Quando a pandemia teve início no Brasil, em março do ano passado, não faltaram analistas para afirmar que as micro e pequenas empresas seriam as mais afetadas pela crise econômica que se seguiria nos meses seguintes, sem que os bancos dessem a elas o devido socorro para suportar as restrições causadas pelo isolamento social.

Essa, porém, foi uma previsão que se mostrou equivocada, na avaliação do presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto.

“Nós vimos muitos artigos em jornais e comentários na mídia dizendo que os micro e pequenos negócios seriam completamente assassinados na crise”, disse o executivo, durante participação em live promovida pelo Bradesco BBI, para uma audiência de mil pessoas, entre investidores e executivos de grandes empresas, na tarde desta terça-feira, dia 17 de agosto.

“Mas fizemos um elaborado estudo com todos os setores que mostrou exatamente o contrário: as micro e pequenas tiveram maiores aumentos em crédito do que as médias, que, por sua vez, cresceram mais que as grandes”, acrescentou o executivo, que fez a sua palestra em inglês, uma vez que o público também contava com estrangeiros.

Segundo o gráfico apresentado pelo presidente do BC, a maioria dos segmentos enfrentou queda na tomada de crédito durante o primeiro trimestre da pandemia, independentemente do tamanho da companhia.

Contudo, do trimestre seguinte em diante, a partir de incentivos criados pelo governo para amenizar os efeitos da crise, como o novo Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), a oferta de crédito voltou a subir, a começar pelos negócios menores.

Por exemplo, o crédito para micro e pequenas empresas do varejo teve expansão de 32% no terceiro trimestre de 2020, em comparação a igual período de 2019, enquanto as grandes companhias do mesmo setor viram o financiamento subir pela metade, a 17%.

No setor automotivo, a discrepância foi maior. Enquanto as micro e pequenas tiveram alta de 23% no acesso ao crédito, as grandes companhias enfrentaram redução de 21%.

Em outra análise apresentada no evento, Campos Neto mostrou que o número total de micro e pequenas empresas que fizeram algum tipo de operação no Sistema Financeiro Nacional (SFN) subiu para 4,7 milhões em abril de 2021, contra 3,4 milhões um ano antes. Já as médias, caíram de 124,9 mil para 123,8 mil. As grandes, por sua vez, ficaram praticamente estáveis, saindo de 8,9 mil para 9 mil.

Com os incentivos criados pelo governo, os principais bancos do país lançaram programas especiais de renegociação de dívidas e socorro financeiro. Com isso, permitiram que o crédito crescesse mesmo em um cenário de crise econômica e aumento do risco.

Em 2020, o saldo das operações de crédito avançou 15,5%, para R$ 4 trilhões, puxado principalmente pelos empréstimos para empresas, com alta de 21,8%. “Os bancos estavam em uma situação muito boa e muito dispostos a ajudar, para protegerem seus clientes”, disse Campos Neto.

Por outro lado, as micro e pequenas empresas foram as que mais fecharam as portas durante a pandemia. Uma pesquisa feita pelo IBGE apontou que, na primeira quinzena de junho de 2020, o número de companhias em operação com até 49 funcionários caiu 33% em relação a período equivalente de 2019.

O índice em questão representou uma redução quase quatro vezes maior que a enfrentada pelas empresas que têm entre 50 e 499 empregados, de 9%. As companhias com mais de 500 pessoas recuaram ainda menos, a 2%.

Em um outro levantamento, feito pela Boa Vista, as micro e pequenas empresas representaram 85% dos pedidos de falência realizados em 2020. No total, o número de companhias que fecharam as portas subiu 12,7% no ano passado.

O avanço do crédito também não foi capaz de conter o aumento do desemprego no País. No trimestre encerrado em junho, o índice de desocupação medido pelo IBGE, na Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) chegou a 13,3%. No trimestre concluído em março de 2020, estava em 12,2%.

O presidente do BC, contudo, prefere olhar para outro indicador, o do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), que mede a geração de empregos formais no Brasil e está em alta. Em junho, foram 309 mil postos criados com carteira assinada no País. No acumulado do ano, são 1,53 milhão de novas vagas.

“Temos dois indicadores contando duas diferentes histórias”, disse Campos Neto. “Mas achamos que estamos mais perto dos números do Caged do que dos números da Pnad. É mais uma notícia positiva”, afirmou.

Para ele, à medida que a economia vai sendo reaberta e o setor de serviços se recupera, o Brasil experimentará um momento de criação de empregos informais, trazendo de volta para o mercado de trabalho as classes mais baixas.

Apesar da criação de empregos formais, o desemprego no Brasil atinge 14,8 milhões de pessoas no trimestre encerrado em junho, um número 16,4% maior que o resultado de um ano antes.