamento e a redução da alíquota previdenciária para municípios pode custar R$ 55 bilhões aos cofres públicos até 2027, ano estipulado para o fim dessas medidas. Por isso, buscou outras receitas, como a elevação da alíquota do CSLL e do JCP.

“Estamos contando com a aprovação dessas medidas no Congresso para equilibrar o Orçamento e garantir a compensação necessária. A implementação dessas mudanças é crucial para atender ao déficit gerado pela desoneração”, afirmou.

Advogados tributaristas ouvidos pelo NeoFeed, porém, fizeram duas advertências. A primeira, que a elevação da alíquota da CSLL, principalmente, vai pesar – e muito – nas receitas das empresas. A segunda é que esse impacto provavelmente será repassado aos consumidores por meio de aumento de produtos ou serviços, gerando inflação.

No detalhamento dessas receitas extras que o governo vai buscar, a arrecadação com a CSLL e JCP prevista é de R$ 17,9 bilhões – apenas 10,7% do total, o que dá uma ideia do tamanho de arrecadação extra que o governo está buscando em todos os setores da economia.

Felipe Dias, sócio tributário do escritório Arbach & Farhat Advogados, observa que o projeto de lei com a proposta de aumento da alíquota de CSLL chega a ser inovador por conseguir fisgar praticamente todas as categorias corporativas (empresas que pagam IR com lucro presumido, empesas grandes e médias e prestadores de serviços, por exemplo).

“Um aumento alíquota de 1% da CSLL pode até parecer pouco, mas representa muito”, afirma Dias. “Uma empresa comum paga 25% de Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) mais 9% de CSLL, totalizando uma carga tributária de 34%, que passará a 35%; isso num cenário de juros elevados e inflação fora da meta, preocupa.”

Para as instituições financeiras, que já eram tributadas em 20% de alíquota de CSLL, a mordida vai ser maior. Os bancos passarão a pagar 22% de CSLL, aumentando a carga tributária geral para 47%, incluindo o IRPJ. As seguradoras, que também pagam uma alíquota maior de CSLL, passarão a pagar alíquota de 16% em vez de 15%.

“É evidente o impacto previsto na concessão de crédito, no caso dos bancos, e das apólices de seguro, por causa do aumento da CSLL cobrado das seguradoras, e na inflação em geral”, adverte o tributarista, prevendo um reflexo também no Simples Nacional.

“Quem adota o regime do Simples Nacional geralmente segue uma tabela que considera a alíquota do CSLL em 9%, mas no próximo ano ela deverá ser revista para que chegue a 10%, e isso vai impactar as receitas das empresas no Simples”, afirma Dias.

Alternativa do JCP

Os Juros sobre Capital Próprio, forma alternativa de uma empresa remunerar seus acionistas recolhendo menos tributos, incluindo a CSLL, teve uma ampliação de alíquota de 5%.

O JCP funciona como se o dinheiro aplicado pelos investidores fosse um empréstimo. Na prática, é uma forma de distribuição de lucros alternativa aos dividendos. Foi criada para substituir o desconto da correção monetária na apuração do lucro real e, consequentemente, na base de cálculo de impostos. Ou seja, a empresa repassa parte dos proventos aos sócios antes da incidência de tributos.

“Para o empresário, a lógica do JCP é: se eu pegar empréstimo no banco, vou ter um nível de endividamento maior que o colocar meu próprio dinheiro no negócio”, diz o tributarista.

No ano passado, o governo apresentou um projeto de lei, o PL 4258/23, propondo o fim da dedução do JCP na apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL. A justificativa era de que, depois de mais de 25 anos da criação dessa sistemática, não havia evidências de que ela tenha contribuído para aumentar os investimentos empresariais. O Congresso barrou a proposta.

Na guerra pelo déficit fiscal zero, o governo tem apenas duas alternativas para aumentar as receitas sem contemplar corte de gastos: elevando impostos ou cortando benefícios. A segunda opção foi prioritária, principalmente pela proposta de desoneração da folha de pagamento, que o Congresso vem resistindo. Daí a carta na manga de oneração da alíquota da CSLL e do JCP.

“Observando a intenção do governo com a reoneração da folha de pagamento e as alíquotas de CSLL e JCP, notamos a diferença do governo brasileiro em relação aos países da OCDE, que tentam reduzir – e não aumentar – a carga tributária das empresas”, diz Victor Luz, advogado e mestre em Direito Tributário pela USP.

Segundo ele, a carga tributária total das empresas nos países da OCDE, incluindo o CSLL, atinge 23,6%. “Aqui, a carga tributária vai para 35% para as empresas, em média”, diz Luz, acrescentando que a lei que onera em 5% do JCP é permanente, enquanto a que aumenta a alíquota da CSLL em 1% só é válida para 2025.

Outro tributarista, Morvan Meirelles Costa Junior, do escritório Meirelles Costa Advogados, afirma que o governo federal definitivamente não é afeito a corte de gastos, optando por  aumento de tributo e redução de benefícios.

Ele adverte que o próximo passo é tributar dividendos, tema que ocupa destaque na agenda do governo na segunda fase da reforma tributária, sobre a renda, prevista para avançar no ano que vem.

“Politicamente é mais fácil, para cumprir a meta fiscal, aumentar a alíquota da CSLL e do JCP do que tentar aprovar agora a tributação de dividendo”, afirma Costa Junior.