A demanda da China por salmão de cativeiro está crescendo em um ritmo sem precedentes. Em 2023, suas importações cresceram 46% em relação ao ano anterior – com as importações de salmão fresco do Atlântico e refrigerado aumentando 63%.
Esse crescimento notável está remodelando o comércio global de frutos do mar. Exportadores da Escócia, Noruega, Chile, Austrália, Ilhas Faroé, Canadá e Islândia estão correndo para suprir as necessidades desse mercado vasto e em rápida evolução.
Ao mesmo tempo, os esforços da China para produzir seu próprio salmão do Atlântico enfrentam desafios significativos, destacando a necessidade de substitutos como a truta arco-íris (também conhecida por truta salmonada) para atender ao crescente apetite do país por iguarias de frutos do mar.
Uma grande mudança ocorreu em 2018, quando o governo chinês permitiu que a truta arco-íris fosse rotulada e vendida como salmão. Essa decisão tornou obscura a distinção entre salmão do Atlântico importado e truta arco-íris cultivada localmente, criando uma opção mais acessível para consumidores sensíveis a custos.
A truta é comparável ao salmão em aparência e tamanho, com carne firme e oleosa, de cor laranja-rosada semelhante. Nutricionalmente, as espécies também são semelhantes, assim como as formas como podem ser cozidas e preparadas.
Em nossa nova pesquisa, que incluiu testes de sabor, descobrimos que muitos consumidores chineses não conseguiam distinguir entre a truta arco-íris nacional e o salmão do Atlântico importado em testes cegos. Mas quando informados sobre a origem, as preferências dos provadores mudaram fortemente em favor do salmão do Atlântico importado, destacando o poder da procedência.
Embora a disposição das pessoas em pagar não tenha variado inicialmente em nossos testes cegos, ela se tornou um fator decisivo quando a origem do peixe foi revelada.
Mas descobrimos que a origem por si só não era suficiente. Para que nossos testadores estivessem preparados para pagar preços mais altos, eles também tiveram que gostar mais da aparência, do cheiro e do sabor do produto, ou serem persuadidos pelo seu selo ecológico (que indica padrões ambientais).
Custos ambientais
O transporte de salmão do Atlântico dos lagos escoceses, fiordes noruegueses ou águas chilenas para os mercados chineses envolve uma logística complexa e custos ambientais significativos. A pegada de carbono desse comércio, combinada com a natureza intensiva em recursos da aquicultura do salmão, levanta preocupações críticas sobre a sustentabilidade.
Esses desafios são particularmente pronunciados na China, onde os consumidores têm uma forte preferência por frescor. Isso aumenta a demanda por entrega rápida de salmão importado, apesar do impacto ambiental. E os consumidores estão recorrendo cada vez mais às plataformas online para comprar frutos do mar.
O comércio eletrônico remodelou o varejo de frutos do mar na China, oferecendo entrega rápida e produtos que atendem à demanda dos consumidores por qualidade e frescor. O salmão se destaca neste mercado devido ao seu alto valor percebido, qualidade premium e preço. Ao contrário de outros frutos do mar caros que muitas vezes precisam ser vendidos vivos para manter seu valor, o salmão mantém seu apelo quando resfriado ou congelado.
Isso torna o salmão particularmente adequado aos modelos modernos de varejo, onde a logística sofisticada da cadeia de frio garante seu frescor sem as complexidades do transporte de animais vivos. No entanto, essas inovações têm um custo.
O armazenamento intensivo em energia e o transporte rápido necessários para o salmão importado contribuem significativamente para os danos ambientais. À medida que o mercado de frutos do mar da China continua a crescer, abordar os desafios de sustentabilidade associados a esse comércio será fundamental para equilibrar a demanda do consumidor com a responsabilidade ambiental. Os atuais esquemas de certificação internacional, que visam melhorar a sustentabilidade do setor, tiveram impacto limitado na China até agora.
A China fez esforços significativos para estabelecer uma indústria nacional de salmão do Atlântico, mas essas tentativas não tiveram muito sucesso devido a desafios técnicos e restrições ambientais. Isso deixou uma lacuna que a truta arco-íris cultivada internamente está pronta para preencher.
Em 2022, a China produziu 37.000 toneladas de truta arco-íris. Essa é uma quantidade relativamente pequena se comparada aos níveis de produção internacionais, mas ainda assim é notável considerando que a truta arco-íris é uma nova espécie produzida na China, diferentemente de espécies tradicionais como a carpa.
No entanto, a criação de trutas arco-íris na China é geograficamente limitada, pois a espécie prospera em temperaturas mais baixas de água doce encontradas em lagos e reservatórios mais altos, bem como em canais abastecidos continuamente com água doce desviada de rios.
Os avanços nos sistemas de aquicultura oferecem um caminho potencial para expandir a produção da China. A criação de trutas é uma alternativa mais sustentável e de origem local ao salmão do Atlântico, que reduz a pegada de carbono associada às importações e garante opções mais frescas para os consumidores chineses. O desenvolvimento de uma indústria nacional robusta de trutas poderia aumentar a segurança alimentar, reduzir a dependência de importações e criar oportunidades econômicas em áreas rurais.
Atenção ao mercado global
O mercado de frutos do mar em evolução da China oferece lições valiosas para a indústria global. Enfatizar qualidade, frescor e sustentabilidade repercutirá no consumidor chinês cada vez mais sofisticado.
Ao mesmo tempo, o investimento em práticas de aquicultura ecologicamente corretas, tanto nacional quanto internacionalmente, será essencial para equilibrar a crescente demanda por frutos do mar premium com a responsabilidade ambiental.
Isso poderia incluir a redução do desperdício de ração e a recirculação de sistemas de aquicultura (que filtram e reutilizam a água) para minimizar o uso de água. Reciclar nutrientes residuais usando-os em outras áreas da produção de alimentos também pode ser fundamental.
À medida que a truta arco-íris ganha destaque no cenário de frutos do mar da China, a relação entre as preferências do consumidor, as preocupações ambientais e as oportunidades econômicas podem, por sua vez, moldar o futuro do comércio global de salmão.
Se o peixe doméstico conquistar uma fatia maior do mercado chinês, os produtores de salmão na Europa, Canadá e outras regiões exportadoras poderão enfrentar desafios significativos. Isso poderia, em última análise, forçá-los a repensar suas estratégias para se adaptarem às mudanças na dinâmica do mercado.
Embora o objetivo de criar uma indústria nacional de salmão do Atlântico tenha se mostrado difícil para a China, a criação de trutas apresenta uma solução prática e sustentável para seu setor de frutos do mar de luxo.
*Dave Little é professor de desenvolvimento de recursos aquáticos na Universidade de Stirling.
Mausam Budhathoki é pesquisador de pós-doutorado na Universidade de Copenhague.
Este artigo foi publicado originalmente no The Conversation.