O movimento para fusões e aquisições entre as assessorias de investimento está a todo vapor, mas nenhuma grande transação aconteceu neste ano, até agosto. Um estudo da consultoria AAWZ, especialista em M&A, explica por que as conversas, embora intensas, não se convertem em deals.
A “culpa” é dos valuations. Muitas operações acabam travadas por uma expectativa de conseguir valores de um mercado que não existe mais. Com isso, de cerca de 50 conversas que aconteceram nos últimos 12 meses entre assessorias com pelo menos 10 profissionais, houve uma conversão de apenas 10%.
“Os últimos 12 a 24 meses foram difíceis para a atividade de assessoria de investimentos por baixa captação e baixo crescimento da custódia. O que fez as conversas acelerarem”, diz Filipe Medeiros, CEO e fundador AAWZ, em entrevista ao NeoFeed.
“Mas pouca coisa se concretiza de fato porque tem gente apegada aos valuations do mercado de 2020, que não existe mais”, complementa.
O estudo da consultoria mostra que ocorreram cinco M&A entre agosto de 2023 e de 2024 com encerramento de CNPJ (completamente efetivados) e 14 movimentações parciais, ou seja, o CNPJ anterior foi mantido mas houve mudança de 50% do time de uma assessoria para outra.
A maior parte das conversas ocorre entre escritórios de R$ 1 bilhão a R$ 3 bilhões sob custódia, que buscam uma fusão para ganhar escala. Ou entre assessorias de investimento com mais de R$ 3 bilhões querendo incorporar operações menores que agregam em valor, principalmente pela qualidade dos sócios.
Dos cinco M&As assinados, a AAWZ esteve presente em dois. Um desses foi o da Inove, que incorporou a Eu Investimentos, com cerca de R$ 500 milhões sob custódia. Hoje, o escritório plugado na XP totaliza R$ 6 bilhões.
“Acreditamos muito no movimento de consolidação da indústria. Esse foi o nosso terceiro deal e continuamos avaliando alguns outros”, afirma Eduardo Madanelo, CEO da Inove.
“Mas as coisas só andam quando de fato há uma clareza da sinergia e flexibilidade entre as partes na negociação. E o valor de mercado hoje mudou”, complementa.
Segundo Madanelo, o time sênior da Eu Investimentos, de ex-executivos do Itaú BBA, trazia mais qualidade para a operação mais robusta da Inove, com mais processos e governança e um ecossistema mais completo além de investimentos.
O fator tempo
Quando se pega uma janela maior de tempo, o estudo da AAWZ mostra que ocorreram, em média, quatro operações de fusão e aquisição entre o terceiro trimestre de 2020 e o segundo trimestre de 2024 - sempre considerando casas com, no mínimo, 10 assessores.
A média de deals foi caindo nos últimos 24 meses justamente pelas condições macroeconômica. Em 2020, a taxa de juros estava em 2% ao ano e as assessorias cresciam, em média, 70% ao ano. Agora, com a Selic na casa de dois dígitos, o crescimento médio tem sido de 20% ao ano.
Um bom exemplo dessa mudança de realidade no mercado é a própria XP, que foi avaliada em seu IPO a mais de 50x o lucro no fim de 2019 e, agora, está avaliada na Nasdaq a cerca de 15x o lucro.
O problema, na visão de Medeiros, da AAWZ, é que o acordo de sócios pelo partnership das empresas de assessoria não foi atualizado - e o ideal teria sido uma correção de três a quatros vezes no período.
Esses assessores internos “compraram” a sociedade com um valor maior e não aceitam vender com tamanho "desconto". E isso impede os deals de se concretizarem.
“Muita gente ficou insatisfeita porque fez a empresa crescer e não cresceu a participação junto no momento de boom”, afirma o CEO da AAWZ.
Tomás Zakia, CEO da WIT, que já fez quatro incorporações, sendo a última a da Japi, que tinha cerca de R$ 500 milhões sob custódia, vê tanto o aquecimento nas conversas como um problema de valuation.
“O mercado está superaquecido para fusões. O ROA está menor, a competição entre os escritórios maior e ambiente mais favorável aos bancos. Estamos discutindo com outras casas, mas, de fato, há um descompasso de preço que trava muitas negociações”, afirma ele, que hoje detém R$ 5,2 bilhões sob custódia.
Com o mercado em baixa, o retorno não está sendo o mesmo. Por isso, apesar da tendência de consolidação, o mercado ainda está em expansão com o surgimento de mais assessorias.
Nos últimos 12 meses, nove escritórios foram criados - quase o dobro do número de encerramento de CNPJs. Desses novos negócios, 60% foram fundados por assessores que saíram de outra casa para ter a sua própria empresa. Em 2020, esse percentual era de apenas 25%.
“O mercado fica cada vez mais competitivo, e é preciso entender que a realidade mudou. Com o aumento previsto da taxa de juros, o mercado continuará desafiador e talvez não se veja mais os valuations para esse negócio de quatro anos atrás”, diz o CEO da AAWZ.