Cofundador da Uber, Travis Kalanick liderou a empresa em seus primeiros sete anos de expansão. Nessa escalada, o Brasil conquistou seu espaço. Desde a estreia local, em 2014, o aplicativo atraiu mais de 600 mil motoristas e mais de 22 milhões de usuários no País. Com essa base, o mercado brasileiro ocupa hoje o posto de segunda maior operação global da companhia, atrás apenas dos Estados Unidos.
Pressionado por investidores, Kalanick deixou o comando da Uber em junho de 2017. O Brasil, no entanto, segue em seu roteiro. Conforme apurou o NeoFeed, a CloudKitchens, nova aposta bilionária do empreendedor americano, está preparando o seu desembarque no País.
Fundada em 2015, a CloudKitchens investe na vertente de dark kitchens, como são chamadas as cozinhas compartilhadas voltadas exclusivamente ao segmento de delivery. Kalanick assumiu a operação em 2018, quando desembolsou US$ 150 milhões para comprar uma participação majoritária na City Storage Systems, controladora da startup, por meio de seu fundo, o 10100.
Em janeiro, a CloudKitchens captou US$ 400 milhões junto ao Fundo Soberano da Arábia Saudita, em uma rodada que avaliou o negócio em mais de US$ 5 bilhões, segundo informações do jornal econômico The Wall Street Journal.
Com o caixa reforçado, a startup, que estreou com uma unidade em Los Angeles (EUA), passou a buscar imóveis para instalar novas cozinhas nos Estados Unidos e em países como Inglaterra, China, Índia e Coréia do Sul. E agora, também no Brasil.
Um dos primeiros passos foi a formalização da operação. Registrada na Junta Comercial de São Paulo, em 30 de abril de 2019, a empresa traz como razão social o nome Cozinhas do Futuro Administração de Imóveis Ltda. E como objetos: aluguel de imóveis próprios; gestão e administração da propriedade imobiliária; consultoria em tecnologia da informação; e holdings de instituições não-financeiras.
Inscrita inicialmente com um capital de R$ 10 mil, a companhia alterou o montante para R$ 20 milhões, em novembro. E tem como controladora a CSS INTL HOLDCO, cuja sede fica no número 251 da Little Falls Drive, avenida de Wilmington, cidade do estado americano de Delaware. O mesmo endereço abriga uma operação da City Storage Systems.
Linha de frente
O registro na Junta Comercial de São Paulo traz ainda como administradores da empresa dois nomes com um histórico de desenvolvimento de negócios no ecossistema brasileiro de startups. O primeiro deles é o venezuelano Jorge Pilo.
Com passagem como diretor do Groupon Brasil, Pilo foi também CEO global da Easy Taxi. E, no início desse ano, assumiu a liderança dos negócios da espanhola Cabify no País, quando a empresa incorporou as operações da Easy Taxi. O executivo deixou o posto em maio.
Na mesma época, Daniel Botelho Mandil, o outro administrador nomeado no registro, encerrou uma passagem de quase quatro anos na subsidiária brasileira do Uber. Nessa trajetória, o último ano foi dedicado à expansão do Uber Eats no Brasil.
Procurada, a CloudKitchens não retornou ao pedido de entrevista do NeoFeed. Uma fonte do setor com conhecimento de parte dos planos confirmou, no entanto, que Pilo lidera os preparativos para a chegada ao Brasil, programada para o primeiro semestre de 2020.
Nessa fase inicial, a empresa já busca imóveis em São Paulo. Não está descartado também o investimento em outras praças, como Belo Horizonte
“Eles já têm um time de real estate de alto nível montado aqui”, afirmou o executivo, que pediu anonimato. “E os planos para o Brasil são ambiciosos.”
Nessa fase inicial, a empresa já busca imóveis em São Paulo. Não está descartado também o investimento em outras praças, como Belo Horizonte. No modelo proposto, o foco da CloudKitchens, a princípio, atuará mais na frente de estruturação e locação das cozinhas. E não na gestão da operação em si.
Apetite global
Uma tendência ainda relativamente nova no mercado, as “cozinhas escuras” também são conhecidas por nomes como cloud kitchens, ghost kitchens ou restaurantes virtuais.
O modelo começou a ganhar forma a partir de 2017, impulsionado pelo crescimento do delivery, um mercado que já movimenta € 83 bilhões globalmente, segundo a consultoria McKinsey, e pela disseminação dos apps de entrega.
Basicamente, o conceito parte de imóveis instalados em diferentes regiões de uma grande cidade, com prioridade para aquelas nas quais os custos dos imóveis são mais atrativos. Esses espaços concentram cozinhas voltadas unicamente ao atendimento do delivery.
O mercado de delivery já movimenta € 83 bilhões globalmente, segundo a consultoria McKinsey
Dentro desse formato, há diferentes abordagens por parte da empresa responsável pelos imóveis. O negócio pode estar restrito à instalação e o aluguel das cozinhas a parceiros. Assim como pode envolver parte ou toda a administração desse processo, incluindo questões como a gestão dos pedidos e da conexão com os serviços e aplicativos de entrega.
O modelo promete uma série de benefícios. Com custos compartilhados e localizadas em bairros de preço mais acessível, as dark kitchens oferecem uma alternativa para um restaurante ampliar sua área de cobertura sem a necessidade de grandes investimentos. Especialmente se comparadas ao aporte exigido na abertura de uma nova operação própria, no formato tradicional.
Ao mesmo tempo, ao apostar em uma distribuição mais pulverizada pelas cidades, o conceito carrega a possibilidade de aprimorar a experiência dos consumidores, pelo fato de favorecer entregas mais rápidas. E, consequentemente, expandir o potencial de vendas.
Nesse contexto, não são poucos os exemplos de empresas que estão apostando no modelo em todo o mundo. E atraindo investidores de peso para escalar essas operações. A lista inclui nomes como a britânica Deliveroo, que, em maio, recebeu um aporte de US$ 575 milhões da Amazon.
Outros exemplos são a chinesa Panda Selected, do portfólio da Tiger Global, e a indiana Rebel Foods, que tem entre seus investidores o Goldman Sachs e a Sequoia Capital. Entre as inúmeras empresas que já atuam ou estão testando esse formato figuram ainda companhias como Karma Kitchen, Swiggy e GrabFood.
No Brasil, a CloudKitchens também encontrará concorrência. Depois de projetos piloto em São Paulo e Belo Horizonte, com duração de cerca de dois meses, a colombiana Rappi entrou oficialmente nesse segmento no País há cerca de um mês, informação que foi antecipada pelo NeoFeed.
Com uma estratégia que mescla operações próprias e com parceiros, o plano da Rappi é encerrar o ano com mais de cem cozinhas no mercado local. Na América Latina, a projeção é chegar a 600 unidades até 2020. Rivais como o Uber Eats e o iFood também já investem nessa frente no País.
“Já existe uma disputa crescente por espaço em São Paulo”, diz Ana Paula Tozzi, CEO da consultoria AGR, que destaca o apelo desse modelo, especialmente em cidades nas quais os custos de um ponto comercial são muito elevados, o que limita a expansão dos restaurantes. “Esse conceito vai ganhar cada vez mais escala no Brasil.”
Um dos nomes mais recentes a engrossar essas fileiras é a brasileira Mimic. A empresa acaba de inaugurar a sua primeira estrutura em Pinheiros, bairro da zona oeste de São Paulo. Para ocupar o seu espaço nesse mercado, a startup, fundada há poucos meses, contou com um aporte de US$ 9 milhões, liderado pelo Monashees e com a participação de fundos como Canary e Valor Capital.
O plano de expansão da Mimic envolve mais dez unidades em 2020, inicialmente, em São Paulo. Para 2021, a meta é chegar a outros mercados do Brasil e também da América Latina.
No movimento inverso, a colombiana Muy tem planos para desembarcar, em breve, no Brasil. Para consolidar essa estratégia, a companhia acaba de captar US$ 15 milhões junto à empresa de private equity mexicana ALLVP.
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