PARIS — Em 26 de julho, às sete e meia da noite, hora local, será aberta a Olimpíada de Paris — a terceira na cidade, depois de 1900 e 1924. O comitê organizador promete a festa mais majestosa e acessível de todos os tempos. Mas não só isso.
Pela primeira vez na história dos jogos, desde Atenas, na Grécia, em 1896, a cerimônia acontecerá fora de um estádio. O palco do espetáculo de agora será o rio Sena, no coração da capital francesa.
“Os desafios de segurança são imensos, mas não temos um plano B”, disse Emmanuel Grégoire, vice-prefeito de Paris, em coletiva à imprensa, da qual o NeoFeed participou.
O evento está sendo planejado há oito anos, no entanto, a viabilidade do espetáculo a céu aberto começou a ser questionada em toda Europa, depois do ataque terrorista, em 22 de março, na sala de concerto Crocus City, em Krasnogork, nos arredores de Moscou. Desde então, vários países do continente elevaram o alerta de segurança ao nível máximo.
“Decidimos fazer a cerimônia pública porque sabemos que ela é possível. Dependendo do cenário, poderíamos reduzir o tamanho do evento, mas não o realocar”, contou Grégoire, líder também do comitê da organização da Olimpíada.
A pouco mais de 100 dias do início dos jogos, a movimentação nos entornos do Sena já é grande. O policiamento às margens de um dos pontos turísticos mais célebres da cidade foi intensificado e lanchas super velozes da polícia zanzam pelas águas turvas do rio, devido às chuvas do início da primavera.
No dia “D”, como vem sendo chamado informalmente a data do espetáculo, um público sem precedentes de 326 mil pessoas assistirá ao espetáculo ao vivo, nas arquibancadas instaladas às margens do Sena. E por mais monumental que esse número seja, representa pouco mais da metade dos 600 mil convidados, previstos pela organização em 2022.
Rotina tumultuada
Ganha calor também o debate em Paris sobre o quanto a decisão de levar um evento dessas proporções no centro da cidade deve atrapalhar, por semanas, moradores e comerciantes. Para efeito de comparação, na Olimpíada de Londres, em 2012, a abertura reuniu cerca de 60 mil pessoas. No Rio 2016, 80 mil espectadores. Em Tóquio, em 2020, 10 mil , por causa da pandemia.
“Toda Olímpiada tem uma visão negativa até a sua abertura”, defendeu o vice-prefeito. “Estamos confiantes de que a opinião pública será mais positiva com a chegada dos Jogos.”
No início do ano, o francês Thomas Jolly, diretor artístico do espetáculo, revelou detalhes da cerimônia. Ele disse que a festa será um “desfile fluvial” com três horas de duração, percorrendo uma distância de seis quilômetros Sena adentro.
Mais de uma centena de barcos serão utilizados para transportar as delegações de atletas, saindo da Ponte de Austerlitz e passando por cartões postais como a Catedral de Notre-Dame, Museu do Louvre, Jardim das Tuileries, Praça da Concórdia, e, finalmente, a Torre Eiffel, onde a tocha olímpica será acesa na Praça do Trocadero, às dez e meia da noite, horário do sol poente no verão europeu.
Organizar uma festa dessa magnitude não é fácil, muito menos barato. Até agora, não foi confirmado quanto a abertura custará do orçamento total de € 5 bilhões. Mas especula-se que o valor deve superar as edições anteriores.
Muito desse dinheiro foi investido na logística de pessoas. Para garantir a segurança do público, dos atletas e de chefes de Estado de todo o planeta, 70 mil policiais estarão presentes no dia “D”.
Os moradores vizinhos ao Sena terão de informar às autoridades, por exemplo, os dados de eventuais visitas que receberem em casa. “Se você convidar pessoas para a sua casa perto dos Jogos, vai ter de declarar quem elas são”, explicou Pierre Rabadan, encarregado do esporte dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos.
Festa popular
Um mantra repetido pela prefeitura de Paris é que a cerimônia de abertura será a mais popular de todos os tempos. Dos 326 mil lugares nas arquibancadas, 222 mil bilhetes de acesso serão distribuídos gratuitamente aos moradores da região metropolitana.
O objetivo é fazer com que o evento seja acessível para as pessoas envolvidas no dia a dia da cidade, incluindo moradores de bairros populares afastados do centro. “Também teremos 24 zonas gratuitas espalhadas pela cidade para que aqueles que não têm tíquete consigam assistir aos Jogos nas ruas”, contou Rabadan.
Além de ser o local de cerimônia de abertura, o Sena também será usado para provas de maratona aquática e triatlo. Para a cidade de Paris, o grande legado olímpico prometido é justamente a despoluição e renascimento do rio.
Na última década, a cidade investiu cerca de € 1,4 bilhão em tratamento de esgoto e águas fluviais. As autoridades garantem que o plano foi bem-sucedido e que as águas parisienses estão prontas para receber os atletas. A prefeita Anne Hidalgo prometeu criar três áreas de banho público, ao longo do Sena, depois da Olimpíada.
A narrativa oficial, porém, ainda não convenceu o público. Nas redes sociais, vídeos mostrando as águas turvas do rio fazem chacota com a ideia de usá-lo nas provas aquáticas.
Segundo a ONG Surfrider Foundation, dedicada à preservação dos oceanos, o Sena permanece poluído e potencialmente perigoso, depois de seis meses de análises de amostras d’água.
A organização olímpica argumenta que as chuvas históricas registradas entre o final do inverno e o início da primavera sobrecarregam o rio, causando uma das maiores cheias dos últimos 30 anos.
O clima teria contribuído para uma piora momentânea da qualidade da água tratada, que deve voltar a ficar limpa até o início dos jogos. Sem um plano B, é isso que todos esperam.