CANNES – Roy Chon, conselheiro e mentor de Donald Trump, tem três regras claras para vencer no mundo dos negócios.
“1: Ataque, ataque, ataque. 2: Não admita nada, negue tudo. E 3, sendo esta a regra mais importante: sempre clame a vitória e nunca admita a derrota”, ensina Cohn a seu pupilo, um Trump jovem, na casa dos 30 anos, em cena de The Apprentice.
Um dos concorrentes à Palma de Ouro desta 77ª edição do Festival de Cannes, a ser encerrada neste sábado, 25 de maio, na Côte d'Azur, o longa-metragem resgata o início da trajetória do ex-presidente dos Estados Unidos, com foco em sua faceta de empresário.
Mais precisamente, nas décadas de 1970 e 1980, quando ele assumiu o controle da empresa da família, a Elizabeth Trump & Son (mais tarde, a Organização Trump), ingressando no ramo imobiliário de Nova York e instalando a base para o seu império.
Ainda que o filme abra com o aviso de que os eventos narrados são “fictícios”, a espinha dorsal do roteiro é a relação de Trump com Cohn, o homem que realmente teve grande influência nos anos de formação do magnata.
Embora o relacionamento tenha enfrentado altos e baixos, a dupla praticamente não se desgrudou desde que se conheceu, em 1976, em um clube privado de Nova York, até a morte de Cohn, em 1986, vítima de complicações da Aids — doença jamais admitida por ele, que preferia dizer que tinha câncer no fígado.
Diz a lenda que Trump aprendeu a “nunca admitir um erro” e a “não se defender e sim atacar” com o advogado de comportamento antiético, que representava nos tribunais chefes da máfia, como Fat Tony Salerno e Carmine Galante.
E o que se vê no filme é justamente isso: um Trump ainda ingênuo, interpretado pelo ator Sebastian Stan, precisando da ajuda do advogado (vivido por Jeremy Strong) para se safar de problemas e fazer o seu nome em Nova York.
Mais conhecido como o braço direito de Joseph McCarthy, na caça às bruxas anticomunista, Cohn inicialmente defendeu Trump quando ele foi processado pelo governo americano por discriminação racial, por não alugar apartamentos para negros.
E, aos poucos, o advogado implacável treina Trump no que parece ser a arte de buscar o poder a qualquer custo. Com o mentor, Trump aprende a sempre se cercar de políticos, empresários, juízes, celebridades, colunistas de fofocas e magnatas da mídia, de olho em uma possível troca de favores.
Cohn ainda dá lições de como diminuir o pagamento de impostos, de como intimidar e ameaçar os inimigos e de como destruir os adversários plantando mentiras sobre os mesmos.
"É um filme sobre um sistema"
“Mas esse não é realmente um filme sobre Donald Trump”, disse o diretor de The Apprentice, o iraniano radicado na Dinamarca Ali Abbasi.
“É um filme sobre um sistema, a maneira como o sistema funciona, como o sistema é construído e o modo como o poder percorre o sistema. Roy Cohn era um especialista na utilização desse sistema e ele ensinou tudo a Donald Trump”, continuou o cineasta, após a première do filme em Cannes, que teve cobertura do NeoFeed.
The Apprentice, que faz referência ao nome do reality show que Trump começou a apresentar nos anos 2000, já tem data de estreia prevista.
“Temos um evento promocional chamado ‘eleições nos Estados Unidos’, o que vai nos ajudar com o filme. Então esperamos lançá-lo por volta do segundo debate, dia 15 de setembro ou algo assim”, afirmou Abbasi, referindo-se à disputa pela Casa Branca, presumidamente entre Trump e o atual presidente, Joe Biden.
Antes disso, o empresário precisa encarar vários processos criminais que tramitam na Justiça. Inicialmente, ele será julgado pela acusação de falsificar documentação financeira para esconder um pagamento. Durante a campanha presidencial de 2016, ele teria comprado o silêncio de uma atriz de filmes pornográficos, Stormy Daniels, com quem teria se envolvido sexualmente em 2006.
Justamente por se tratar de um ano de eleições, a equipe da campanha de Trump, preocupada com a imagem do candidato, está ameaçando processar os realizadores de The Apprentice, alegando se tratar de “difamação maliciosa pura”.